Ao propor a flexibilização nas regras do distanciamento social, o governador Eduardo Leite segue um caminho semelhante ao que outros países começaram a percorrer na Europa e na Ásia.
Governos da Alemanha, Áustria, Itália, Espanha, Dinamarca e Coreia do Sul, entre outros, já determinaram a retomada parcial de atividades. Mas há uma diferença: esses lugares, de maneira geral, aliviaram as restrições depois de quedas significativas no número de novos casos de covid-19 e da aplicação de um grande número de testes entre a população.
Na Europa, que aparentemente começa a deixar para trás o período mais agudo das infecções, diferentes governos estão adotando planos de reabertura controlada. Mesmo regiões bastante impactadas, a exemplo de Itália e Espanha, anunciaram a retomada de alguns serviços não essenciais, como indústria e construção – embora os italianos tenham determinado que a maior parte das restrições seguirá até 4 de maio.
Além desses, Áustria, Dinamarca, Eslovênia, Bélgica e Bulgária já haviam permitido até a semana passada algum tipo de flexibilização, geralmente privilegiando setores ou atividades mais importantes e de menor risco. Outros países, como a Alemanha, República Tcheca, Noruega, Polônia e Albânia, programaram medidas de afrouxamento para esta semana.
Uma análise demonstra que, na maior parte dos locais onde foi adotada, a liberação foi antecedida por quedas expressivas nas infecções – 12% a menos na Itália e 38% na Áustria, por exemplo, na soma dos sete dias anteriores, em comparação com o período antecedente. No Rio Grande do Sul, levando-se em conta as notificações feitas até o domingo, essa taxa havia ficado perto da estabilidade, mas ainda com um pequeno crescimento de 2,7%.
Os pioneiros no abrandamento das proibições também investiram em aplicação de um grande número de testes, como a Coreia do Sul, que realizou precocemente mais de meio milhão de análises em uma população de 51 milhões de pessoas (cerca de 11 mil por milhão) e agora permitiu até a reabertura de igrejas e bares.
Os exemplos europeus oscilam ao redor de 20 mil testes aplicados por milhão de habitantes, enquanto no Brasil esse parâmetro está em cerca de 1,3 mil por milhão. O Piratini se apoia em um estudo feito por amostragem pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) que estimou 5,6 mil infectados no Estado.
Para o professor de epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e assessor do Hospital de Clínicas Jair Ferreira, “toda decisão tem um risco alto” – seja adotar a flexibilização e testemunhar uma revitalização da pandemia ou mantê-la por tempo demasiado e desembocar em uma crise socioeconômica de vulto.
— Para efeito de tomada de decisão, um estudo como o feito pela UFPel é útil. Mas não há risco zero em uma situação como a atual. Alguma flexibilização será inevitável, a boa notícia é que nossas UTIs estão com boa capacidade e, aparentemente, a pandemia não decolou no Rio Grande do Sul como em outros lugares — analisa Ferreira.
Infectologista da Santa Casa e professor da Ulbra, Claudio Stadnik avalia que o Estado está seguindo um modelo semelhante ao de países como a Alemanha, com aberturas parciais e progressivas. Ele acredita que a vantagem da estratégia gaúcha é avaliar cada região do Estado e cada momento da pandemia para tomar uma decisão que pode ser ampliada ou revertida mais adiante.
Uma diferença é que os europeus estão saindo do inverno, enquanto o frio vai aumentar no sul do Brasil nos próximos meses. Mas, para Stadnik, esse fator não tem se mostrado fundamental até agora.
— A transmissão depende mais de medidas de distanciamento do que do frio em si. Pelo que vimos até agora, não é determinante — analisa o infectologista.