Exatos sete anos após o incêndio, o Mercado Público precisa fechar as portas de novo. O último decreto do prefeito Nelson Marchezan prevê, entre outras medidas restritivas para Porto Alegre, a interrupção do atendimento no prédio de 150 anos a partir desta terça-feira (7). Bancas poderão atender apenas por telentrega ou pague e leve (sem entrada dos clientes).
É a primeira vez que o Mercado Público precisa fechar desde o início da pandemia de coronavírus. Bancas que vendiam itens como artigos religiosos, produtos para pets e cachaçaria não tinham expediente desde o último decreto do Poder Executivo, e restaurantes já estavam trabalhando só com entregas. Mas as de alimentos ainda não haviam sido impedidas de abrir.
Celso Rossatto, sócio-proprietário da Banca 10, soube de madrugada das novas medidas. Ainda pela manhã, deu férias para três funcionários — mas não descarta a possibilidade de demitir se a situação se agravar. Ele questiona a necessidade de o Mercado fechar as portas ‘“enquanto as grandes redes continuam abertas e vendendo de tudo”.
A presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central, Adriana Kauer, também toca nesse assunto:
— Somos um centro de abastecimento, antes de mais nada. É estranho ver supermercados abertos e o Mercado Público fechado.
Segundo Adriana, os comerciantes estão angustiados com a possibilidade de perder mercadorias, já que trabalham com produtos frescos e perecíveis. Eles reclamam do prazo curto para aderir ao decreto.
— Para nós, fechar é complicado. Mesmo que se atenda por telentrega, não há todo o volume de venda que temos com as pessoas aqui — compara Adriana.
Sócio e administrador da Casa de Carnes Santo Ângelo, Rafael Sartori Gugliotta, 27 anos, pretende doar para creches e abrigos os produtos que já sabe que não tem saída por delivery, como miúdos. Sem ter a venda no balcão, estima que deve perder 60% do faturamento. A banca deve fazer revezamento da mão de obra, com redução de carga horária e salário.
A segunda-feira (6) ainda teve movimento considerável nos corredores do Mercado. O contador Paulo Ricardo dos Santos, 35 anos, é cliente assíduo, mas agora começará a comprar em supermercado. Não é fã dessa ideia — acredita que os produtos não são tão frescos quanto ali.
— E aqui é o coração da cidade — acrescenta.
Os contatos das bancas estão nos stories das redes sociais do Mercado Público. Com relação ao pague e leve, os consumidores não podem acessar o Mercado e nem o interior das lojas. Os estabelecimentos com saídas externas, entregarão os produtos diretamente aos clientes, sem a formação de filas. Os pedidos precisam ser feitos com antecedência.
O que diz a prefeitura
O critério técnico utilizado pela prefeitura de Porto Alegre para determinar o fechamento do Mercado Público baseia-se na equiparação com centros comerciais, pela quantidade de estabelecimentos de diferentes segmentos, que atraem pessoas com diferentes necessidades.
"Desde as primeiras restrições, em março, os centros comerciais da Capital foram fechados, mas o Mercado, pela sua tradição e história, teve suas atividades mantidas. Diante da necessidade de reduzir aglomeração e volume de pessoas nas ruas, o Mercado foi enquadrado nas mesmas condições dos centros comerciais", informou, por nota.
Propostas de edital de concessão serão recebidas neste mês
A última vez que o Mercado Público fechou foi no incêndio de 2013, ocorrido, coincidentemente, no dia 6 de julho. Ficou 38 dias sem atendimento e, mesmo quando reabriu os portões de ferro, não o fez com todo seu potencial: até hoje, o segundo piso não foi liberado.
Adriana Kauer lembra que a Associação do Comércio do Mercado Público Central desistiu de trocar as instalações elétricas do prédio — a intervenção que faltava para a reabertura — porque o governo Nelson Marchezan deu seguimento à ideia de concessão.
O edital foi lançado em junho. Há duas semanas, o Ministério Público de Contas (MPC) do Estado apontou possíveis irregularidades na proposta e recomendou sua suspensão.
Segundo o titular da Secretaria Municipal de Parcerias Estratégicas (SMPE), Thiago Ribeiro, o processo segue normalmente, e o recebimento das propostas será no próximo dia 31.
Sobre as considerações do MPC, ele afirma que a pasta não acredita na possibilidade de suspensão, pois todos os pontos levantados já haviam sido respondidos pela Prefeitura ao próprio TCE em oportunidades passadas.
— De qualquer forma, seguimos totalmente à disposição do Tribunal caso sejam necessárias novas informações. Estamos muito tranquilos em relação a todo o processo que culminou no lançamento do edital de concessão.
*Colaborou André Ávila