Um novo conceito no tratamento de tumores cerebrais, batizado informalmente de GPS Cirúrgico, está diminuindo o risco de pacientes adquirirem sequelas ao passar por um procedimento operatório. Com recursos de neuroimagem, os médicos mapeiam a atividade cerebral, identificando as áreas de cada função, como a capacidade motora e a de compreensão. Assim, é possível identificar as zonas sensíveis que poderiam ser lesadas. A estratégia está sendo aplicada no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp).
De acordo com o neurocirurgião do Icesp e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Guilherme Lepski, a cirurgia clássica exige uma série de informações sobre o tumor, como a localização, o tamanho, a profundidade e a irrigação sanguínea. Entretanto, ainda assim, não é possível atestar que uma zona crítica não será afetada.
- Essas áreas não são visíveis. Supomos a localização delas. Mas, quando existe um tumor, essas áreas se reorganizam e você não pode prever com certeza onde elas estão - explicou.
Lepski esclarece que a decisão sobre que área atacar é tomada durante a cirurgia, enquanto o cérebro está anestesiado.
- O cirurgião tem que decidir se vai continuar operando, se vai comprar um risco maior de sequela para que o paciente tenha uma sobrevida mais longa, ou se vai parar, deixando um pedaço maior de tumor, mas pensando na qualidade de vida do doente - apontou.
A nova abordagem, ao identificar as funções, possibilita que o médico tenha mais segurança para decidir sobre uma postura mais agressiva ou não em relação ao tumor.
Uma das técnicas incorporadas envolve a monitorização eletrofisiológica intraoperatória, que faz o registro constante e em tempo real de diversas funções neurológicas. O sistema guia o médico durante a retirada do tumor de maneira semelhante aos sistemas de navegação automotivos baseados em GPS. Nesse caso, no entanto, o sistema de navegação se baseia em raios infravermelhos.
- Estou vendo o grau de contração em determinados músculos, estimulando área visual para ver se estão preservados - exemplificou.
Embora ainda não seja possível dizer qual o percentual de redução de sequelas com essa nova abordagem cirúrgica, Lepski cita a diminuição do tempo de internação como um dos ganhos para os pacientes. Ele destaca ainda que são menores os custos relacionados ao tratamento de complicações, como paralisia.
- Antes, ele precisaria de andador, de fisioterapia. Se cair, por exemplo, vai precisar ser operado de urgência. São custos indiretos - apontou.
Além disso, aumenta-se a sobrevida do paciente, já que uma maior área do tumor pode ser atacada.
- A qualidade de vida do doente melhora e a sobrevida aumenta porque, prestando atenção a essas funções, você tira mais tumor do que tiraria. O médico não é obrigado a parar a cirurgia antes, por excesso de zelo. Vai além e consegue retirar mais - relata.
O procedimento é indicado para pacientes diagnosticados com tumores do próprio tecido cerebral, que se situam próximo às partes mais nobres do cérebro. Segundo o especialista, a técnica convém para tumores dentro do cérebro, sejam benignos ou malignos, desde que localizados nessas áreas.
Uma média de 24 pacientes é atendida pelo setor de neurocirurgia do Icesp e cerca de metade é beneficiada com a nova estratégia cirúrgica.