Iniciadas em junho de 2022 e com previsão de término em fevereiro de 2025, as obras de revitalização do Centro Histórico de Porto Alegre seguem avançando. A prefeitura não divulga um percentual de conclusão sob alegação de que os trabalhos ocorrem em diversas vias simultaneamente, o que inviabilizaria essa definição.
A reportagem percorreu o trajeto das obras nesta segunda-feira (13) para verificar o andamento dos trabalhos no chamado Quadrilátero Central. As reformas abrangem trechos da Avenida Borges de Medeiros, das ruas Vigário José Inácio, Doutor Flores, General Vitorino, Marechal Floriano Peixoto, Uruguai e Voluntários da Pátria.
Na Voluntários e nas primeiras quadras das vias adjacentes já não há bloqueios para veículos e pedestres. O maquinário foi retirado nas últimas semanas e avançou em direção à Rua dos Andradas, onde as obras se concentram desde outubro.
Entretanto, apesar da aparência de conclusão, quando se caminha pela Vigário José Inácio e pela Doutor Flores, é possível perceber que ainda faltam reparos nas calçadas, que agora estão pavimentadas com blocos de concreto. Em alguns pontos, ainda há cones e fitas sinalizando algum trabalho a ser concluído.
Gerente de uma loja de roupas na Rua Marechal Floriano Peixoto, Marcelo Marquez, 48 anos, diz que as vendas em seu estabelecimento caíram 40% durante os quatro meses de obra no local. Ele avalia que faltou planejamento para a execução dos trabalhos.
— Então, eles deveriam fazer uma rua toda em um mês, três semanas, depois avançar para outra rua. Não fazer uma aqui, amanhã fazer em outra rua, outro buraco, outra sujeira. O centro ficou um caos. Foi muito mal planejado — comenta.
Marquez também opina que o ideal seria que aquele trecho da rua fosse destinado apenas aos pedestres por ser muito estreito. Com relação ao acabamento, ele aprovou as melhorias nas calçadas e no pavimento.
Dificuldade de locomoção
Na Andradas, quase esquina com a Borges de Medeiros, onde uma pilha imensa de blocos de concreto foi formada próximo à Esquina Democrática, a instalação de tapumes em ambos os lados da rua causa transtornos aos pedestres e lojistas.
Carlos Rodrigues, 32, gerente de uma filial de uma rede de fastfood na Andradas relata uma série de transtornos enfrentados com as obras. Segundo ele, desde que a pilha de blocos de concreto foi depositada no local, os fornecedores precisam estacionar o caminhão na Borges de Medeiros e carregar os condimentos nos braços até a loja.
Em uma loja de acessórios localizada em frente ao tapume, o fiscal de loja Davi Amarante, 35, se espreme entre a entrada da loja e os transeuntes para ficar próximo à porta. Ele aponta para as mercadorias no mostruário e comenta que o pó da obra já está alcançando os produtos. Ele também diz que já observou redução no movimento.
— Agora, quem está passando do outro lado da obra não consegue ver a loja e quem passa aqui na frente fica esmagado — pontua.
Além das obras, outro fator que dificulta a locomoção são os vendedores ambulantes que atuam na região central. Para conter essa situação, a Guarda Municipal e a Diretoria-Geral de Fiscalização da prefeitura vêm realizando a Operação Calçada Livre. Segundo o Executivo, em 2023, três pessoas foram presas e mais de 15 mil itens foram apreendidos pela ofensiva.
Poeira e lama
Uma reclamação comum entre diversos comerciantes se refere à sujeira. Em dias de calor e vento, o pó das obras sobe e se deposita nos vidros, no chão e até nas mercadorias. Em dias de chuva, o problema é a lama dos locais onde as pedras foram removidas. O espaço para as pessoas transitarem nas calçadas também ficou reduzido. Em alguns locais, é preciso fazer malabarismos para desviar dos buracos que restaram onde o pavimento foi retirado.
