A cena que comoveu a professora Priscila Caron deixaria qualquer pessoa tocada: uma criança usando chinelo, bermuda e camiseta, caminhando até a sala de aula em um dia frio do inverno gaúcho. A triste realidade do estudante despertou uma ideia: a educadora faria ainda mais por seus alunos.
Sem condições de presentear a turma inteira com o salário do magistério, ela buscou ajuda da comunidade – e até mesmo de pessoas que nunca viu na vida – para arrecadar o suficiente para dar um casaco a cada matriculado na Educação Infantil da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Lidovino Fanton.
— Eu estava muito agasalhada, casaco, botas, e me deparei com esse aluno tremendo de frio. Pensei "ele não tem como aprender e nem eu como dar aula vendo essa cena sem fazer nada" — relembra.
A primeira ação foi em 2013 no colégio da vila Restinga Velha, área mais vulnerável do bairro Restinga, no extremo-sul de Porto Alegre. Desde então, foi realizada anualmente, exceto nos dois últimos anos por causa da pandemia de coronavírus. Chegou a 275 alunos e está na sétima edição. A ideia, neste ano, é presentear mais cem alunos, contemplando cinco turmas com alunos de idade entre quatro e seis anos:
— O brilho nos olhos deles, de ganhar um casaco novo, ficar quentinho, é maravilhoso.
Como ajudar
A fim de incentivar doações, mesmo que insuficientes para adquirir uma peça (cada jaqueta custa entre R$ 120 e R$ 150), a servidora criou cotas: R$ 50 é o valor sugerido para contribuição. Contudo, qualquer quantia ajuda a atingir a meta, estimada em R$ 13 mil para a centena de casacos.
A conta para depósito é em nome de Priscila Tatiane Silveira Caron, via chave Pix cadastrado com o CPF da professora: 010.742.550-54
A compra é feita à vista, com o montante reunido pelas doações, e costuma ter um pequeno desconto frente ao valor cheio. A organizadora busca, frequentemente, parceiros que possam oferecer o produto com a mesma qualidade a um custo menor.
A data limite estipulada por ela na vaquinha é 31 de maio, para que haja tempo de distribuir antes da chegada do inverno, que começa oficialmente em 21 de junho. Caso o total supere a estimativa, ela comprará sapatos, luvas e outros itens da mesma linha.
Casaco da primeira edição ainda é usado por aluna
A educadora busca tamanhos maiores que a idade das crianças, para que possam ser usados com outras blusas e também para que sigam servindo com o passar do tempo. Tamnhos 6 e 8 são os favoritos.
Dafne Alessandra Silva Siciliano, 10 anos, está atualmente no 5º ano do Ensino Fundamental. Na primeira vez que a professora entregou as roupas, foi uma das contempladas, e, até hoje, ela utiliza o casaco.
— Muito obrigado, professora — disse a menina, na manhã desta sexta-feira (27) ao vivo na Rádio Gaúcha.
A mãe de Dafne, Mari Santos, 40 anos, é autônoma. Vende lingerie, doces e outros produtos para manter a casa, ao lado do marido.
— A ajuda foi muito importante. Na época eu não teria como comprar um casaco desses. Até hoje seria difícil — complementa a mãe de Dafne.
Prefeitura tem campanha semelhante
A Secretaria Municipal da Educação (Smed) apoia a iniciativa da escola e também se inspira para uma campanha na Escola Porto Alegre (Rua Washington Luiz, 203, Centro Histórico). A instituição recebe jovens e adultos em situação de rua e, na sede, recolhe roupas quentes para a população atendida.
O prédio tem banheiros adaptados para banhos dos alunos, espaço com tanques para lavagem de roupas e espaço para estender e secar as peças. Há, ainda, parceria com a Escola de Psicanálise de Porto Alegre, que faz atendimentos individuais dos estudantes três vezes por semana.