Medo de reações adversas, negacionismo e sensação de “fim de pandemia” são as principais razões para gaúchos não tomarem a segunda dose de vacinas contra a covid-19, relatam prefeituras em sondagem da Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS) e do Conselho de Secretários Municipais do Rio Grande do Sul (Cosems-RS), divulgada nesta sexta-feira (19).
A pesquisa colheu relatos de gestores e servidores que atuam em áreas responsáveis pela vacinação de 144 municípios, cerca de um terço do Estado. Outros motivos citados, com menor prevalência, são a volta ao trabalho presencial, que dificulta o acesso à segunda dose, o esquecimento do prazo de intervalo e o horário limitado de postos de saúde.
Atualmente, o Rio Grande do Sul busca chamar cerca de 870 mil gaúchos a tomarem a segunda dose contra a covid-19 - destes, metade são jovens de 18 a 29 anos. Pessoas que não se vacinam, destacam analistas, contribuem para prolongar a pandemia e para o surgimento de novas variantes, uma vez que formam “bolsões” de transmissão da doença.
Hoje, 80% de toda a população gaúcha recebeu uma dose e 66,1%, o esquema completo, segundo dados do governo do Estado. É a terceira melhor cobertura de duas doses do Brasil, de acordo com o portal coronavirusbra1.github.io, que compila dados das secretarias estaduais da saúde.
Ainda assim, governantes e especialistas independentes temem uma nova onda da pandemia de covid-19, tal qual registrado em países como Alemanha, Áustria, Holanda e Bélgica, onde novos fechamentos foram impostos a comércios em meio à alta ocupação de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Tais nações têm coberturas vacinais maiores do que as registradas no Brasil e próximas à do Rio Grande do Sul.
— A maior razão para não se vacinar é o paciente ter apresentado, na primeira dose, febre e dor local, e então ter medo de nova reação da vacina. Mas vale destacar que isso geralmente não ocorre na segunda dose. Se não tivéssemos avançado na vacinação, estaríamos repetindo agora indicadores de março, com muito mais intensidade. Me preocupo com bolsões de não vacinados: se esse grupo crescer, teremos um 2022 com epidemia prolongada — afirmou a GZH o presidente do Cosems, Maicon Lemos.
Reações como dor no local da injeção, dor de cabeça, dor no corpo, febre e ínguas estão na bula das vacinas, acometem de 5% a 10% dos vacinados e passam após alguns dias, destaca Tani Ranieri, chefe da Divisão de Vigilância Epidemiológica do Centro Estadual de Vigilância em Saúde. São contratempos passageiros e pequenos frente ao risco da covid-19:
— Hoje, oito entre 10 óbitos na faixa etária de 18 a 39 anos são de pessoas que não tinham esquema vacinal completo ou a primeira dose. E 99% da população acima dos 60 anos que hospitaliza não tinha a dose de reforço. Isso nos mostra a importância de as pessoas aderirem ao esquema vacinal para chegarmos a um momento no qual vamos declarar o fim da pandemia. O que vemos em outros países é inclusive o recrudescimento de casos por causa de não vacinados — pontua a porta-voz do governo do Estado.
O médico Eduardo Sprinz, chefe do setor de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que reações mais graves ocorrem em raríssimos casos e que há muito mais chance de o coronavírus trazer consequências piores.
— Os estudos demonstram que pessoas vacinadas transmitem menos do que não vacinados e por menos tempo. A pessoa, ao tomar a vacina, protege a si e aos próximos. A reação adversa grave é extremamente rara, de um caso a cada 250 mil pessoas vacinadas com duas doses. Em Porto Alegre, se todas as pessoas se vacinassem, apenas seis teriam reação mais grave — destaca.
Ações para reduzir abstenção
Para incentivar a vacinação contra a covid-19, o governo Eduardo Leite (PSDB) estabeleceu que municípios que vacinarem 90% da população acima dos 18 anos com duas doses não precisam mais exigir passaporte vacinal para atividades como festas, cinemas e museus. Porto Alegre atingiu o patamar e deixará de exigir passaporte por decisão do prefeito, Sebastião Melo (MDB).
Agora, o governo do Estado e prefeituras começam a falar, sem meias palavras, que empresas e indústrias precisam dar um passo a mais e convocar trabalhadores a se vacinarem, como forma de evitar futuras novas restrições de circulação para salvar vidas.
A secretária da Saúde do Rio Grande do Sul, Arita Bergmann, já declarou que “é a hora de envolver a área que gera riqueza, a área econômica, que quer manter suas atividades, com as entidades que representam bares e restaurantes, comércio e indústria. Já avançamos muito. Não podemos recuar”.
Para além de mobilizar funcionários, Maicon Lemos, do Cosems, cita a possibilidade de grandes indústrias e empresas concentrarem pontos de vacinação — em Caxias do Sul, a medida foi tomada pela Marco Polo e pela Randon. Ainda no mesmo município, a prefeitura firmou convênio com entidades e levou vacinas para frente de bares e baladas no fim de semana — e quem se vacina ganha desconto na bebida.
Secretários municipais do Rio Grande do Sul ainda sugerem envolver rádios locais e realizar campanhas nos meios de comunicação, além de oferecer as vacinas em fim de semana e em horário ampliado e de ressaltar a eficácia dos imunizantes contra a covid.
O governo do Estado vê com bons olhos iniciativas como o Rolê da Vacina, em Porto Alegre, onde a prefeitura circula em diferentes bairros da cidade, em geral periféricos ou pontos de grande circulação, para levar a vacina mais próximo à população. A iniciativa leva vacina até a escolas de samba ou paróquias. Como alternativa focada em jovens, há analistas, como o virologista Fernando Spilki, que defendem a aplicação em escolas e universidades.