Cento e quarenta municípios gaúchos já tem o câncer como principal causa de morte de seus moradores, conforme um estudo divulgado na segunda-feira (16) pelo Observatório de Oncologia do movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM). Além dos números preocupantes, as projeções para os próximos anos não são nada otimistas, e incluem Porto Alegre – de fora desse levantamento – como a primeira capital no Brasil a ter a doença como principal causa de óbitos, fato que pode ocorrer ainda em 2018.
Caxias do Sul, que está no topo da lista, teve, em 2015 – ano do levantamento –, 669 mortes em decorrência do câncer. O número corresponde a 25% do total de óbitos daquele ano no município. Na sequência, vem Passo Fundo (315 mortes por câncer), Bento Gonçalves (169), São Gabriel (141) e Erechim (140).
Mas como explicar essa crescente nos casos da doença em uma região do país considerada desenvolvida?
Para o oncologista do Hospital Mãe de Deus Carlos Barrios, há três fatores que contribuem para esses índices: longevidade da população, hábitos semelhantes aos países desenvolvidos e herança genética:
— Vivemos com hábitos europeus e americanos nas coisas boas e ruins. A soma desses fatores, mais o fato da herança de DNA muito europeia, faz com que a gente se aproxime de sociedades onde a doença mais se desenvolve.
Outro ponto ventilado pela coordenadora do movimento TJCC e presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), Merula Steagall, diz respeito à infraestrutura melhor da Região Sul, o que facilitaria a identificação do problema:
— Em algumas regiões sem estrutura, podem ter mortes não registradas porque as pessoas nem chegaram ao diagnóstico. Das registradas e diagnosticadas, aparece onde tem mais infraestrutura.
Contudo, esse posicionamento gera debate.
— Isso pode ser parcialmente verdade. Não é problema de diagnóstico, é de incidência. Os costumes e hábitos das pessoas do Norte e Nordeste justificam um número maior de casos de determinados tumores. Certas doenças comprometem mais determinadas populações — pondera Barrios.
Prevenir e acelerar o diagnóstico
Embora Porto Alegre esteja fora do levantamento – segundo o CFM, nenhuma capital teve o câncer como principal causa de morte em 2015 – o salto da doença na cidade preocupa: entre 2007 e 2015, as mortes provocadas pelo câncer subiram 13,6%, enquanto as doenças cardiovasculares, principal causa de morte hoje, caíram 13,3%.
— Nesse ritmo, projetamos para 2018 que Porto Alegre vai ser a primeira grande cidade do Brasil onde o câncer será a principal causa de morte. No Rio Grande do Sul, estima-se que isso ocorra na próxima década — diz o médico oncologista.
Para além de fazer um raio-X da doença nos quatro cantos do Brasil, o estudo pretende tocar no tendão de Aquiles da enfermidade no país: o diagnóstico precoce.
— Demora mais ou menos seis meses entre os primeiros sintomas até a confirmação. A partir daí, a lei diz que o paciente precisa iniciar o tratamento 60 dias após o diagnóstico. Isso ainda não está ideal, mas 80% das pessoas já conseguem tratar nesse período. A demora é chegar ao diagnóstico — avalia.
Outro objetivo do estudo é discutir o câncer como doença prevenível por meio do controle de hábitos de vida. Má alimentação, tabagismo e sedentarismo são alguns dos fatores de risco para a doença.
— A prevenção será a solução para as próximas décadas — finaliza Merula.