O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) caminha a passos largos em direção ao aprimoramento da técnica de cirurgia robótica. A instituição é a primeira do Sul do Brasil a realizar cirurgias em cânceres do aparelho digestivo por meio de uma tecnologia chamada firefly (vagalume, em tradução livre), que é associada ao robô Da Vinci - equipamento controlado pelo cirurgião por meio de um console. Ela é um corante especial que mostra a vascularização dos tecidos próximos a um tumor.
A novidade auxilia os cirurgiões a serem mais precisos na retirada de partes doentes dos órgãos, mas também a avaliar a vascularização dos tecidos na reconstrução do segmento operado, diminuindo a possibilidade de complicações futuras no pós-operatório. Até o momento, foram realizadas operações de câncer de estômago, esôfago e pâncreas.
Uma vez aplicado no paciente, o corante pode ficar verde, o que significa que os tecidos estão bem irrigados, nutridos e com oxigênio, ou seja, funcionando. Se ele indicar coloração avermelhada, quer dizer que a região operada está sem irrigação, que o tecido está morto. Leandro Totti, professor do Serviço de Cirurgia Geral do HCPA, afirma que a novidade ajuda os cirurgiões a serem mais precisos na reconstrução de segmentos de órgãos que precisam ser retirados de pacientes com câncer.
— Às vezes, poderia acontecer de retirarmos um excerto do órgão que não estava necessariamente comprometido e que poderia ter sido mantido. O firefly nos ajuda a sermos mais precisos quanto a este corte e indica onde temos escassez de fluxo sanguíneo no tecido, o que funciona como indicativo de que devemos avançar um pouco mais na ressecção para que ele cicatrize sem complicações — diz Totti.
O especialista diz ainda que, por estar associada ao cirurgião-robô Da Vinci, a tecnologia faz com que o período de internação do paciente caia para seis dias, sendo que em cirurgias convencionais ele ficaria internado por 10 ou 14 dias. O professor ressalta também que estudos preliminares apontam para a redução da dor no pós-operatório e maior rapidez na retomada de atividades cotidianas.
A implantação da firefly teve um investimento de R$ 1,38 milhão, o aporte é proveniente de um projeto aprovado pela Financiadora de Inovação e Tecnologia (Finep).
Console duplo auxilia no processo de aprendizagem
Pioneiro entre os hospitais públicos acadêmicos na implantação da plataforma Da Vinci, o HCPA já realizou mais de 500 cirurgias robóticas desde 2013, ano em que implementou o programa, que demandou um investimento de R$ 10 milhões da entidade. Por estar focada no ensino e formação de novos profissionais e entender que o uso deste tipo de tecnologia é o futuro da medicina, já que a aplicação de robôs nos procedimentos traz bons resultados, residentes passaram a ser treinados em simuladores.
A capacitação dos profissionais implica uma série de aulas e testes em aparelhos que fazem uso de realidade virtual. Cada etapa exige o desenvolvimento e aperfeiçoamento de habilidades de manuseio dos controles, que são os responsáveis pelos movimentos das pinças de corte, sutura e movimento de câmera. Uma vez aprovado nesta primeira avaliação, o médico ou residente faz, em média, 20 cirurgias acompanhado de um médico mais experiente no manuseio da tecnologia para então alçar voos solo, pontua Milton Berger, diretor-médico do HCPA.
— Adquirimos dois consoles, porque isso permite que o cirurgião mais experiente passe o controle do procedimento para quem está aprendendo. Ficamos com uma espécie de copiloto, mas que assiste tudo em tempo real e que pode tomar o controle da operação a qualquer momento. Por isso, o robô tem uma série de medidas de segurança, por exemplo, eu posso travar o funcionamento das pinças do aprendiz a qualquer momento. É uma plataforma extremamente funcional para um hospital focado no ensino — avalia Berger.
Munido de quatro braços, o robô tem em uma de suas extremidades uma câmera que permite uma visão 15 vezes ampliada dos tecidos e órgãos. Além disso, as pinças têm movimento rotacional de 720° e um filtro que zera a possibilidade de qualquer tipo de tremor, pontua professor do Serviço de Cirurgia Geral do HCPA:
— Temos maior precisão e delicadeza nos movimentos para separar os tecidos bons dos ruins e isso, consequentemente, melhora os resultados de procedimentos oncológicos.
As cirurgias robóticas são ofertadas para convênios particulares para os pacientes oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS) que estejam envolvidos nas pesquisas da instituição.