Porto Alegre e cidades da Região Metropolitana ainda enfrentam uma série de problemas ocasionados pela falta de energia elétrica e desabastecimento de água desde domingo (6). Na noite de terça-feira, protestos foram registrados em dois pontos da Capital e em Alvorada. A motivação foi pela falta de previsão para o retorno e não atendimento nos canais de comunicação da CEEE Equatorial.
Desde o temporal de domingo, milhares de pessoas seguem sem luz em casa. Instituições como o Ministério Público do Estado (MP), a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) e o Procon RS se manifestaram sobre o grave problema. Veja o que diz cada um:
MP investiga demora na volta da luz e atendimento aos clientes
O MP aponta que acompanha atentamente o problema da falta de energia elétrica no Estado. Conforme o promotor Rossano Biazus, da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, percebe-se um aumento no número de reclamações por causa de queda de energia elétrica. Apesar de não ter um número exato, o promotor estima que seja um crescimento em torno de 40% no período correspondente de um ano para cá.
O promotor afirmou que as reclamações são mais localizadas e que a CEEE Equatorial tem atendido essas demandas. O MP, porém, demonstra preocupação com a demora no restabelecimento da energia elétrica depois de eventos como o temporal de domingo.
Dois pontos em particular estão sendo verificados pelo MP – a demora para o restabelecimento da energia elétrica e a comunicação da companhia com os clientes, que reclamam de que não conseguem ser atendidos pelo canais oficiais.
O promotor disse que é uma obrigação do fornecedor atender e informar seus clientes, especialmente em casos relevantes como o de prestação de um serviço de natureza pública. O MP pretende averiguar com a CEEE Equatorial se houve redução nas equipes que atendem no setor de reclamações.
Questionado sobre possíveis sanções, o promotor cita que a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) tem poder de aplicar desde advertências a multas mais pesadas. E até, em último caso, cassação do direito de exploração do serviço.
Agergs promete tomar medidas enérgicas
O presidente da Agergs, Luiz Afonso Senna, promete que fortes medidas serão tomadas em função do problema de falta de energia elétrica:
— Vamos ser extremamente duros e rígidos para que seja cumprido o que está acordado no contrato com a CEEE Equatorial. Vamos cobrar para que as empresas privadas sejam competentes. Se o corpo gerencial não dá a resposta para os problemas, que seja colocado para a rua — afirma.
A agência reconhece que muitos problemas de queda de energia elétrica ocorrem até em razão de eventos naturais, como um raio, por exemplo. Em locais em que a rede não é enterrada, um raio pode afetar o fornecimento de energia. Porém, faltar luz de maneira tão frequente e o tempo de resposta da companhia ser tão demorado chamou atenção da Agergs.
— Estamos muito preocupados porque há pessoas há três dias ainda sem luz em suas moradias. Fiquei também sem eletricidade em casa e liguei para o serviço do 0800 da companhia, e foi sofrível o atendimento. As respostas precisam ser rápidas — observa.
Sobre as sanções que a Agergs pode aplicar contra a CEEE Equatorial, o dirigente explicou como funciona o caminho. Há um convênio com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que transfere a fiscalização para a Agergs em nível local. Neste momento, por exemplo, destaca que acontece uma investigação extraordinária do evento da falta de energia elétrica. No fim do processo, se avalia se é possível aplicar a multa. Depois, há outras regras para se definir o valor da penalização.
Senna citou o caso da Rio Grande Energia (RGE), que foi penalizada em 2018 devido a uma série de irregularidades. A multa foi de R$ 34 milhões, mas a RGE recorreu. Faz mais de um ano que a situação está sendo analisada na Aneel para se decidir se a multa será efetivada ou não. Também comentou que a CEEE Equatorial, antes da privatização, recebeu muitas multas ao longo das décadas.
