Que ajudar os outros é fonte certa de gratificação interior, todos os que experimentaram o gesto, sabem bem, e os que não provaram ainda não têm noção do que estão perdendo.
Numa época em que a Santa Casa buscava apoio de empresários para sair de uma crise crônica que lhe ameaçava de fechamento, aprendi que a disposição de doar tem uma idade certa, que começa tempos depois da crise de soberba que consome durante anos, ou poucas décadas, os novos ricos. E falo dos que construíram a riqueza, porque para os que a herdaram, este sentimento, com raras exceções, não ocorre nunca, tão ocupados estão em consumir o espólio com futilidades.
E então chega o momento em que o afortunado mais maduro se descobre constrangido por ser muito rico entre miseráveis, e se dispõe a ajudar os que, de tão acostumados a não ter, desaprenderam de reclamar e nem pensam em pedir.
Entre os doadores, observam-se curiosas divisões de comportamento: há os que exigem divulgação do feito e quase não há como contentá-los e, em contrapartida, os mais nobres que pedem anonimato, e embalados por uma euforia que lhes põe brilho nos olhos e um meio sorriso na boca, saem discretamente, talvez reverberando Madre Teresa, que ensinou: "Não importa o que os outros digam ou pensem. No final, a coisa será só entre você e Deus".
De qualquer modo, tenho mais facilidade de entender os que TAMBÉM ajudam e alguma perplexidade com os que SÓ ajudam. Sempre me impressionei com esses abnegados religiosos que dedicam a vida inteira a socorrer pessoas necessitadas num nível de entrega sem limites, e se bastam nesta missão, a comprovar a força e a energia vital que se produz com fazer o bem.
Um dia desses, numa conversa de café no fim da tarde, uma história emblemática: a freirinha, administradora de uma grande casa de passagem, sempre carente de recursos, improvisou sua barraquinha na frente de um enorme edifício, no coração comercial de uma grande metrópole. Quando um empresário jovem se aproximou, ela estendeu a mão que acidentalmente lhe tocou a gravata de seda, e disse: "Uma esmola para os meus pobres!".
Ele, irritado com a abordagem, cuspiu-lhe a mão.
E ela, então, calmamente, limpou a mão direita na batina, estendeu a esquerda e disparou: "Esta cuspida foi pra mim. Agora, meu filho, uma esmola para os meus pobres, por favor!".