Ao menos 500 pessoas participaram da 3ª Caminhada dos Transplantados no Parque da Redenção, em Porto Alegre, na manhã ensolarada deste sábado (25). O evento buscou sensibilizar a população sobre a importância da doação de órgãos e tecidos.
A atividade foi realizada pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), instituição pública com tradição na realização de transplantes adultos e pediátricos. Além dos transplantados, equipes de saúde, familiares e doadores se juntaram à causa.
A largada foi no Monumento ao Expedicionário, por volta das 10h. O trajeto de 1,5km incluiu o espelho d'água e a Avenida Osvaldo Aranha, com retorno ao ponto de partida. A caminhada durou cerca de 30 minutos e foi finalizada com aplausos. Um mar verde de pessoas que vestiam a camiseta do evento realizou o percurso, portando faixas sobre a ação, para conscientizar sobre os impactos positivos da decisão de ser doador.
Vida nova
Apesar de ter recebido um transplante de coração há menos de 20 dias, o engenheiro civil Paulo Simch, 57 anos, fez questão de marcar presença e participar da caminhada. A mensagem que ele quer propagar é a de que a população precisa procurar entender melhor o processo da doação de órgãos.
— A partir do momento em que a população entender como funciona, eu acredito que o número de doadores vai aumentar significativamente, e mais pessoas poderão se beneficiar com este ato — destacou.
Simch chamou atenção no evento pelas assinaturas em sua camiseta – autógrafos que solicitou à equipe do hospital responsável pelo seu transplante e vida nova.
— Sem a equipe e o doador, nada teria acontecido, então é um conjunto de coisas que acabam permitindo que a gente consiga viver outra vez. Não tem como expressar em palavras a gratidão. Isso é uma coisa que fica guardada no novo coração — frisou.
A aposentada Tupiara Silva Gomes, 66, também recebeu um transplante cardíaco, há cerca de sete anos, e participou da atividade pela terceira edição consecutiva. Ela teceu elogios à equipe do Hospital de Clínicas e enfatizou como a doação mudou sua vida:
— É muito importante, porque se eu não tivesse feito esse transplante, eu não estaria mais aqui. Eu sei que uma mãe perdeu um filho e eu estou com o coração do filho dela, mas se eu morrer, eu quero doar tudo o que estiver bom dentro de mim, tudo o que eles precisarem. E eu passo sempre isso para as pessoas, para elas terem essa noção: não adianta querer enterrar uma pessoa com tudo ali se você pode salvar uma vida.
Tupiara é a favor ainda de que as famílias receptoras e doadoras possam se conhecer, caso desejem – como seria seu caso.
Comunicação à família: o elemento mais importante
A atividade também contou com tendas com serviços de saúde e sociais, além de informações sobre como fazer o registro gratuito de doador de órgãos, por parte do Colégio Notarial do Brasil e da Associação dos Notários e Registradores. No entanto, a decisão final cabe à família – daí a importância de comunicar o desejo de ser doador.
Contudo, enquanto há muitas pessoas aguardando por um órgão, em cerca de 40% dos casos, as famílias negam a doação, de acordo com o Hospital de Clínicas. O entrave está relacionado à falta de conhecimento da comunidade, segundo Nadine Clausell, diretora presidente do HCPA e coordenadora do programa de transplante cardíaco. Por isso, é imprescindível conscientizar sobre a capacidade transformadora do ato – cada morte encefálica pode proporcionar oito transplantes.
— Mas ele só vai acontecer se houver doação. É um ato de solidariedade, de um entender, olhar para outro e pensar: "Bom, se eu não vou mais estar aqui por alguma razão, que outro possa viver" — ressaltou.
Com esse objetivo, o hospital – que ultrapassou a marca dos 10 mil transplantes em outubro – optou por dialogar com a comunidade pela ótica do paciente transplantado, evidenciando o impacto na vida real, para além da ciência e da pesquisa.
— A comunidade caminhando junto se dá conta de que o transplante é renovação, dá uma oportunidade de viver e de viver com saúde — afirmou Nadine.
A decisão de doar tem um "significado enorme" na saúde da comunidade, mas, para isso, é preciso que as pessoas entendam, discutam com a família e deixem a questão encaminhada ou até mesmo formalizada em tabelionato, para não haver dúvidas. A médica lembrou ainda que o procedimento está disponível pelo Sistema Único de Saúde (SUS), sendo o maior programa de transplantes via sistema público do mundo.
Maria de Sousa Costa, 71, aposentada, foi uma das milhares de pessoas que disse sim à doação: ela doou um rim para a filha Martha de Sousa Costa, quando ela tinha 16 anos. Dez anos depois, Martha precisou de um novo transplante. Contudo, o rim parou novamente, e agora, sua filha está pela terceira vez na fila, aguardando por outro órgão.
— É uma caminhada. É importante doar. Eu me senti feliz quando doei, se alguma coisa servir para doar, eu vou. Doe, porque aquele órgão vai servir para outras pessoas, vai tirá-las de uma fila, muita gente que está há muitos anos. Tem de conscientizar e conversar com a família — apelou a aposentada no evento.