O Brasil tem doses de vacinas contra o coronavírus para imunizar diariamente cerca de 250 mil crianças de cinco a 11 anos, ritmo considerado baixo por analistas. Se o país aplicasse 1 milhão de doses diárias na faixa etária, seriam evitadas 1,9 mil mortes e 8,4 mil hospitalizações de brasileiros de todas as idades entre janeiro e abril deste ano — considerando que a proteção aos pequenos quebraria a cadeia de transmissão e evitaria também a infecção e suas consequências nos adultos.
É o que mostra análise conduzida por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (Unesp), Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal do ABC (UFABC) e do Observatório Covid-19 BR. O estudo foi divulgado na terça-feira (15).
Se a aplicação fosse acelerada para a projeção do estudo, a campanha salvaria, até abril, 248 crianças e evitaria mais de 3 mil hospitalizações na faixa etária de cinco a 11 anos, em comparação ao ritmo atual. Isso é praticamente o acumulado de crianças mortas pela covid-19 desde o início da pandemia no país (308 óbitos) e quase metade das internações pediátricas registradas até agora (6.877).
— Ao vacinar crianças, você diminui a circulação viral e corta as cadeias de transmissão. Há grande vantagem para a comunidade como um todo, com benefício indireto maior para pessoas acima dos 60 e 70 anos. Ou seja, vacine seu filho e salve seu avô — resume Roberto Kraenkel, professor do Instituto de Física Teórica da Unesp, membro do Observatório Covid-19 BR e um dos autores do estudo.
Em termos de orçamento público, a vacinação acelerada ainda economizaria R$ 146 milhões com os custos de internação — destes, R$ 56 milhões apenas nas hospitalizações infantis.
Para o modelo matemático, os pesquisadores levaram em conta documento do Ministério da Saúde no qual a pasta afirma ter distribuído doses suficientes para aplicação de 250 mil injeções diárias em crianças no país. Também consideraram que o Plano Nacional de Imunizações (PNI) já chegou a aplicar 1 milhão de doses por dia.
O ritmo arrastado na vacinação pediátrica se deu, inicialmente, pelos empecilhos colocados pelo governo Jair Bolsonaro para início da campanha infantil, que só teve início semanas depois da autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No entanto, municípios e Estados relatam que, agora, o problema é a falta de interesse de brasileiros em vacinar seus filhos.
Há grande vantagem para a comunidade como um todo, com benefício indireto maior para pessoas acima dos 60 e 70 anos. Ou seja, vacine seu filho e salve seu avô.
ROBERTO KRAENKEL
Professor do Instituto de Física Teórica da Unesp, membro do Observatório Covid-19 BR e um dos autores do estudo
Na semana passada, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, comemorou que o Brasil atingiu 15% das crianças de cinco a 11 anos com a primeira dose. Mas prefeitos e secretários estaduais da Saúde afirmam que o ritmo está baixo e reclamam que o governo federal não incentiva a adesão.
No Rio Grande do Sul, que bateu recordes de hospitalização de criança, 235.819 crianças foram vacinadas até quarta-feira (16). A cobertura é de 24,5% na faixa etária.
— Temos muitas crianças infectadas em período muito curto porque temos muito mais adultos infectados ao redor das crianças. Junta isso com o fato de elas estarem desprotegidas porque poucas estão vacinadas. A criança, além de ser infectada por um adulto, tem o poder de transmitir a outros adultos. Mas a vacinação, mesmo que não impeça totalmente, reduz a transmissão — afirma a epidemiologista Suzi Camey, professora na UFRGS e outra autora do estudo.
O médico Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e não participante da análise, reforça a segurança e eficácia dos imunizantes pediátricos:
— O risco de miocardite por coronavírus na infância é de 15 a 20 vezes maior do que o risco por vacina. O risco por vacina é muito pequeno, principalmente na faixa etária pediátrica. A vacina é segura e eficaz.
Ações no Estado
A Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS) afirmou a GZH que o Rio Grande do Sul tem capacidade para vacinar mais pessoas do que atualmente e que a adesão deve aumentar com a volta às aulas presenciais, na próxima segunda-feira.
Para expandir a cobertura vacinal infantil, o governo do Estado alterou as regras e permitiu que prefeituras apliquem doses fora de postos de saúde. Além disso, organizou para o próximo sábado um mutirão estadual de vacinação infantil: o Dia C, de "criança". A ação foi orquestrada com as prefeituras.
Fora do Dia C, a expansão da vacinação para além dos postos de saúde depende de cidade para cidade. Desde fevereiro, São Leopoldo vacina em escolas. A partir de março, Canoas também o fará, em dias específicos, sob agendamento, com autorização dos pais.
No próximo sábado, Porto Alegre vacinará em sete instituições de ensino, e a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) estuda estabelecer aplicação itinerante em diferentes escolas. Santa Maria vacinará, no sábado, em um shopping e clube.
Esteio e Gravataí afirmaram que vacinarão apenas em postos de saúde, a despeito da recomendação do governo do Estado. Pelotas não aplicará em escolas, mas abriu ponto na Casa Cenáculo, administrada pela Arquidiocese do município.