Diversas terapias e dispositivos foram desenvolvidos para auxiliar as pessoas no combate ao vício no cigarro — que é a causa da morte de 7 milhões de pessoas, entre fumantes ativos e passivos, todos os anos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre eles está o uso de cigarros eletrônicos, que, até então, não tinham sua eficiência comprovada. Entretanto, um estudo publicado na quarta-feira (30), na revista científica inglesa New England Journal of Medicine, mostrou que essa ferramenta é duas vezes mais eficaz do que produtos de reposição de nicotina, como adesivos e chicletes, segundo reportagem publicada no jornal The New York Times.
O levantamento foi realizado na Grã-Bretanha, durante um ano, com 886 fumantes, divididos em dois grupos e escolhidos aleatoriamente para utilizarem os cigarros eletrônicos ou as terapias mais tradicionais de reposição de nicotina. Além disso, eles também participaram de, pelo menos, quatro sessões semanais de aconselhamento, um elemento considerado crítico para os resultados positivos do estudo, segundo os pesquisadores.
Ao final da análise, foi percebido que a taxa de sucesso dos usuários de cigarros eletrônicos foi de 18%, enquanto a registrada pelo segundo grupo — que utilizou chicletes ou adesivos de reposição de nicotina — alcançou apenas 9,9% de êxito.
Estes dispositivos eletrônicos fornecem aos fumantes a nicotina, mas sem o alcatrão tóxico proveniente da inalação da queima do tabaco. No entanto, a ferramenta ainda não é aprovada por agências reguladoras do Brasil, dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha justamente porque não havia comprovação científica de que eles funcionem na cessação do uso de cigarros convencionais.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) se manifestou, em 2009, sobre o tema quando publicou a resolução RDC 46/2009, que proíbe a comercialização do item "especialmente os que aleguem substituição de cigarro, cigarrilha, charuto, cachimbo e similares no hábito de fumar ou objetivem alternativa ao tratamento do tabagismo"
Analucia Saraiva, gerente de Relações Científicas da Souza Cruz — empresa líder no mercado de cigarros no Brasil — afirmou, por meio de nota, que acredita na importância de promover um debate amplo sobre o assunto com a Anvisa e a sociedade civil para revisitar as normas regulatórias, tanto dos vaporizadores quanto dos produtos de tabaco aquecido.
— Os dispositivos sem combustão representam um "marco tecnológico" na história da indústria do tabaco em termos de saúde. Há um crescente consenso entre muitos órgãos de saúde pública de que os produtos sem combustão apresentam um perfil de risco significativamente reduzido comparado ao cigarro tradicional — disse Analucia.
Peter Hajek, principal autor do estudo e professor de psicologia clínica na Universidade Queen Mary, de Londres, afirma que a pesquisa pode reverter esse quadro.
— Os profissionais de saúde têm relutado em recomendar seu uso por causa da falta de evidências claras de ensaios clínicos randomizados. Agora, é provável que isso mude — disse Hajek
Cautela no uso
O New England Journal dedicou grande parte de sua atual edição a e-cigarros, publicando dois editoriais e uma carta. A coleção incorpora ainda o emaranhado debate sobre saúde pública sobre os dispositivos. Um editorial escrito pela especialista em saúde comportamental Belinda Borrelli e pelo pneumologista Dr. George T. O'Connor frearam as inclinações à adoção da ferramenta.
O editorial da revista científica recomendou que os cigarros eletrônicos fossem indicados quando outras abordagens de cessação, incluindo aconselhamento comportamental, tivessem falhado; que os pacientes usem a menor dose de nicotina possível e que os prestadores de cuidados de saúde estabeleçam um cronograma objetivo para o uso de cigarros eletrônicos.
Como os fumantes foram recrutados nas clínicas, eles já estavam predispostos a parar de fumar. Os participantes eram tipicamente de meia-idade, consumiam entre meio maço e maço por dia e já haviam tentado parar com o nocivo hábito.