Uma cena tem chamado a atenção de motoristas e pedestres no cruzamento das avenidas Ipiranga e Praia de Belas, em Porto Alegre: vestindo suspensório e camisa vermelha, um homem arremessa para o alto um imenso cubo de aço inox. O objeto tem hastes de um metro, e nos giros de malabares dá impressão de ser ainda maior.
Destacada também é a história do artista que se apresenta com a figura tridimensional. Winer Enrique Garcia Vasquez, 31 anos, é venezuelano, tem formação superior em artes - licenciatura em música - e dirigiu uma orquestra no seu país. Deixou esposa e o filho em casa para viajar ao Brasil, fugindo da crise humanitária que os assola.
— O que eu ganho aqui em um dia, minha esposa compra comida para uma semana. E esse mesmo dinheiro seria um mês de salário lá — calcula.
Inicialmente, o malabarismo acontecia com pinos, o que pouco lhe diferenciava dos demais. O cubo foi idealizado e desenhado por Vasquez e um amigo, morador da Capital, que trabalha com solda. Cada encaixe é numerado e demanda complexa montagem, realizada na própria sinaleira. O trabalho leva pelo menos meia hora para ser finalizado, com parafusos e pequena chave de fenda.
Antes de chegar ao Rio Grande do Sul, entre julho e agosto deste ano, o imigrante viveu na Colômbia.
— Aqui é muito bom, as pessoas me tratam bem. Meu sonho é trazer a esposa e o meu filho pra cá. “Los extraño” — diz, em espanhol, sobre a saudade que sente da família.
No período em solo gaúcho, foram separados R$ 700 para compra da passagem até Boa Vista, capital de Roraima. O Estado é fronteiriço com a Venezuela. O tíquete, marcado para a última semana de novembro, é apenas de ida — no Norte, ele pretende manter as apresentações e seguir com as economias.
O objetivo é retornar logo que possível a Porto Alegre, já acompanhado da mulher e do garoto, os quais não visita há nove meses. O menino completou cinco anos de idade. A esposa é formada em administração, e tem a mesma disposição de deixar tudo para um recomeço.
Enquanto não embarca, Vasquez conquista os condutores, como o advogado Jean Carlos Guimarães, 60 anos.
— É uma história de superação total. Mudei o caminho pra ver ele aqui na sinaleira, porque ouvi ele na Gaúcha — afirma, após a entrevista de Vasquez ao programa Gaúcha Hoje, nesta segunda-feira (22).
Um outro motorista que soube do caso pela Rádio Gaúcha doou R$ 50, com um pedido: saber, no futuro, se o venezuelano teve sucesso no sonho de trazer os familiares para o Brasil.
A procura pelos outros bilhetes de avião se tornou mais urgente pela alta no valor das viagens aéreas. O mesmo trecho adquirido por R$ 700, está agora R$ 1,2 mil, garante. O sonho é passarem o Natal juntos, na capital gaúcha, pois eles não planejam seguir no país caribenho.
— Eu amo a Venezuela, queria ser produtivo para meu País, mas tudo que aconteceu lá torna muito difícil. Quando trabalhei na orquestra, o salário de um mês não comprava uma calça, nem comida. O dinheiro não vale nada. Aqui posso sonhar em uma vida nova, com a minha família, meu motor, minha força de trabalho — ressalta.
Uma conta corrente foi aberta para reunir doações a fim de adquirir a passagem. O Pix é em nome de Winer Enrique Garcia Vasquez, através do seu CPF: 603.017.170.44.