Vamos ser extremamente duros e rígidos para que seja cumprido o que está acordado no contrato com a CEEE Equatorial. Vamos cobrar para que as empresas privadas sejam competentes. Se o corpo gerencial não dá a resposta para os problemas, que seja colocado para a rua
LUIZ AFONSO SENNA
presidente da Agergs
— Estamos recebendo muitas reclamações não apenas de falta de luz em Porto Alegre. Há muita gente reclamando de prejuízos materiais, como a perda de medicamentos usados para hemodiálise e diabetes que ficam guardados em geladeiras. A infraestrutura é a base para que a economia aconteça. É muito grave o que ocorre na CEEE Equatorial, e me surpreende a lenta resposta que a empresa dá. É mais devagar do que a resposta de quando ainda era estatal. Não podem alegar que estão em transição. Há empresas que foram competentes desde a transição, outras, não. Tudo depende de quem fiscaliza. Se a fiscalização é competente para cobrar e multar, a empresa privada se adapta rapidamente — reflete.
O dirigente disse ainda que é impossível comparar dados ou a situação da CEEE Equatorial com outras operadoras após a privatização.
— Na concessão, o que trocou foi o controle acionário. Não é feito um novo contrato, é o mesmo da época da CEEE estatal. E o acionista muda o tempo inteiro. É como comparar amoras com beterrabas, que, na verdade, possuem cores iguais — diz.
Procon diz que vai abrir investigação
O Procon de Porto Alegre informou que não recebeu reclamações nem denúncias em função da falta de luz. Mas vai abrir uma investigação para ver se a situação fere os direitos do consumidor.
Já o Procon estadual tem sido procurado por meio das redes sociais em relação ao desabastecimento de energia elétrica. Conforme o órgão, em muitas situações, ocorre o encaminhamento do problema aos Procons municipais, que são os responsáveis pelo atendimento ao consumidor em cada um dos municípios.
Apenas dois casos estão registrados no sistema do Procon estadual sobre fornecimento de energia elétrica, que é monitorado pela Agergs. O Procon RS, porém, acompanha o que ocorre no Estado. O diretor-executivo do órgão, Rainer Grigolo, confirma a situação:
— Nossas demandas sobre falta de energia elétrica são quase imperceptíveis e não refletem a realidade porque não chegam até nós. São direcionadas pelo público para a Aneel e a Agergs. E o que chega não tem relação com o problema do abastecimento de energia elétrica.
CEEE Equatorial faz investimentos para recuperar sistema sucateado
A CEEE Equatorial respondeu, por meio de nota, aos questionamentos de GZH. Sobre a frequência com que o problema de falta de energia elétrica se repete, a companhia argumentou que as últimas interrupções foram ocasionadas por três temporais seguidos, sendo um no domingo, de grandes proporções, além de dois na segunda-feira (7), nas regiões Sul e Metropolitana. A respeito do que está mais problemático disse o seguinte:
"As tempestades, conforme informado anteriormente, que trouxeram grandes problemas para a rede elétrica e a falta de investimentos que sucateou o sistema nos últimos cinco anos. Intempéries deste tipo ocasionam a queda de galhos de árvores e outros objetos sobre a rede elétrica, o que exige maior tempo de restabelecimento. Somente neste ano, a CEEE Grupo Equatorial já registrou sete tempestades com grande intensidade em sua concessão".
A companhia também comentou as críticas que recebe em relação aos dados divulgados sobre o número de clientes sem luz em casa:
"Domingo à tarde, chegamos ao 'pico' de 190 mil clientes sem energia. A CEEE Grupo Equatorial restabeleceu o fornecimento de energia para 167 mil consumidores até segunda-feira, início da tarde, ficando 23 mil sem energia. Entre as 15h do mesmo dia e a manhã de terça, houve tempestades na capital e na região sul do país, o que necessitou de recontagem de clientes sem energia, aumentando o número para 65 mil (no início da noite desta quarta-feira, o total estava em 45 mil consumidores desabastecidos)".
Além disso, a companhia alega que não tem como estabelecer um prazo para o retorno da luz:
"Os prazos para a solução de cada ocorrência dependem da complexidade de cada caso. Uma situação simples de falta de energia é diferente de outra, que envolve queda de vários postes. Em casos mais complexos, são necessários os seguintes serviços: deslocamento e acesso de equipes às localidades com fornecimento interrompido, em alguns casos, dificultados pelas próprias ocorrências, alagamentos e dificuldade de trânsito; ações em parceria com outros órgãos públicos (Defesa Civil, SMAM, Corpo de Bombeiros, EPTC, etc.), já que alguns serviços prestados são interligados e envolvem várias atividades; isolamento da área afetada, retirada de objetos e reconstituição de postes quebrados e de toda a rede elétrica."
