O governo do Estado se comprometeu a analisar a proposta de criação de um modelo gaúcho do Médicos pelo Brasil, programa do governo federal que vai substituir o Mais Médicos. O projeto chamado de Médicos pelo Rio Grande, apresentado pelo Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul (Cosems/RS), pretende amenizar o impacto negativo causado pela criação do novo programa federal, que vai diminuir o número de vagas de profissionais, focando em cidades menores.
A ideia, pensada em conjunto com a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), prevê a concessão de bolsas de estudo para médicos residentes, que poderiam atuar com estes contratos por até três anos, renováveis por mais três. O pagamento dos salários seria feito pelo governo do Estado: os vencimentos seriam custeados abatendo o valor da dívida não negociada do governo com municípios, que, conforme as entidades, soma R$ 480 milhões (valor não empenhado em governos anteriores).
Pela ideia do Cosems/RS, o Médicos pelo Rio Grande teria como objetivo contemplar cidades que não forem incluídas no programa do governo federal. A previsão é de que, se forem gastos de R$ 3 milhões a R$ 5 milhões por mês, o programa, que tem foco na atenção primária, possa durar de oito a 10 anos. Depois disso, a continuidade teria que voltar a ser discutida.
— O que estamos fazendo é criando ferramentas para mostrar ao governo que há alternativas. Queremos gerar assistência para as pessoas. Depois do abatimento total da dívida, teríamos que discutir alternativas para custear o programa, como recurso dos municípios ou de emendas parlamentares. Mas até lá haveria tempo para se preparar — argumenta o presidente do Cosems/RS, Diego Espíndola.
A secretária estadual de Saúde, Arita Bergmann, não garante que o modelo será adotado, mas diz que o Estado fará uma análise da viabilidade da proposta. Ela conversou com a reportagem de GaúchaZH na manhã desta quarta-feira (21), quando participava de evento que discute a atenção primária, na Sogipa.
— Dentro do que é nossa responsabilidade, vamos verificar se há viabilidade legal, se há condições do ponto de vista financeiro e se temos profissionais disponíveis no Estado. Por isso não quero, neste momento, criar expectativas dizendo sim ou não.
O estudo será feito por uma comissão que envolve as secretarias de Planejamento, Saúde e Fazenda, além da Procuradoria-Geral do Estado e da Casa Civil.
— Precisamos de tempo para ver se é possível ou não tornarmos real algo que pode ser um sonho. Mas um sonho, quando é sonhado por muitas pessoas, se for para atender o interesse público [...] Nós seremos parceiros.
O secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Erno Harzheim, diz que apoia a iniciativa, mas que não haverá aporte de recursos do governo federal.
— O governo federal criou o seu programa, que tem número menor de vagas no Rio Grande do Sul porque estamos alocando médicos onde mais precisa, através de métrica exata que mede desigualdade e necessidade em saúde. Mas os Estados e municípios têm plena liberdade para tomar suas decisões e fazer seus próprios programas. A gente acha positivo, importante. O Ministério da Saúde pode apoiar a iniciativa depois de conhecê-la em detalhes, mas, do ponto de vista financeiro, a gente já tem um programa para o qual nosso recurso está destinado.
Impacto
A mudança de posicionamento do programa, passando de Mais Médicos para Médicos pelo Brasil, deve focar em regiões onde há maior vazio assistencial, como Norte e Nordeste. O envio de profissionais vai ocorrer de acordo com a vulnerabilidade das cidades — assim, grandes municípios devem perder profissionais.
No Rio Grande do Sul, o número de vagas cairá de 1.315 para 858, sendo 589 em municípios considerados prioritários, conforme o Ministério da Saúde. Isso, conforme o Cosems/RS, deve ter impacto significativo:
— Hoje, 97 cidades gaúchas estão sem nenhum médico depois da saída dos cubanos. Só aí já temos uma demanda emergencial. E vai ficar pior, porque outros médicos devem deixar o Estado, e grandes cidades ficarão sem profissionais pelo programa — alerta Diego Espíndola.
O município de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, é um exemplo. A cidade contava com 46 médicos e, com a saída dos cubanos e encerramento gradual dos contratos de outros médicos, conta hoje com 36 profissionais. O município não receberá nenhuma vaga pelo novo programa do governo federal.
— Estamos aguardando alternativas e esta (Médicos pelo Rio Grande) é uma delas. Estamos internamente nos preparando para a saída desses médicos, mas isso tem um alto custo para nós — lamenta o secretário de saúde, Naasom Luciano.
A ideia de abater os custos do Médicos pelo Rio Grande da dívida do Estado também é uma alternativa buscada pelos municípios para que haja garantia de repasse da verba. As entidades argumentam que há R$ 480 milhões em atraso que não foram negociados — são valores que não foram empenhados em governos anteriores.
Em 2019, o governo tem pago em dia os repasses do atual exercício. A dívida de R$ 162 milhões com os municípios que já havia sido empenhada está sendo paga em 16 parcelas — nesta terça-feira (19), foi feito repasse de R$ 13,5 milhões.