Depois de uma campanha solidária de quase um ano, que mobilizou a região do Vale do Taquari até doadores do Exterior, a pequena Lívia Teles, de um ano e nove meses, recebeu nesta quinta-feira (13) a dose do medicamento Zolgensma, que precisava ser aplicado antes de ela completar dois anos de idade.
Diagnosticada aos quatro meses com atrofia muscular espinhal (AME), Lívia, que é de Teutônia, viajou com os pais no final de julho para Boston, nos Estados Unidos, onde foi realizada a aplicação do remédio.
Como a dose única do Zolgensma custa US$ 2,1 milhões (quase R$ 12 milhões), os pais da menina, Anderson Henrique Teles e Luana Cristine Diehl Teles, ambos com 30 anos, criaram uma campanha para arrecadar o valor necessário. Inicialmente, previram R$ 9 milhões e conseguiram arrecadar a quantia por meio de doações. A instabilidade cambial, porém, tornou o valor milionário insuficiente para o tratamento. O Zolgensma tem a capacidade de corrigir o DNA danificado que causa a doença.
Recurso na Justiça
Como recurso para garantir o tratamento, a família ajuizou uma ação judicial para a União complementar o valor arrecadado na campanha. Em 17 de junho, o juiz federal Andrei Gustavo Paulmichl concedeu a liminar determinando o pagamento do valor faltante. Em 2 de julho, a decisão foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. A União ainda acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a tutela provisória concedida. O ministro Dias Toffoli chegou a deferir o pedido, mas voltou a manter a decisão inicial depois da formalização de um pedido de reconsideração. A União, então, complementou o valor necessário para a realização do tratamento.
— A notícia da vitória na Justiça veio como um alívio, mas também com muita tensão, pois a União recorreu várias vezes. Por fim, conseguimos fazer o pagamento para o hospital e organizar a viagem para os Estados Unidos em poucos dias. Somente estando aqui já há alguns dias é que estamos começando a assimilar tudo o que aconteceu e que realizamos esse sonho de oferecer para a nossa filha o melhor tratamento disponível para a doença que ela tem — conta Luana.
Nova vida para Lívia
A AME é uma doença que afeta um a cada 10 mil recém-nascidos e pode levar à morte ou exigir o uso de aparelho de respiração artificial. O Zolgensma ainda não foi aprovado pela Anvisa no Brasil e, por isso, só é comercializado nos Estados Unidos, na Comunidade Europeia e em alguns outros países, como o Japão. Hoje, no Brasil, há apenas uma droga de combate à AME, chamada Spinraza, que é de uso contínuo e contém o avanço da doença.
Na página no Facebook criada para a campanha de arrecadação de Lívia, os pais contam diariamente como têm sido os dias na cidade norte-americana. Nesta quinta, a menina recebeu os 55 ml da medicação, num procedimento que durou uma hora.
— Lívia se manteve bem durante toda a viagem e aqui não tem sido diferente. Ela está tranquila e estável, o que também se confirmou nos exames que ela já fez. Estamos bem e nos preparando para o acompanhamento após a aplicação — conta a mãe da menina.
Lívia e os pais devem permanecer nos Estados Unidos por cerca de dois meses. Além da preparação para recepção da terapia gênica, a menina continuará sendo monitorada por profissionais do Boston Children’s Hospital até que seja seguro para ela retornar ao Brasil e continuar sendo acompanhada por profissionais locais.
Saiba mais sobre a doença
- A atrofia muscular espinhal (AME) é uma doença genética e hereditária que resulta em fraqueza progressiva dos músculos e atrofia, podendo levar à morte por falência respiratória.
- Ela é causada por mutações em um gene, o SMN1. Pessoas com apenas uma única cópia alterada do gene não terão sintomas da doença, mas são portadoras. Caso tenham filhos com outra pessoa que também tem uma cópia mutada, há 25% de chance dos filhos manifestarem a Ame.
- É classificada com base na idade de início:
TIPO 1 – Forma severa que pode se manifestar no bebê ainda no útero da mãe.
TIPO 2 – Forma intermediária que se manifesta entre 3 e 15 meses de idade.
TIPO 3 – Forma menos severa, a partir dos 2 anos até a vida adulta. - Sem uma cura definitiva, o tratamento exige fisioterapia e aparelhos ortopédicos. O único medicamento no mundo disponível até agora, o Spinraza, atua para impedir que a degeneração progrida, sendo de uso contínuo. É necessária internação e anestesia geral para que o medicamento seja injetado.
- O Zolgensma é aplicado diretamente na corrente sanguínea, sem necessidade de internação ou aparato mais complexo. Ele tem a capacidade de corrigir o DNA danificado que causa a doença.
- Com ambos os medicamentos, o diagnóstico precoce é fundamental. Para isso, é necessário o chamado teste do pezinho expandido, que atualmente não é oferecido pelo SUS e custa aproximadamente R$ 80 a mais do que o teste tradicional.