A informação oficial, que está estampada no site da Fraport, empresa concessionária do Salgado Filho, é: “as operações no Aeroporto de Porto Alegre permanecem suspensas por tempo indeterminado”, em decorrência do alagamento da pista e das áreas de circulação de passageiros ocorrido no início do mês de maio.
Há 15 dias, a empresa — também subsidiária do AG Frankfurt Airport Services Worldwide, o maior da Alemanha, e uma das líderes mundiais deste mercado — estimou que os voos só serão retomados em dezembro, portanto, sete meses após a interrupção dos serviços.
O prazo é considerado por empresários, políticos e passageiros muito extenso, uma vez que a solução emergencial, montada na Base Aérea de Canoas, não contempla sequer 10% dos cerca de 200 voos comerciais movimentados, em média, diariamente, no Salgado Filho quando em pleno funcionamento.
Na semana passada, em entrevista à Rádio Gaúcha, a CEO da Fraport Brasil, Andreea Pal, aprofundou os cronogramas. Segundo ela, serão necessários no mínimo 45 dias, a contar da última segunda-feira (3), para que o primeiro estudo das condições da pista, que ficou submersa por quase duas semanas, possa identificar a real profundidade do problema. Significa que apenas por volta do dia 17 de julho haverá diagnóstico e avaliação mais clara dos danos e prejuízos.
Nesse ínterim, surgem comentários que indicam como resolver o problema e vão desde a construção de um novo aeroporto até o simples recapeamento da pista, o que, tecnicamente, não se sustenta tendo em vista os critérios de engenharia e a necessidade de recursos, estimados para recolocar o espaço em condições de restabelecer pousos e decolagens.
— Para nós, como para toda a indústria e a população do RS, a situação é muito difícil e temos o maior interesse em abrir o mais rápido possível. A data, em dezembro, é algo que a gente colocou sem saber qual é o dano — declarou Andreea, ao ponderar que será preciso conduzir testes muito intensivos na pista para entender qual é a real condição da pista e, consequentemente, o tamanho do reparo necessário.
Essa etapa de avaliação envolve, por exemplo, cinco companhias que realizam coleta de material e análises de resultados de asfalto enviadas a laboratórios internacionais já contratados para atuar nos próximos 45 dias, equipamento especial para simulação de pousos com medição da resistência da pista e uso de algoritmos desenvolvidos e aplicados pela FAA (Federal Aviation Administration), a autoridade aeroportuária dos Estados Unidos, e análise de scan para demonstrar o acúmulo de água que pode ter entrado no asfalto e danificar com o tempo ainda mais a situação, entre outras questões técnicas e de segurança. Sem essas especificações vencidas, é impossível avançar.
Cálculo de reequilíbrio econômico da concessão
A estimativa da Fraport é de que os prejuízos provocados pelo alagamento ultrapassem a casa de R$ 1 bilhão. O seguro contra danos materiais cobre R$ 2 bilhões, mas o valor de ressarcimento para alagamento fica restrito a cerca de R$ 130 milhões, ou seja, cobriria menos de 15% da projeção inicial de danos.
Sem a primeira bateria de estudos, é inviável fixar os custos exatos e necessários ao cálculo do reequilíbrio econômico do contrato de concessão. Para se ter uma ideia, a própria Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) afirma que a empresa já fez jus ao ressarcimento de R$ 291,7 milhões por perdas causadas pela pandemia de covid-19 nos anos de 2020, 2021, 2022 e 2023. No entanto, esses valores, apesar de reconhecidos, mas não quitados em sua integralidade.
Também será necessário chegar a um denominador de como os custos serão abatidos do contrato. Conforme explica o ex-diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) Luiz Afonso Senna, o fator decisório, nesse caso, será o governo.
Segundo ele, quando há o desequilíbrio, é preciso estabelecer de que forma isso será pago, faz-se um termo aditivo e só então o setor privado que detém a concessão poderá realizar os investimentos:
— Você não pode pedir para o privado fazer sacrifícios que estejam além do que está pactuado. Isso se chama filantropia e não concessão. Eu acho que episódios como esse que a gente está vivendo servem de lição e aprendizado para que a gente saia do amadorismo. O contrato de um aeroporto, o contrato de uma rodovia, o contrato de um porto, é uma coisa muito complexa.
1) O que diz a empresa concessionária do aeroporto, a Fraport
- Começaram na semana passada os testes com furos no solo para avaliar o que acontece embaixo do asfalto e pelos próximos 45 dias (por volta do dia 17 de julho) cinco companhias distintas realizam diversos testes e comprovações de resultados.
- A data fixada em dezembro é uma aproximação, porque tudo dependerá dos testes, que envolvem a segurança dos passageiros e esse vai ser o único elemento que guiará o prazo de reabertura.
- Se a pista estiver em estado bom e a base e a sub-base (interior da pista) estiver em estado aceitável não está descartada a abertura abreviada, entretanto, dificilmente antes do mês de outubro.
- O cálculo para reabertura em dezembro considera que não será preciso refazer a sub-base e o asfalto. Caso essa base receba a comprovação dos testes de que foi afetada, o problema pode se tornar mais complexo. Do contrário, os prazos seriam acelerados, mas dificilmente antes de outubro.
2) O que diz a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac)
- O prazo de reabertura parcial, ou seja, apenas para voos domésticos, do aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, estabelecido para dezembro de 2024, é uma estimativa pontual realizada pela Fraport Brasil.
- A ideia de retomar as operações do aeroporto durante a alta temporada de 2024 (período do Natal) ainda precisará ser confirmada.
- Uma estimativa real só poderá ser feita após a realização dos testes e das sondagens da infraestrutura que ficou sob a água, que já foram iniciados na semana passada e levarão cerca de 45 dias.
- São esses testes de resistência do solo, de compactação e pavimentação, é que possibilitarão afirmar, tecnicamente, os reais impactos causados pelo acúmulo de água durante as últimas semanas na pista.
3) O que dizem os especialistas consultados por GZH
- Segundo o coordenador do Curso de Ciências Aeronáuticas da Escola Politécnica da PUCRS, Lucas Fogaça, o prazo é provisório, pois após o solo secar, ainda é necessária avaliação em profundidade do estado da pista, do subleito e das estruturas de atendimento aos passageiros.
- Além disso, o especialista comenta que os equipamentos para voo por instrumentos (pouso e decolagem em condição de tempo fechado e voo noturno) são importados e dependem de trâmites que fogem ao controle da concessionária, como disponibilidade e liberação alfandegária e de orçamento.
- Há muita margem, segundo Fogaça, inclusive, para a ampliação deste prazo conforme os laudos forem sendo finalizados ao longo das próximas semanas e meses, em razão da extensão do alagamento.
- Para o ex-diretor da ANTT e da Agergs Luz Afonso Senna, não há margem para abreviar prazos em critérios que são, sim, complexos, demorados e precisam garantir a segurança da retomada dos voos e que envolve mais do que apenas realizar o recapeamento do asfalto.