O ar-condicionado desligado incomoda Pedro Henrique a tal ponto que o garoto de 4 anos machuca o próprio corpo. Autista severo, o diagnóstico do menino aponta sensibilidade extrema ao calor.
Desde o último domingo (13), quando a energia elétrica de sua casa foi desligada por um curto circuito, afetando também os vizinhos da Rua Guaíba, na Lomba do Pinheiro, ele não consegue dormir. Desesperada, a mãe procurou o Hospital Santa Ana e teve prescritas medicações para tranquilizar o filho.
– Ele se automutilou, arrancou a pele com a unha, deu soco. Tudo porque não tinha luz, e com o calor ele sofre desse jeito – relembra Josiane Nunes, 36 anos.
Na manhã desta quarta-feira (16), a equipe de uma empresa terceirizada chegou ao transformador que causou o desabastecimento na região da parada 11 do bairro. Trabalhou entre 8h30min e 10h e religou os disjuntores. Os dois funcionários são de Balneário Pinhal, no Litoral Norte, e foram recebidos com festa na rua, ocupada por ao menos uma dezena de pessoas, que protestavam pacificamente, sem interrupção do trânsito. Os eletricistas foram inclusive aplaudidos após o conserto - e a CEEE, criticada pelas 66 horas sem solução do problema.
– Em meia hora eles resolveram - disse a manicure Cinthia Keenan, 33 anos.
A energia voltou ao local às 9h30min. Cabos “nus”, como os técnicos chamam os fios desencapados, motivaram a queda do serviço.
Antes, às 6h, a autônoma havia apenas cochilado. Sem ao menos um ventilador ligado, a madrugada abafada foi de janelas abertas.
– Ainda bem que os moradores se cuidam - complementa, sobre não poder fechar as venezianas.
No quarteirão, o poste de madeira segue inclinado. Os eletricistas informaram no relatório que será enviado à CEEE que a estrutura precisa ser substituída. O temor de quem vive próximo é que volte a ventar - no final de semana, as rajadas se aproximaram dos 100 km/h.
Não há casa que não teve alimentos jogados no lixo por causa da falta de refrigeração. O técnico em enfermagem Roberto Sanches, 62 anos, é ex-diretor de uma creche, ao lado de sua residência. Ao lado da atual gestão, calculou em cem quilos a quantidade de carne estragada.
– Era o almoço das crianças - afirma.
Os vizinhos reclamam que, além do mal-estar e do desperdício, a comunidade é pobre, e a comida descartada mexe com o orçamento mensal.
Na casa de Sanches, vivem também os filhos e noras. Todos trabalham como intensivistas em hospitais da Capital. Nenhum conseguiu tomar banho após os últimos plantões.
Contraponto
Sobre os pontos ainda sem luz na Região Metropolitana, a CEEE informa que as equipes estão na rua atendendo as últimas ocorrências, e que são “pontos isolados”. Contudo, há reclamações de corte no abastecimento de energia do Rubem berta, na zona norte, ao Espírito Santo, na zona sul de Porto Alegre.
Sobre as perdas dos clientes, há regras da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). De forma geral, os pedidos de ressarcimento podem ser feitos pelo 0800 721 2333. Também é possível consultar informações no site ceee.com.br