O Rio Grande do Sul tem 140 cidades à espera de profissionais para atuar no Mais Médicos. O número equivale a 37,3% dos 375 municípios gaúchos atualmente contemplados pelo programa do Ministério da Saúde. Em alguns deles, todos os médicos renunciaram aos cargos.
Ao todo, o Estado tem 1.318 vagas pelo programa — 1.056 estão preenchidas e 262 seguem em aberto. Os dados foram repassados, com exclusividade, ao site GaúchaZH pelo secretário-executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo dos Reis.
Dos municípios com falta de profissionais, 46 estão sem nenhum integrante do Mais Médicos. Quatro dessas cidades têm perfil de extrema pobreza, sendo consideradas prioridade pelo governo federal: Aceguá, na Campanha; Alecrim e Porto Mauá, no Noroeste; e Chuí, na região Sul. Segundo a secretária municipal da Saúde de Alecrim, Jacinta Froehlich, os profissionais — um cubano e um uruguaio — que atuavam nas equipes de Saúde da Família foram substituídos por dois brasileiros.
— Mas eles ficaram por pouco tempo. Pediram para sair após serem aprovados em cursos de residência — conta a secretária.
Com isso, a prefeitura precisou realocar o médico concursado para atender os pacientes, além de contratar mais um profissional por algumas horas semanais.
— Nossa esperança é que as duas vagas sejam preenchidas no edital em aberto. Já teve médico que demonstrou interesse em atuar por aqui — destaca Jacinta.
Até lá, o município de 7 mil habitantes está sem o repasse da União. Com a desistência dos médicos brasileiros, o Ministério da Saúde suspendeu os recursos destinados a Alecrim.
— Não recebemos o valor desde a competência de maio. Estamos sem médicos e sem recursos — lamenta ela.
Edital lançado para suprir desistências
A queixa sobre a suspensão dos repasses contraria informação do Ministério da Saúde, que garantia a renovação dos valores para cidades com médicos que abandonaram as vagas. No início de abril, uma portaria foi publicada pela pasta estendendo para seis meses o prazo de pagamento da verba de custeio repassada às unidades de saúde da família que perderam profissionais.
Segundo o Ministério da Saúde, a regra anterior cortava o repasse para o posto se ficasse sem médico por mais de dois meses. "Os gestores dessas localidades podem utilizar esses recursos também para contratar seus próprios médicos", afirma a assessoria da pasta, em nota.
Questionado pela reportagem, o ministério respondeu que atendem aos critérios da portaria no Estado apenas os municípios de Alvorada, na Região Metropolitana; Encruzilhada do Sul, no Vale do Rio Pardo; Nonoai, no Norte; e Santa Vitória do Palmar, na região Sul. No entanto, o órgão não informou por que municípios como Alecrim não estão contemplados. O valor repassado é de R$ 4 mil mensais por equipe. Cada equipe de saúde da família é composta por um médico, um enfermeiro, um auxiliar ou técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde.
Em 13 de maio, o governo lançou um novo edital do Mais Médicos para preencher as vagas abandonadas pelos profissionais brasileiros na última seleção. São 2,2 mil postos no país, sendo 71 destinados ao Rio Grande do Sul. Cinquenta e três municípios gaúchos são contemplados pelo edital. Conforme o ministério, os profissionais podem iniciar as atividades nos locais escolhidos a partir do dia 24 de junho.
Alívio em São Gabriel ao reabrir unidades
Em São Gabriel, na Fronteira Oeste, quase todas as vagas do programa estão preenchidas. Após ficar sem metade dos profissionais de dezembro de 2018 a março deste ano, o município de 65 mil habitantes já está com o atendimento normalizado. O secretário municipal da Saúde, Ricardo Coirolo, respira aliviado com a situação atual.
— Passamos por uma situação bem complicada na saída dos médicos cubanos, com sete profissionais a menos. Tivemos que investir R$ 210 mil por quase quatro meses para garantir médicos na cidade — relembra, ao frisar que até os postos de saúde do interior do município foram fechados por falta de equipe.
Atualmente, São Gabriel conta com duas vagas desocupadas.
— Temos 15 profissionais do Mais Médicos e mais dois concursados. Conseguimos reabrir todas as unidades do interior, além de retomar os atendimentos na unidade móvel — comemora.
Governo vai propor novo programa
O Mais Médicos pode deixar de existir no governo de Jair Bolsonaro. Para o seu lugar, o Ministério da Saúde está elaborando um novo programa. De acordo com o secretário-executivo da pasta, a medida provisória (MP) sobre o tema deve ser encaminhada ao Congresso Nacional ainda neste semestre.
— Teremos uma transição gradual entre o programa atual e o novo. Os profissionais selecionados pelos últimos editais do Mais Médicos serão mantidos durante a vigência do contrato, podendo ainda ser renovado pelo mesmo período — garante Gabbardo.
Ainda segundo ele, o Mais Médicos virou uma bandeira política e precisa ser repensado.
— No novo programa, as cidades contempladas serão as que têm baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), alta vulnerabilidade e difícil acesso — detalha.
Com isso, os municípios com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais alto serão incentivados a estender o atendimento nas Unidades Básicas de Saúde com médicos próprios. A contrapartida será o repasse maior de verba por parte do governo federal. A MP deve ser encaminhada ainda no mês de junho, mas precisa ser analisada pelos deputados e senadores.
— Não temos como prever um prazo para a implantação do novo programa, pois depende do rito do Congresso — observa o secretário-executivo.