Rodrigues conta que, quando as obras começaram, o capacho verde posicionado na porta da loja passou a ser lavado diariamente, mas diz que agora eles simplesmente desistiram da lavagem diária devido à grande quantidade de sujeira que se acumula pelo chão.
Na Avenida Otávio Rocha, onde o canteiro central foi reformado para abrigar as novas bancas de flores e de revistas, o concreto já apresenta deformidades. Alguns comerciantes preferem não se manifestar publicamente por medo de represálias da prefeitura, mas há insatisfação com a disposição das novas instalações.
Em alguns pontos da Otávio Rocha, as cavidades retangulares dos bueiros foram abertas no chão, rentes às calçadas, mas sem grades de proteção, o que pode oferecer riscos a pedestres desatentos que estejam caminhando pelo local.
Mudanças de prazos e valores
O orçamento inicial era de R$16 milhões e teve um aditivo de R$ 2 milhões das obras nas calçadas, totalizando R$18 milhões. Prevista inicialmente para dezembro de 2024, no dia 6 de setembro foi publicado no Diário Oficial de Porto Alegre (Dopa) um termo aditivo prorrogando a vigência das obras até 6 de fevereiro de 2025. O valor também foi atualizado para R$ 20 milhões.
A Smoi afirma que o custo previsto era de R$ 18 milhões e que houve um acréscimo de R$ 2 milhões de reajuste anual, o que resultou no montante de R$ 20 milhões.
Prefeitura presta esclarecimentos
Segundo o secretário municipal de Obras e Infraestrutura, André Flores, o prazo das obras se estendeu porque o início dos trabalhos foi adiado devido a imprevistos com instalações elétricas e hidráulicas.
— Quando iniciamos as obras encontramos uma série de interferências que não estavam planejadas, como a energia elétrica e como a rede do Dmae, que já tem 40 anos. Tivemos que fazer algumas adaptações no nosso cronograma — diz o secretário.
Flores reitera que além da reforma das calçadas e pavimento, também está ocorrendo a substituição da rede hidráulica do Centro. Ele explica que o cronograma prevê que o Dmae execute os reparos primeiro e, somente depois, a Smoi inicie as reformas nas calçadas, o que acaba ampliando o tempo das intervenções.
Sobre a realização dos trabalhos em diferentes pontos simultâneos, o secretário diz que foi uma estratégia adotada para garantir a celeridade do processo. Segundo ele, as equipes iniciam as obras em três pontos diferentes ao mesmo tempo e, caso ocorra algum imprevisto em algum trecho que ocasione a interrupção das atividades, os trabalhadores se deslocam para algum dos outros pontos.
— Não encontramos uma maneira de fazer a obra sem causar transtornos às pessoas e reduzir a caminhabilidade na via — diz Flores sobre as reclamações de poeira e dificuldade de deslocamento nas calçadas.
Com relação às deformidades no piso de concreto da Otávio Rocha, o secretário diz que este problema e outros que forem observados pelos técnicos da Smoi serão repassados ao consórcio responsável pela obra (formado pelas empresas RGS, ACR e Elmo), que tem o dever de fazer os devidos reparos.
Sobre a ausência de piso tátil para os deficientes visuais na Otávio Rocha, outro ponto questionado por pessoas que frequentam o local, o secretário explica que nas esquinas há sinalização no chão, embora não seja exigido pela norma técnica.
— Nós também uniformizamos o piso. Antes tinha trechos de basalto, ladrilho e até porcelanato, o que dificulta muito a sensibilidade da bengala. Colocando um só piso, como fizemos, facilita bastante a locomoção — acrescenta.
Flores diz que ainda não sabe se haverá alguma mudança com relação à possibilidade de estacionar veículos ou ao tráfego de carros pelas vias do Centro, pois essa decisão compete ao setor de mobilidade urbana, mas opina que o ideal seria que não fosse permitida a permanência de automóveis nas vias reformadas. Ele pontua, entretanto, que o novo pavimento tem capacidade para suportar até 30 toneladas.