A vacinação para pessoas de 50 a 70 anos começou na última segunda-feira (15) em regiões do Uruguai que fazem fronteira com o Brasil, no momento em que autoridades do país vizinho se mostram preocupadas com a situação da pandemia do lado brasileiro. O governo uruguaio destinou parte das doses que sobraram de outras regiões para reforçar a vacinação na fronteira e tentar blindar o país da ameaça de novas variantes, como a P1, de Manaus.
Na última segunda-feira (15), a artesã Miriam Moreira, 58 anos, estava entre os brasileiros com cidadania uruguaia que já se vacinaram contra a covid-19. Miriam tornou-se cidadã após o casamento com um uruguaio e vive em Rivera, no Uruguai, divisa com Santana do Livramento. A vacina mudou a rotina das pessoas que moram do lado brasileiro, já que as duas cidades são conurbadas, sem controle migratório. Mas, para se vacinar no Uruguai, é preciso marcar com antecedência.
O Ministério de Saúde uruguaio permite três diferentes formas de agendamento.
— Marquei por WhatsApp. Em 10 minutos realizei o agendamento. Três dias depois, estava imunizada — contou Miriam.
As autoridades dos dois municípios têm adotado protocolos diferentes no enfrentamento da pandemia.
No lado brasileiro, Livramento sofreu com o fechamento do comércio e atualmente está sob o impacto da bandeira preta no mapa de distanciamento controlado do Rio Grande do Sul, o que indica risco altíssimo de contágio. Já Rivera vem ocupando, desde o ano passado, o título de cidade uruguaia com maior número de casos no interior. Ainda assim, o governo local mantém restrições bem mais flexíveis do que as adotadas no lado brasileiro, inclusive com o comércio funcionando normalmente.
Os gaúchos da fronteira dizem que é um privilégio contar com a vacina no país vizinho.
— Estou muito feliz por morar em uma cidade de fronteira e poder receber a imunização. Acho que no Brasil vai demorar um pouco mais. Agradeço muito ao Uruguai por ter me dado essa oportunidade — afirmou Miriam.
Avanço
Segundo o Ministério da Saúdo Uruguai, a partir de hoje haverá a confirmação de outras faixas etárias para a imunização no país. Miriam aguarda a segunda dose, já marcada para o dia 5 de abril.
— Assim que eu tomar a última dose, quero voltar a levar uma vida mais próxima do antigo normal. Espero que, aos poucos, isso aconteça.
No Uruguai podem se vacinar moradores das cidades de Artigas, Bella Unión, Rivera, Rio Branco e Chuy. O governo do presidente Luis Lacalle Pou tem pressa, porque teme o aumento de casos importados do Brasil. No último domingo (14), o Uruguai registrou três recordes negativos: maior número de contágios em um dia (1.587), segundo maior número de mortes (14) e maior número de internados em UTI (124).
Nove dos 19 Departamentos uruguaios estão na chamada zona de risco: Salto, San José, Florida, Rio Negro, Montevidéu, Cerro Largo, Taquarembo, Artigas e Rivera. O ministro da Saúde uruguaio, Daniel Salinas, afirmou que o momento é um dos mais complexos da pandemia e é preciso "reavaliar" a abordagem da covid.
O Sindicato Médico do Uruguai pediu medidas para reduzir a mobilidade de pessoas e a Federação Médica do Interior (Femi) afirmou que o governo precisa olhar os dados de cada região de maneira diferente.
Lacalle Pou se reúne com seus ministros nesta terça (16) para decidir se adotará medidas restritivas. A Cátedra de Enfermidades Infecciosas da Universidade da República, a mais tradicional do Uruguai, também se manifestou em defesa da menor circulação de pessoas. O Departamento de Rivera é o primeiro a estar perto do colapso no sistema hospitalar. A região viu a ocupação das unidades de terapia intensiva chegar a níveis de saturação, de acordo com informações da Sociedade Uruguaia de Medicina Intensiva (Sumi).
Há 23 leitos em Rivera e foi organizado um plano de complementação regional para que os pacientes possam ser deslocados para outras regiões. Autoridades uruguaias vêm expressando preocupação com o que ocorre no Brasil, onde a pandemia saiu de controle, como no caso do Rio Grande do Sul, onde hospitais estão lotados, principalmente em Porto Alegre.
— Estamos ameaçados pela situação epidemiológica brasileira. A rapidez com a qual nos vacinamos vai ser fundamental para que o vírus deixe de sofrer mutações no nosso país. Enquanto o vírus estiver circulando, pode sofrer mutação — afirmou o ministro uruguaio, na semana passada.
Julio Pontet, presidente da Sumi, afirmou que o Uruguai atravessa "seu pior momento" na pandemia e destacou que a entidade está produzindo um plano de contingência para minimizar todos os problemas decorrentes da saturação dos hospitais. A cidade de Rivera, que tem uma população de cerca de 60 mil pessoas, tem 828 casos ativos de covid-19 e acumulou nos últimos sete dias uma média de 79 contágios para cada 100 mil pessoas, o mais alto do país.
— Hoje, nosso maior problema, sem dúvida, é o que está acontecendo no Brasil — afirmou José Mazzoni, vice-governador do departamento.
Vacinas
Em fevereiro, o Uruguai recebeu 192 mil doses da CoronaVac e iniciou a campanha de imunização há poucos dias. No Departamento de Rivera, ao menos 15 mil pessoas já foram vacinadas com as primeiras doses, de acordo com o intendente do departamento, Richard Sander. Uma nova carga de 1,5 milhão de doses deve chegar ainda nesta semana para impulsionar a campanha.
O Uruguai, que pretende vacinar o mais rapidamente possível seus 3,5 milhões de habitantes, também espera uma carga de 450 mil vacinas da Pfizer até o fim de abril. Desde o início da pandemia, o país registrou 71.691 casos e 712 mortes. Apesar dos números baixos, em comparação com os vizinhos, o Uruguai foi um dos últimos países da região a começar a vacinação.