As empresas de ônibus de Porto Alegre e os empregados do setor rodoviário chegaram a um acordo e assinaram a convenção coletiva de trabalho prevendo um reajuste salarial de 10% para a categoria, o que significa a reposição da inflação do último ano pelo INPC.
Caso o índice feche acima de 10% até 31 de janeiro, a diferença será acrescida aos rodoviários pela classe patronal. O acordo, firmado entre o Sindicato das Empresas de Ônibus de Porto Alegre (Seopa) e o Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Porto Alegre (Stetpoa), também subiu o valor do vale-alimentação para R$ 30 por dia trabalhado e os funcionários concordaram em pagar R$ 79,50 de coparticipação pelo plano de saúde familiar.
O dissídio vale para todos os empregados das empresas de ônibus da Capital - motoristas, cobradores, mecânicos e administrativos, entre outros -, tanto dos consórcios privados quanto da Carris. Após o acordo, as entidades que representam as empresas de transporte coletivo de Porto Alegre remeteram à EPTC documento requerendo reajuste da tarifa.
“A prefeitura informa que recebeu ofício do Seopa com a solicitação de reajuste da tarifa. O requerimento está em análise para avaliação de quanto impactará no preço da passagem para os usuários”, diz uma breve nota divulgada pelo município.
Com o setor do transporte em dificuldade financeira e amargando queda de passageiros, os rodoviários estavam há dois anos sem receber qualquer reajuste. O último havia sido concedido no início de 2019, antes da pandemia. No auge da crise causada pela covid-19, a classe aceitou redução salarial de 25%, em parte do período sem reposição do governo federal, o que significou corte real na remuneração, em troca da manutenção dos empregos.
— Com muita conversa e reunião, conseguimos transmitir aos empresários que qualquer índice inferior ao INPC nos levaria a uma possibilidade muito grande de greve significativa. Os trabalhadores estavam cansados. Iríamos começar com paralisações, seria um caos em Porto Alegre. A patronal conseguiu entender que estávamos todo esse tempo sem ganhos — comenta Sandro Abbade, presidente do Stetpoa.
As cláusulas do dissídio devem entrar em vigor no dia 1º de fevereiro de 2022, data-base dos rodoviários, mas a confirmação do reajuste salarial ainda depende de a EPTC fazer o cálculo da futura tarifa de ônibus. A composição do preço da passagem, anualmente, costuma acrescentar ao bilhete pago pelo usuário um valor capaz de cobrir os gastos adicionais com empregados e insumos para o funcionamento do sistema. A Associação dos Transportadores de Passageiros de Porto Alegre (ATP), que congrega as mesmas empresas do Seopa, enviou à EPTC no dia 5 de janeiro a planilha de gastos para o cálculo, incluindo desde o aumento da folha salarial - principal custo do sistema - até itens como diesel e demais insumos. Baseado na análise desses números, conjugados com a demanda de passageiros e quilometragens a serem percorridas, é que a EPTC define um novo valor do bilhete - chamada tarifa técnica - e remete para apreciação do Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu).
Caso seja aprovada pelo Comtu, a nova tarifa seguirá para sanção do prefeito Sebastião Melo. Em tese, depois de vencidas essas etapas em janeiro, os rodoviários passarão a receber seus salários e vale-refeição corrigidos a partir de 1º de fevereiro de 2022.
— Não tinha como a categoria ficar sem aumento novamente. Já havia dado sua cota de sacrifício por dois anos. A situação estava no limite. Realmente, estamos diante de um problema. As empresas firmaram a convenção acreditando que terão respaldo com o cálculo de uma nova tarifa, conforme prevê o contrato. Legalmente, o aumento do custo do sistema tem de ser dado em nova tarifa — afirma Alceu Machado, advogado do Seopa.
A preocupação de Machado, e de outros envolvidos no processo, é sobre a reação do município. O prefeito Sebastião Melo tem adotado postura crítica ao sistema rodoviário e seus problemas cotidianos. Em 2021, pela primeira vez na história da cidade, a prefeitura de Porto Alegre decidiu não autorizar a cobrança da tarifa técnica de R$ 5,20 dos usuários. Melo determinou que a passagem ficasse em R$ 4,80. A diferença de R$ 0,40 é paga por repasses da prefeitura às empresas. A ATP reclama que o município deve, atualmente, cerca de R$ 10 milhões para cobrir a discrepância nos valores.
A expectativa, agora, é se Melo irá autorizar a cobrança da nova tarifa técnica, que abarca todos os custos do sistema, ou se irá segurar o valor em patamar mais baixo, mantendo a opção de repassar recursos públicos às empresas para compensar o desconto dado ao usuário. Melo tem criticado a qualidade do sistema de transporte coletivo e afirmado publicamente que deseja renegociar - e reescrever - os contratos com as empresas, que operam em Porto Alegre agrupadas em três consórcios privados.
— Os trabalhadores aprovaram em assembleia essa proposta de ter a reposição da inflação, eu assinei o acordo coletivo com as empresas, a nossa parte está bem amarrada. Se lá na frente o prefeito não quiser dar a tarifa, não é problema nosso. Nós vamos exigir que seja cumprido. Cabe à patronal nos pagar e cobrar do prefeito a forma de pagar — diz Abbade.
Embora a ATP já tenha entregue à EPTC os custos para o cálculo, a associação evitou comentar o valor que almeja para a nova tarifa técnica.
— Precisa de toda uma verificação da EPTC. Seria inoportuno falar em valores — diz Antonio Augusto Lovatto, engenheiro de transporte da ATP.