Divulgado no início de julho, o estudo Tampons as a source of exposure to metal(loid)s (Tampões como fonte de exposição a metal, em tradução livre) tem gerado muita polêmica nas redes sociais, principalmente no Tiktok. O motivo? Ele encontrou metais pesados em absorventes internos.
Nas últimas semanas, usuárias abriram suas câmeras para falar sobre o estudo, criar suas teorias e, principalmente, desestimular o uso de absorventes.
O assunto, no entanto, é mais complexo do que parece. Por isso, Zero Hora conversou com especialistas para entender se há ou não riscos.
O que diz o estudo
Publicado na revista Environment International, que só divulga artigos revisados por pares, o estudo avaliou 30 absorventes internos comprados entre setembro de 2022 e março de 2023 em lojas físicas nos Estados Unidos, na Grécia e no Reino Unido, além de dois grandes varejistas online. Foram verificada a presença de 16 metais tóxicos nos produtos.
— A hipótese levantada pelos autores do estudo é de que a contaminação ocorra durante a cadeia de produção, seja com o solo ou até mesmo a água contaminada — diz a ginecologista do Centro da Mulher do Hospital Moinhos de Vento, Letícia Voigt.
Ela explica que o estudo é confiável e feito por bons profissionais, mas pesquisas futuras são necessárias para entender as descobertas e determinar se os metais podem vazar dos absorventes internos e chegar aos órgãos e na circulação sanguínea.
— O nível que foi encontrado de todos os metais está abaixo dos que são considerados prejudiciais para saúde se fossem encontrados dentro de um alimento — aponta a chefe do serviço de ginecologia e obstetrícia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Maria Celeste Wender.
Essa é a primeira vez que um estudo mede a presença de metais em absorventes internos. E a falta de informação sobre o tema, ao lado da propagação de fake news, faz as pessoas que menstruam ficarem aflitas.
— Já chegaram pacientes no meu consultório preocupadas e querendo parar de usar o absorvente interno por causa da repercussão do estudo, e eu tenho explicado para elas que é um estudo novo que precisa de mais pesquisas antes de pensarmos em mudar de método — relata Wender.
Pontos de atenção
Particularidades dos produtos vendidos no Brasil devem ser consideradas, conforme cita Mari Krüger, bióloga e divulgadora de ciência:
— São achados importantes e que a gente precisa levar em consideração, mas todo o produto que é vendido no Brasil passa por estudos específicos para ser vendido aqui. Então, faz diferença ser um produto de fora do país ou ser um produto daqui.
Outro ponto importante é que o estudo não fala que os metais encontrados são absorvidos pelo corpo humano. E nem o impacto deles na saúde íntima.
— O que me deixou mais indignada foi o quanto a galera extrapolou que significa achar esses metais e qual o impacto disso na nossa saúde, porque já está virando "a sua cólica é causada pelo arsênio que foi encontrado (nos absorventes)". E isso não tá escrito em lugar nenhum. Isso é uma mentira que uma pessoa falou e todo mundo começou a reproduzir como um telefone sem fio — alerta Krüger.
Absorventes no Brasil
Diferentemente do que está circulando nas redes sociais, o estudo avalia somente absorventes internos e nenhum deles é vendido no Brasil. Por isso, a procura por outros métodos precisa ser avaliada com cautela.
Além disso, as especialistas ouvidas por Zero Hora defendem que a desinformação sobre o assunto pode ser nociva, principalmente, quando o direito de menstruar de maneira digna, segura e com acesso a itens de higiene ainda é um desafio para as pessoas que menstruam.
— Existe uma tendência por questões mais sustentáveis, mas na nossa realidade as pessoas ainda têm dificuldade de acesso a produtos de higiene íntima. Isso ainda é uma questão bem difícil do nosso ambiente porque se essas pessoas não têm acesso ao absorvente tradicional, como é que elas teriam acesso ao coletor menstrual que precisaria de um custo muito maior de investimento? — questiona Voigt.
Uma pesquisa realizada em maio deste ano pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), por meio da plataforma U-Report, em parceria com a Viração Educomunicação, mostrou que dos 2,2 mil participantes, 19% não tinham dinheiro para comprar absorventes e 37% apresentavam dificuldades de acesso a itens de higiene em escolas ou locais públicos.