O entendimento da importância da prevenção, a crescente rotina dos exames periódicos, os avanços tecnológicos da medicina propiciando a antecipação do diagnóstico de doenças potencialmente curáveis e o manejo mais competente das enfermidades já instaladas têm aumentado, a cada década, a expectativa de vida média da população em todo o mundo.
Mantidas as curvas de aumento de longevidade, estaremos autorizados a anunciar que os jovens que hoje têm 20 anos deverão chegar aos 120, sem sustos.
Teoricamente, sempre devemos festejar a possibilidade de viver mais, mas parece altamente recomendável que, projetada esta nova realidade, comecemos a nos preocupar com o que fazer com os nossos velhinhos do futuro, porque o nosso desempenho com os atuais é, em geral, constrangedor.
O aumento da expectativa de vida não pode significar apenas uma ampliação do intervalo entre o início da aposentadoria e o fim da vida. Por uma razão muito evidente: a perda da utilidade é seguramente a mais degradante das mortes, e uma sociedade envelhecida só será feliz se souber aproveitar a sapiência da velhice ao invés de se conformar com a frustração da inutilidade.
A lerdeza dos movimentos, a redução do entusiasmo para atividades sociais barulhentas, a mudança dos hábitos de sono e a frequente incapacidade de se adaptar a eletricidade da vida moderna acabam isolando o idoso. E, por mais que a família se esforce, não consegue disfarçar o peso que ele representa com a intransigência do seu ritual conservador.
Neste descompasso de atitudes e gostos, nada o mutila mais do que a morte do cônjuge, condenando-o ao desterro da solidão sem parceria.
E aqui entra a figura do cuidador, um personagem cada vez mais valorizado, a julgar pela demanda crescente e pelos salários compensadores.
O Manoel Maria foi operado de um câncer de pulmão na década de 90 e o reencontrei quase 20 anos depois, bem velhinho, viúvo, cuidado por uma sobrinha desempregada, que tomava conta de todas as tarefas, incluindo pagamentos de carnês, recebimento de aposentadoria e outras despesas.
Um dia, chamado para vê-lo no lar geriátrico por uma dor no tórax, encontrei-o acabrunhado, com o extrato bancário nas mãos. Quando lhe perguntei o que o abatia, ele me disse: "Ela é minha única parente próxima, minha bengala e minha herdeira. Não tenho mais ninguém a quem recorrer. Acontece que não consigo evitar a depressão ao verificar que ela me rouba regularmente. Mas é preferível isso a não ter ninguém com quem conversar. Então, só me resta uma solução: vou ligar para o gerente e pedir que ele não me mande mais relatório nenhum".
Entre a tristeza da solidão e a iniquidade da rapina, ele preferira se proteger com o escudo do silêncio. Era só o que lhe restava na preservação da dignidade.
Prolonguei o abraço do adeus com o desespero de não saber como consolá-lo.