À frente da Secretaria da Saúde de Bagé, Mario Mena Kalil enfrenta o desafio de conter o avanço do coronavírus no município, em meio ao pânico da população – os primeiros dois casos confirmados envolvem pessoas da direção da Santa Casa de Caridade, que tiveram contato com dezenas de funcionários e pacientes.
Mastologista, Kalil reconhece a gravidade da situação e diz que foi necessário "tomar uma posição muito agressiva na cidade", com a indicação de isolamento para casos suspeitos, porque não se sabe ao certo, ainda, "a real extensão da exposição" ao vírus. Com transparência e serenidade, Kalil relata as medidas já adotadas pela prefeitura e diz ter confiança na superação do problema, com a ajuda da comunidade.
A seguir, confira os principais trechos da entrevista concedida às 10h50min desta sexta-feira (20), por telefone.
Como está a situação em Bagé?
Estávamos montando toda uma estrutura, que era determinação da Organização Mundial da Saúde. Formamos comitê, preparamos os postos, estendemos horários, antecipamos campanha de vacinação. Só que não esperávamos o que aconteceu. Nós não tínhamos nenhum caso e, de repente, fomos surpreendidos por dois casos positivos. Um deles é o provedor da Santa Casa de Bagé (o médico Jorge Moussa), que todos já sabem, que está em Porto Alegre, no Mãe de Deus, e o outro, o administrador do hospital (Raul Antônio Vallandro). Como eles tiveram, na fase de febre, de contágio maior, contato com muitas pessoas, inclusive médicos, dentro de cooperativa médica, da provedoria, tivemos de tomar uma posição muito agressiva na cidade, porque não conhecemos a real extensão da exposição.
Qual é o número de casos suspeitos?
De lá para cá, tínhamos cinco suspeitos, que passaram para oito suspeitos e, neste momento (às 10h50min desta sexta-feira, 20 de março), são 18 suspeitos. Todos são pessoas envolvidas nesse círculo. Adotamos o isolamento como uma forma de tentar bloquear e saber o que está acontecendo, ter a noção da dimensão. A nossa preocupação é sair de uma transmissão direta para uma comunitária (quando não se sabe mais como ocorreu o contágio de um caso para outro), aí perdemos o controle.
Desses casos suspeitos, quantos são médicos?
Já são sete médicos suspeitos sendo coletados (para a testagem do coronavírus) e outras pessoas envolvidas, secretárias, profissionais, funcionários do hospital. E agora nos telefonou uma pessoa que veio de São Paulo e teve contato com um caso. É mais um possível suspeito que estamos indo coletar agora. Então, no momento, temos 18 suspeitos. Hoje terminamos todas as coletas, conseguimos automóvel para levar ao Laboratório Central do Estado.
Recebemos relatos de que a população está muito preocupada.
A situação realmente gerou pânico na população. As pessoas que consultaram, que tiveram exposição, todas estão preocupadas. A gente está muito tenso. É uma carga pesada lidar com toda essa situação, em uma população com mais de 100 mil habitantes, mas a nossa equipe está trabalhando de forma incansável, e é importante prestar informações para que todos tenham capacidade de se isolar imediatamente. Tivemos de falar de uma forma muito sincera para a população. Foi um grande impacto no primeiro momento, mas as pessoas entenderam e todos os envolvidos sabem com o que estão lidando, estão se isolando e estão nos telefonando, então, estamos conseguindo fazer essas coletas.
Vocês estão rastreando mais gente? Quantas pessoas podem ter a suspeita?
Sim. Não sabemos dizer o número exato (às 12h55min, Kalil informou pelo Whatsapp que 80 pessoas que tiveram contato com os casos suspeitos estavam em isolamento, além dos passageiros de três ônibus que foram abordados e mandados para casa no município). Todos, no hospital, estão sabendo, mas é um grande numero de funcionários e cada um mora numa zona da cidade. São profissionais que fizeram atendimentos. Aí você começa a multiplicar a possibilidade de exposição. Por isso, temos de adotar a conduta mais enérgica, mesmo tendo apenas dois casos confirmados.
Como está a saúde do provedor e do diretor da Santa Casa?
Os dois estão evoluindo bem. O dr. Jorge tem um problema respiratório e preferiram levar para Porto Alegre. Conforme o boletim de hoje, está muito bem.
O que mais lhe preocupa nesse momento?
Lidamos com muitos funcionários jovens e esses podem não apresentar sintomas. São funcionários de 20 e poucos anos. Vão fazer uma coriza, vão achar que não tiveram nada e vão sair com a doença por aí. Isso com certeza gera preocupação. Por isso, é importante que a gente repasse essas informações, para fazer com que as pessoas nos ajudem.
Qual é a orientação?
Todos os possíveis casos devem ficar em isolamento, em casa. As pessoas que tiverem uma piora nos sintomas podem nos acionar (telefones para contato: 53 3312-2624 e 53 3312-4212), porque a A UBS (Unidade Básica de Saúde) tem uma equipe volante para fazer a coleta residencial (de material para exame). Estamos bem estruturados, temos um comitê atuante, formado por diferentes órgãos, e temos o apoio da sociedade.
Que outras medidas foram tomadas para conter o vírus?
A vacinação contra o H1N1 começaria segunda-feira (23), mas, antes mesmo desses resultados, já tínhamos antecipado para este sábado (21). Vamos abrir sete unidades para que os idosos possam fazer a vacina. Além disso, montamos uma estrutura na frente da UPA para fazer triagem dos pacientes que ali chegarem em estado gripal, porque, se essa pessoa entrar na UPA, vai contaminar os demais. Também fizemos uma reunião com hospitais para definir áreas novas para receber pacientes. O Hospital Universitário aderiu, vai reabrir a UTI e nós vamos colocar mais respiradores. Esperamos não precisar usar. As ações são rápidas e contundentes.