Por Timothy Goh
Reportagem publicada originalmente no jornal The Straits Times, de Singapura
Pesquisadores de Singapura, no sudeste asiático, inventaram um teste que consegue detectar se uma pessoa tem anticorpos que neutralizam o coronavírus em apenas uma hora. A invenção, crucial na guerra contra a covid-19, se dá em um país que já foi considerado exemplo mundial de políticas públicas em busca da prevenção ao vírus, mas que sofre com um retorno da doença – uma espécie de segunda onda. O teste pode ser uma ferramenta no entendimento do avanço do contágio, na busca pela chamada "imunidade de rebanho" e também no desenvolvimento de uma vacina.
A Duke-NUS Medical School fabricará os kits para testagem junto à empresa GenScript Biotech Corporation e à agência nacional de ciência e tecnologia do país. Esses kits contém os recursos capazes de detectar a presença dos anticorpos neutralizadores do vírus que o corpo cria quando o coronavírus ataca uma pessoa. Segundo o professor Wang Linfa, da Duke-NUS Medical School, os testes existentes atualmente no mercado não podem ser fabricados em escala massiva. O diferencial do kit criado em Singapura é que ele não requer que o vírus esteja vivo para detectar os anticorpos. Isso significa que o novo teste, além de poder ser executado mais rapidamente, também pode ser fabricado em maior quantidade – embora, inicialmente, esteja disponível apenas nos hospitais de Singapura.
O reitor da Universidade Nacional de Singapura, Teo Yik Ying, comenta:
– Trata-se de uma descoberta formidável que significa um ganho de tempo para determinar se uma pessoa foi previamente infectada e, portanto, possui os anticorpos capazes de preveni-la de uma nova infecção. Atualmente, não sabemos ao certo se ser infectado significa automaticamente ganhar imunidade contra uma reinfecção, tampouco a duração do período em que a pessoa fica imune. Esse teste é um recurso crucial para guiar o mundo a conseguir respostas a essas dúvidas.
Quando uma pessoa está infectada, seu corpo produz centenas, se não milhares de anticorpos diferentes, que ligam-se ao vírus. Contudo, nem todos conseguem neuralizá-lo. Esse é o papel apenas dos "anticorpos neutralizadores", que ligam-se a proteínas na "casca" do vírus, impedindo-o de atacar as células da pessoa. O diferencial do novo teste criado no país asiático é que ele detecta esses anticorpos neutralizadores mesmo que o vírus não esteja mais vivo – além de não necessitar de uma complexa tecnologia laboratorial e dias de procedimento para localizá-los.
O novo teste é realizado com uma amostra de sangue, explica o professor Linfa, que é o diretor do programa de doenças infecciosas da Duke-NUS:
– Estamos em uma fase da pandemia na qual cada país discute sua própria estratégia em busca da cura e da prevenção. Na maioria dos casos, os anticorpos neutralizantes são a chave para alcançar isso. O novo teste ainda não é um indicador perfeito da presença desses anticorpos, mas é o que de melhor conseguimos obter para detectá-los.
Sobre os planos para expansão da fabricação dos testes, a escola Duke-NUS indicou que há planos de encontrar parceiros que trabalham com biotecnologia para incrementar a produção dos kits. O departamento nacional de ciência e tecnologia validou a pesquisa após usá-la com alguns pacientes e desenvolveu o protocolo de fabricação, além do plano para o controle de qualidade dos testes. Já a empresa GenScript foi responsável pelo design do produto, o que inclui seu conceito e otimização, e agora cumprirá papel central na comercialização usando seus contatos globais e sua capacidade de levar o teste a outros continentes.
Segundo o professor Linfa, o teste começou a ser desenvolvido em 10 de março. Dados conceituais foram estabelecidos 10 dias depois, e em 24 de abril os kits, já materializados, foram enviados para o diagnóstico e a aprovação da Organização Mundial da Saúde (OMS) – que deu sua autorização para o uso do teste no dia 8 de maio.
– Lutar contra a covid-19 é como uma guerra, quando tudo tem de ser processado muito mais rapidamente do que normalmente seria – resumiu Linfa.
Já o professor Peter Preiser, vice-presidente da Nanyang Technological University, afirma que o teste será particularmente útil para ajudar a identificar aqueles que foram expostos ao vírus mas se mostraram assintomáticos – uma parcela significativa da população que serviu de condutora para espalhar a covid-19.
– As informações sobre essas pessoas serão muito úteis para controlar o vírus e tomar medidas de reabertura econômica, por exemplo, minimizando os riscos de novas ondas de infecção.
O reitor Yik Ying ressaltou ainda que esse kit será especialmente útil em locais com menos recursos – onde o teste poderá chegar em breve.