Cerca de 4 milhões de testes rápidos de antígeno para covid-19 estão parados, sob a guarda do Ministério da Saúde, e ainda não foram distribuídos pelo governo federal. Os kits deveriam ser entregues aos Estados através do Plano Nacional de Expansão da Testagem para Covid-19, lançado em setembro. Pouco mais de um mês depois, gestões estaduais e do Distrito Federal receberam apenas 13% do total previsto até o final de 2021.
De acordo com dados da própria pasta, em setembro foram entregues 2,4 milhões de testes às unidades da federação e, em outubro, a entrega foi de 5,6 milhões — no total, 8 milhões de testes de antígeno foram distribuídos no país no âmbito do plano de testagem até a semana passada.
A distribuição feita até agora passa longe do prometido pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga: a expectativa era de que de 10 milhões a 20 milhões de testes e kits de coleta fossem entregues por mês, totalizando 60 milhões até o final do ano.
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), fornecedora dos testes, já entregou ao Ministério da Saúde cerca de 12 milhões de testes de antígeno para coronavírus, fruto do acordo de 60 milhões. Até o fim de outubro, a Fiocruz afirma que terá mais 3,6 milhões de kits à disposição, o que só deve aumentar ainda mais o estoque do Ministério da Saúde. A produção ocorre em Bio-Manguinhos, no Rio de Janeiro, e no Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), também ligado à Fiocruz.
Os dados de distribuição dos testes aos Estados foram levantados pelo Ministério da Saúde a pedido de GZH, já que não aparecem no painel de testes do LocalizaSUS, plataforma de dados da pasta. A ferramenta, valorizada pela transparência durante a pandemia, mostra que, neste ano, o ministério só fez entregas de testes de antígeno às unidades da federação entre os meses de maio e julho (2,4 milhões), ignorando os envios realizados em setembro e outubro.
Questionado ainda na semana passada, o Ministério da Saúde não respondeu se há previsão de distribuição dos testes que estão estocados.
Estratégia de testagem
Bandeira de Queiroga desde que assumiu a titularidade da pasta em março, a estratégia foi pensada com o objetivo de instalar tendas em ambientes de grande circulação, como rodoviárias e aeroportos, além de ampliar a testagem em locais com registro de surtos de covid-19 ou de difícil acesso. Isso descentraliza a testagem, retirando a necessidade de procurar uma unidade de saúde para fazer o diagnóstico pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Com uma busca ativa de casos sintomáticos e assintomáticos, junto com a campanha de vacinação, a testagem foi pensada pelo governo federal como mais uma frente para diminuir a circulação do vírus, principalmente por conta da ação da variante delta no país.
A pasta, então, apostou no teste de antígeno (a sigla é TR-AG), que utiliza o swab nasal ou nasofaríngeo (cotonete) para a coleta das amostras. É um teste que possui precisão maior do que os sorológicos (IgM/IgG, feitos com amostras de sangue) e o resultado sai mais rapidamente, em até 20 minutos. Além disso, podem ser expostos a temperaturas de 2°C a 30°C. O RT-PCR, considerado o "padrão-ouro" da testagem, segue utilizado na rede pública de saúde para confirmar os diagnósticos e fazer sequenciamento genético do vírus para identificação de variantes.
Se agora há testes para covid-19 estocados, antes o problema era a falta deles. No início do ano, o ministro da Saúde enfrentou dificuldades para emplacar o novo plano dentro da pasta. A demora se deu no processo de compra dos testes. Em maio, Queiroga chegou a anunciar um esboço do programa de testagem, aprovado por Estados e municípios, prometendo a realização de 10 milhões a 26 milhões de testes rápidos por mês.
Além de resistência entre técnicos e servidores da pasta, recursos extras foram necessários para adquirir os itens. Em conversas internas, Queiroga chegou a dizer que, caso precisasse, usaria do seu próprio dinheiro para colocar o plano em prática.
Quando, finalmente, o acordo foi firmado com a Fiocruz, o plano nacional de testagem foi levado à público. Em um evento grandioso, realizado no dia 17 de setembro, Queiroga e os secretários da pasta estiveram em cinco cidades de cada região do país para acompanhar a realização dos testes. Foram investidos R$ 10 milhões somente na campanha publicitária do programa.
Na ponta
O plano nacional de testagem em massa chega timidamente a Estados e municípios na forma como foi pensado.
De acordo com o Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde (Conass), as ações de testagem já estavam consolidadas na ponta com testes rápidos adquiridos pelos próprios Estados e municípios, independentemente da ação do Ministério da Saúde. “Espera-se uma contribuição cada vez maior da gestão federal”, disse o Conass em nota, ressaltando que a estratégia contribui para dar agilidade ao diagnóstico.
No caso do Rio Grande do Sul, foi definido somente na última semana como os testes enviados pelo governo federal serão utilizados. Ainda que não tenha sido firmada uma data para começar, a ideia é abrir uma nova fase do projeto Testar RS, em vigor desde julho de 2020, instalando pontos próximos a estádios de futebol e universidades, além de regiões com grande circulação de turistas, como o litoral e a serra, além de outros municípios com mais de 100 mil habitantes. O plano, segundo o governo, também fará parte da Operação Verão 2021/2022.
Conforme a Secretaria Estadual de Saúde, o Rio Grande do Sul recebeu 148 mil testes de antígeno do Ministério da Saúde, no âmbito do plano nacional, que serão usados para esse fim. Os números divergem dos dados informados pela pasta, que afirma que enviou ao Estado gaúcho 281,5 mil kits entre setembro e outubro.
O que diz o Ministério da Saúde
"O Ministério da Saúde informa que as pautas de distribuição dos testes são elaboradas em um intervalo de, aproximadamente, 15 dias uma da outra, sendo a última consolidada em 19 de outubro. Vale destacar que os insumos são distribuídos conforme solicitação dos Estados."