Perto das 20h, minha mãe perguntava: "Já pôs a mesa?". Lá em casa, a gente não costumava jantar uma refeição como a do almoço, mas, ainda que fosse uma xícara de café com leite e um cacetinho com queijo, o ritual era sempre o mesmo: preparar o local onde todos sentariam juntos para comer e conversar sobre o dia que passou. Quantas vezes da semana a gente ainda faz isso atualmente? Em quantos períodos da nossa vida atropelada realmente prestamos atenção no que estamos comendo ou, melhor, aproveitamos para que este seja um momento de dividir a refeição como uma experiência social?
Se tem um momento em que eu, esta pessoa que gosta de correr, andar de bike e caminhar, respeito a total inércia, é hora de fazer uma refeição. Não vou mentir que algumas vezes, na pressa, eu me agarro em um sanduíche no meio de um percurso entre uma atividade e outra. O importante é lembrar que seja uma exceção. Se você faz isso constantemente, deixa eu contar: na quinta-feira, um estudo da Universidade de Surrey, na Inglaterra, mostrou que comer andando aumenta a ingestão de alimentos ao fim do dia, o que, parece óbvio, pode causar aumento de peso. Isso porque, ao nos distrairmos, perdemos a noção da quantidade do que é ingerido ao longo do período. A pesquisa também mostrou que fazer isso aumenta o apetite.
O antropólogo José Manuel Sobral disse uma vez, em entrevista a um portal português, que comer à mesa é um ato de intimidade. Concordo e acredito que, como toda ação desse tipo, requer paciência e disposição das pessoas. Fico pensando o quanto estamos menos abertos a exercitar a proximidade nas relações e se a indisponibilidade para sentarmos ao lado de um grupo de pessoas e curtir um prato bonito de comida não é reflexo disso.
Não moro mais na casa da minha mãe e não faço mais parte daquele ritual específico. Mas o hábito da intimidade se construiu ali naquelas noites regadas a leite com café passado e cacetinho comprado na mesma tarde. Todos ali dispostos após a ordem de "põe a mesa".
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