O superintendente técnico da CEEE Equatorial, Julio Hofer, afirmou mais cedo à Rádio Gaúcha, durante o programa Gaúcha Atualidade, que não havia como estipular um prazo para a volta da energia elétrica para os clientes ainda à espera da normalidade. A empresa garante que tem feito investimentos para melhorar a infraestrutura e evitar quedas frequentes do fornecimento a cada temporal:
"É importante ressaltar que a CEEE Grupo Equatorial não tem medido esforços para realizar melhorias em sua rede de distribuição. Desde a posse da concessão gaúcha, em julho de 2021, aproximadamente R$ 100 milhões já foram aplicados na rede elétrica no ano passado e outros R$ 432 milhões estão previstos para 2022, em projetos de novas subestações, expansão e melhoria de rede, manutenção e combate às perdas de energia. Além disso, os recursos também serão destinados à implementação de novos canais de atendimento e ajustes dos já existentes."
Defensoria Pública fará reunião
Nesta quinta-feira (10), às 14h, a Defensoria fará reunião com advogados da CEEE Equatorial para tratar do problema da falta de luz. O encontro terá a participação do defensor público e dirigente do Núcleo de Defesa do Consumidor, Rafael Magagnin.
A Defensoria ressalta que, caso a interrupção de energia tenha sido causada por temporais, a distribuidora tem 24 horas (em zona urbana) e 48 horas (em zona rural), para restabelecer o serviço a partir da constatação da situação ou da comunicação do consumidor. Reclamações podem ser enviadas para o e-mail nudecontu@defensoria.rs.def.br.
Dmae faz reuniões com a CEEE e cita calor e consumo excessivos
O diretor-geral do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), Alexandre Garcia, explicou que, sem energia elétrica, a água não chega até as casas da população, em referência ao problema de falta de luz que ocorre desde domingo em diversas regiões do Estado devido ao temporal.
Conforme salientou, quando a energia elétrica é restabelecida, começa um momento difícil para a distribuição de água porque os reservatórios já usaram a reserva armazenada. E os canos ficam cheios de ar, que precisa ser expulso com o uso de ventosas.
— O Dmae não pode ficar 14 horas sem energia elétrica em uma estação de bombeamento como a do Menino Deus, que trata, em média, 2,5 mil litros de água por segundo — alega.
Conforme estima, foram mais de 120 milhões de litros de água que deixaram de serem tratados no período sem luz na estação do Menino Deus, que leva água para regiões distantes, como Zona Sul, Morro da Cruz e Jardim Botânico.
O dirigente esclarece que, neste momento, nenhuma das estações está parada por falta de energia elétrica e que o sistema está funcionando a pleno. Também disse que o não atendimento prioritário da CEEE ao Dmae se reflete no desabastecimento de água na cidade. Questionado sobre as responsabilidade do Dmae no problema da falta de água, Garcia enumerou alguns pontos:
— Tivemos um calor excessivo em janeiro como nunca vi antes em Porto Alegre. O consumo de água no Morro da Cruz, por exemplo, dobrou na ocasião. Também ocorreu o problema da questão hídrica, em função da estiagem, o que acarretou na dificuldade para o tratamento da água. O temporal de domingo passado deixou a estação do Menino Deus muito tempo sem água. E, por fim, o rompimento da adutora na Avenida Pernambuco. Foram mais de seis horas para tirar o caminhão de cima (que havia afundado o piso sobre a adutora) e mais três horas para acessar o ponto da tubulação. Os funcionários trabalharam das 22h até as 10h do dia seguinte.
Garcia ressaltou que a estação São João se recuperou mais rapidamente do que a do Menino Deus porque a área territorial é menor, não precisando vencer alturas como o Morro da Cruz, "onde há cinco bombeamentos em linha para a água chegar até as partes mais altas".
— As regiões mais prejudicadas foram a Chácara das Pedras, Três Figueiras e Mario Quintana, que sofrem mais por causa do ar nos canos — relata.
Na terça-feira (8), houve uma reunião entre representantes dos dois órgãos, para discutirem a resolução do desabastecimento geral da população. O dirigente avaliou o encontro como positivo.