A Justiça Federal autorizou que a comunidade indígena mbyá-guarani permaneça na área de mata conhecida como Mato do Júlio, em Cachoeirinha, na Região Metropolitana, enquanto tramita um pedido de reintegração de posse movido pela empresa Habitasul. A decisão da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) foi proferida por unanimidade no dia 2 deste mês.
O terreno com cerca de 300 hectares, localizado entre a BR-290 e a Avenida Flores da Cunha, pertence à empresa Habitasul, que pede a remoção dos indígenas. O grupo ocupou a área em setembro de 2021 e agora foi autorizado a permanecer no local enquanto tramita o pedido de reintegração de posse.
Na decisão, o colegiado considerou que a desocupação afetaria o direito fundamental à saúde e à moradia do grupo indígena. A Defensoria Pública da União (DPU), que representa os indígenas, recorreu ao tribunal após a 9ª Vara Federal de Porto Alegre ter fixado o prazo de 15 dias para desocupação voluntária da área ou haveria execução forçada.
A medida foi suspensa antes do prazo, em dezembro do ano passado, por meio de liminar proferida pela relatora, desembargadora Vânia Hack de Almeida.
Conforme a DPU, o local vem sendo reivindicado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com processo administrativo em aberto. Há um estudo antropológico afirmando que o local é imprescindível para sustento, reprodução física e cultural da etnia, cuja permanência lá dataria de décadas, de acordo com a DPU.
“A imposição de retirada e deslocamento de inúmeras famílias indígenas coloca em risco a saúde sanitária de toda a comunidade”, apontou a desembargadora Hack de Almeida, acrescentando que “é menos gravosa a manutenção das famílias no local, enquanto não restar definida a questão da posse sobre as duas glebas de terras”.
No terreno, a comunidade afirma cultivar alimentos como feijão e milho. Segundo Luis Karai, integrante da comunidade mbyá-guarani, pelo menos 15 famílias estão alocadas no Mato do Júlio desde 17 de setembro de 2021. Ele explica que os indígenas foram até o lote guiados pelo ancião Alexandre Acosta com o objetivo de proteger a mata.
— Para nós, é muito importante a preservação da área verde. Com isso, o pessoal da cidade também ganha. A gente vê muita destruição e uma das poucas áreas que sobrou foi o Mato do Júlio. Viemos guiados pela nossa religião — explica o indígena.
Ele acrescenta que a comunidade não tem vínculos com partidos políticos e pontua que a decisão da Justiça pela permanência no local contribui na luta contra o preconceito.
— Sobre a decisão de ficarmos, a Justiça está fazendo apenas a sua parte de quebrar o preconceito que a gente sofre hoje — diz Karai.
Habitasul vai recorrer
A GZH, a assessoria de imprensa da Habitasul informou que "a empresa respeita a decisão, mas entende que está juridicamente equivocada, pelo que buscará a sua reforma".