Gestores públicos de todo o país contestam os últimos movimentos do governo federal em relação à divulgação dos números do coronavírus no Brasil. O presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), Alberto Beltrame, criticou, nesta segunda-feira (8), a decisão recente do Ministério da Saúde, que passou a divulgar apenas o número de casos e óbitos confirmados nas últimas 24 horas, sem mostrar o acumulado.
Além disso, a pasta tirou do ar, na noite de sexta-feira (5), a plataforma que informava os dados da pandemia no país. Na noite de domingo (7), dois balanços diferentes foram divulgados: um às 20h37min e outro às 21h50min, na plataforma oficial:
— O que ele (o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello) tem dito é que vão ajustar e informar os números. É o que a gente espera; a sociedade brasileira espera por isso. Acho que há uma confusão desnecessária. O ajuste dos números pode ser feito sem derrubar os dados desta forma. As secretarias estão informando e vão continuar informando os dados — disse, em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade.
Segundo o gaúcho Alberto Beltrame, também secretário estadual de Saúde do Pará, Pazuello tem dialogado com os representantes estaduais, em um avanço em relação ao que acontecia na gestão de Nelson Teich. No entanto, após o vaivém dos últimos dias na divulgação dos dados, o Conass elaborou um painel próprio de informações reunindo dados de contaminados e de óbitos em contagem paralela à do governo federal.
— O painel vai continuar, porque achamos que a transparência é absolutamente indispensável. Esses dados não são dos Estados, nem do Ministério, mas da população, e a população precisa saber. Eles precisam ser ordenados de forma que sejam compreendidos pela sociedade e pela gestão. (Os dados) Precisam mostrar tendência e ajudar o gestor a tomar uma decisão. Tem que aumentar o número de leitos, pode afrouxar ou apertar o isolamento? Eu acredito e espero que o Ministério retome a divulgação adequada dos dados em breve.
Divergência de dados
Após alterar na semana passada a divulgação de mortes e infecções por covid-19, o Ministério da Saúde divulgou neste domingo (7) números contraditórios sobre a doença. Às 20h37min, as informações oficiais da pasta eram de 1.382 novos óbitos em 24 horas (um recorde para um domingo), elevando o total para 37.312. No mesmo período, foram 12.581 novos casos de infectados.
Às 21h50min, a plataforma oficial trazia dados diferentes. De acordo com o site, foram registrados 525 novos óbitos, somando 36.455. O total de novos casos chegava a 18.912 de sábado para domingo.
A diferença na apuração das mortes das últimas 24 horas entre os dois balanços é de 857 pessoas. O governo ainda não explicou a razão da diferença dos dados.
Desde sexta-feira, o Ministério da Saúde apresenta apenas os números das últimas 24 horas, e não o acumulado dos números da doença. No entanto, após a pressão, o governo voltou atrás e prometeu retomar a divulgação detalhada dos dados.
A pasta informou que pretende divulgar os dados tendo como base a data da morte, e não a data em que se confirmou que a pessoa morreu por coronavírus. Também foi feita a promessa de que o acumulado de dados voltará a ficar acessível.
Para Beltrame, este ajuste pode ser facilmente resolvido – e por isso, para ele, não era necessário ter retirado a plataforma do ar.
— A notificação dos óbitos, quando se dá de forma cumulativa, faz com que a curva epidemiológica pareça tender ao infinito. É fácil de corrigir: eu posso notificar o número de óbitos que eu conseguir cadastrar hoje, mas colocar na curva epidemiológica a data da sua ocorrência. (...) A cada dia que eu lanço o boletim, eu digo: “estamos notificando hoje 50 óbitos, dos quais 20, 10, 15 aconteceram nas últimas 24 horas, e os demais em dias anteriores”.
Dizer que gestores inflam números de mortes é “infâmia”
Beltrame também rebateu, na entrevista, a afirmação de Carlos Wizard (então cotado para assumir a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos) feita no sábado. Ele havia declarado que o número de mortos por covid-19 no país foi inflado por gestores estaduais e municipais com objetivo de receber mais recursos do governo.
— Isso é uma infâmia. Em primeiro lugar, demonstra desconhecimento total não só da forma do registro de óbitos, mas também da forma de financiamento do Ministério da Saúde. Ou ele está acusando médicos de preencherem a declaração de óbitos de forma incorreta, (...) ou os médicos preenchem corretamente e os secretários falseiam a informação e transformam tudo em covid-19. É de uma gravidade terrível e, por isso, fizemos esta nota. Felizmente teve o bom senso de se retirar — disse o presidente do Conass.
Na noite de domingo, Wizard informou, em nota, que não vai mais colaborar com o Ministério da Saúde na função de "conselheiro". Ele disse ainda que chegou a ser cotado para assumir a secretaria, mas que recusou.