
Para Tiago Schmitz, a decisão se deu depois de ler um artigo de um renomado consultor de recuperação de empresas sobre como elas deveriam agir na pandemia. Entre frases de impacto como “quem viver, vence. Não importa lucro”, o texto ressalta a importância de ter como ponto em comum de todas as medidas a preservação do caixa da empresa.
Foi com esse olhar que Schmitz analisou os três pontos da Charlie Brownie e tomou a dolorida decisão de fechar o Charlie Pub, no bairro Cidade Baixa, em favor das duas lojas no MontSerrat, de perfil mais voltado a confeitaria e cafeteria.
— Não foi pessoal, não foi aluguel, mas foi a perspectiva de que, mesmo com o mínimo de gastos, o Pub não voltaria ao normal antes de setembro. Foi uma pena, porque a Cidade Baixa é um patrimônio cultural, um bairro incrível, e era o nosso cartão de visita para os valores da marca, como a diversidade — conta.
Pesaram, conta o empresário, as dificuldades extras que os bares terão daqui pra frente. No caso do imóvel da Rua General Lima e Silva, seria impossível uma boa ocupação respeitando os dois metros entre as mesas — uma das diretrizes enquanto o coronavírus circular por Porto Alegre.
Dos estabelecimentos com mais de um ponto pela cidade, uma série deles já fez ou está considerando o fechamento de alguma unidade a fim de não sacrificar as demais. No caso do Sushi Seninha, a proximidade do final de contrato de aluguel foi o ensejo para a despedida do bairro Petrópolis. Por ora, centra as operações no Mercado Público, no Centro Histórico, e aguarda os desdobramentos da pandemia com a unidade no bairro Santana fechada.
Mesmo com o mínimo de gastos, o Pub não voltaria ao normal antes de setembro. Foi uma pena, porque a Cidade Baixa é um patrimônio cultural, um bairro incrível, e era o nosso cartão de visita para os valores da marca, como a diversidade
TIAGO SCHMITZ
proprietário do Charlie Brownie
— No Petrópolis, cerca de 50% da minha operação já era em delivery. O que fizemos foi transferi-la para o Mercado Público, onde eu também posso atender na área externa. Na Ramiro Barcelos, mantivemos mesmo fechado porque contei com a sensibilidade do dono do imóvel e porque acredito muito naquele ponto. Mas não sem o Hospital de Clínicas, ali ao lado, funcionando normalmente — avalia Rodrigo Seninha.
A escolha de Rodrigo poderá ser, em um futuro próximo, a de Karine Camejo, do Valkiria Café. Por ora, os três cafés da marca estão fechados. Nesse caso, há um complicador: o Farol Santander e o espaço Area 51, onde ficam duas unidades, também estão fechados para outras atividades. O terceiro ponto, onde nasceu o café, fica na Avenida Carlos Gomes.
— A intenção é manter todos, mas é improvável que a gente consiga retomar os três ao mesmo tempo. Porque os custos se multiplicam ao abrir, mas não necessariamente o faturamento. E não adianta, o nosso “core” (o negócio principal) depende da circulação de pessoas. Enquanto isso não melhorar, é melhor aguardar mais um pouco — analisa Karine.
Segundo Karine, o mais angustiante da pandemia, para os empreendedores, tem sido não saber o quanto ela irá durar, o que dificulta decisões. É compreensível: de acordo com pesquisa com membros da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes do RS (AbraselRS), 66,7% deles declaram que há risco de fechamento definitivo da empresa se não houver reabertura em 60 dias. E a presidente da AbraselRS, Maria Fernanda Tartoni, aponta um problema adicional em comum aos associados:
— Falta dinheiro barato na praça. Facilidade de tomar empréstimo bancário. Esse é um problema que 98% dos associados estão sofrendo — conta.
Entregando o ponto
Para alguns, já é tarde para qualquer medida. Depois de nove anos trabalhando na Avenida Siqueira Campos na Japesca, sete deles como empregado e dois como franqueado, Cícero Foltz tentou, em janeiro, lançar uma marca própria: a Don Maki, que serviria sushis e pizzas. Atingido em cheio pela pandemia, entregará o ponto no Centro Histórico ao proprietário neste sábado.
— Por mais barato que me baixassem o aluguel, não ficaria abaixo de R$ 10 mil e eu não teria faturamento para bancar isso tão cedo. Mas tenho a experiência e o maquinário. Vou recomeçar pequeno, talvez só como tele. É o jeito — declara o empresário, resignado.