O drama comovente enfrentado pelo casal de jornalistas Tiago Leifert e Daiana Garbin, que compartilhou via redes sociais e em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, a descoberta do retinoblastoma da filha, reforça a importância do acompanhamento da saúde ocular na infância. Lua, de um ano e três meses, está em tratamento para esse tipo raro de câncer, que acomete seus dois olhos.
Quanto mais precoce o diagnóstico, maiores as chances de se evitar que a doença atinja outras partes do organismo (metástases) e também de se conseguir a cura. A observação atenta de Leifert, que estranhou o olhar da menina ao voltar de viagem, foi determinante para a rápida busca de atendimento e realização de exames. Lua tem sido submetida a sessões de quimioterapia, aplicadas diretamente no local.
Os cuidados oftalmológicos começam ainda na maternidade. O teste do olhinho deve ser realizado em todos os hospitais públicos e privados. Trata-se de um exame de triagem com oftalmoscópio, espécie de lanterninha, para observar o reflexo no fundo do olho. Monick Goecking Cardoso Vieira, oftalmologista pediátrica e estrabóloga do Instituto de Puericultura e Pediatria da Martagão Gesteira da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que o médico avalia a presença de leucocoria, reflexo que deve ser alaranjado e fica esbranquiçado, atrapalhando a transparência do olho. Entre as causas, estão lesões na córnea, catarata congênita e doenças da retina, como o retinoblastoma. Também é realizada uma inspeção da área externa, em busca de possíveis alterações, como nas pálpebras, por exemplo.
Para crianças saudáveis, a orientação da Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica (SBOP) é de que seja feita uma avaliação a cada seis meses durante os três primeiros anos de vida, nas visitas ao pediatra.
– Independentemente disso, entre seis meses e um ano, a criança precisa ir ao oftalmologista para um exame completo. Deve voltar entre os três e os cinco anos, salvo alguma queixa, para mais um exame completo – detalha Monick, membro da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO).
Quanto ao desenvolvimento infantil, a médica afirma que, ao nascer, o bebê tem visão de vultos, embaçada. Passa a fixar o olhar em faces a partir de um mês. Aos três meses, pode mirar um objeto ou fisionomia e acompanhar seus movimentos. Quando chega aos cinco meses, começa a ser capaz de passar um objeto de uma mão para a outra, acompanhando esse movimento com o olhar.
– Se uma criança de três meses fica de cabeça baixa, não olha nos olhos, não fixa o olhar na conversa, precisa de avaliação. Tem crianças pequenas com estereotipias: colocam a mão contra a luz e ficam brincando com a sombra da mão. Se isso é muito repetitivo, chama a atenção – destaca Monick.
Ao longo da infância, mães, pais e demais responsáveis devem cuidar a postura visual da criança: ela aproxima demais os objetos para enxergá-los? Inclina a cabeça para ver melhor? Nistagmo (tremor involuntário dos olhos) e estrabismo fixo precisam ser avaliados. Nos primeiros quatro meses, diz a médica da UFRJ, é normal que o bebê apresente estrabismo de vez em quando, mas, se a condição for permanente, precisa ser analisada também nesta fase inicial de vida.
Outros sinais de alerta são lacrimejamento excessivo, coceira nos olhos e fotofobia (sensibilidade à luz). Na idade escolar, entre cinco e seis anos, crianças já conseguem perceber melhor eventuais dificuldades.
– Um teste que os pais podem fazer é brincar de fechar um olho e outro e observar se os filhos enxergam com a mesma qualidade com os dois olhos. Às vezes, o problema é unilateral, em um olho só, e a criança não informa. Se vocês não conversarem sobre isso com seus filhos, eles vão achar que todo mundo é assim – comenta Monick.
Retinoblastoma
Quanto ao retinoblastoma, Rodrigo Schwartz Pegado, oftalmologista especialista em retina e também membro da SBO, ressalta que, como no caso de qualquer câncer, o diagnóstico precoce é determinante para o sucesso do tratamento. Apesar da raridade desse tumor, de origem genética, trata-se do câncer ocular infantil mais comum. Se a descoberta é tardia, o paciente pode sofrer intervenções traumáticas, como a retirada do globo ocular. No Brasil, a identificação da doença costuma ocorrer apenas por volta dos três anos.
– A criança não consegue expressar a dificuldade de enxergar, não vai se queixar. Se o retinoblastoma for unilateral, como na maior parte dos casos, ela compensa com o outro olho. O desenvolvimento da visão vai até os sete anos. Até lá, o cérebro também está aprendendo a enxergar. A retina é um tecido nervoso responsável por captar a luz, transformá-la em química e levar a imagem até o cérebro. A visão não é do olho, é do cérebro – detalha Pegado.