Dois importantes pronto-atendimentos da Porto Alegre vão passar por uma remodelação profunda nos próximos meses. As unidades – que ficam nos bairros Bom Jesus e Lomba do Pinheiro, zona leste da Capital – terão seu atendimento terceirizado. Quem deve assumir a gestão dos locais é uma associação paulista que apresentou a melhor proposta para o edital lançado pela prefeitura em abril.
O resultado preliminar do certame foi divulgado na sexta-feira (14). Outros participantes podem recorrer da decisão até a próxima segunda-feira (24). Se não houver impeditivo, as partes seguem para elaboração do contrato.
— Temos os prazos legais a serem seguidos. Porém, a prefeitura pretende que os PAs estejam funcionando sob nova gestão já em agosto — projeta o secretário municipal da Saúde, Pablo Stürmer.
Mas o que deve mudar na prática nesses locais? Conforme Pablo, haverá ampliação de leitos de observação, por exemplo. Hoje, são 13 no PA da Lomba e 12 na unidade do bairro Bom Jesus.
A promessa é que cada local tenha 22 leitos na nova gestão. Além disso, os exames oferecidos devem ser ampliados, com ecografias realizadas por aparelho móvel, além de mais coletas de sangue, raio X e eletrocardiogramas, serviços já existentes.
A associação vencedora também ficará responsável pelo atendimento social, pela gestão das farmácias dos dois PAs e pelo transporte e remoção de pacientes.
Atualmente, um paciente é recebido no PA e estabilizado. Se ele precisa de transferência, o município tem que providenciar ambulância, o que pode demorar. Por isso, deixamos esse transporte já a cargo de quem irá assumir.
PABLO STÜRMER
Secretário municipal da Saúde
— Atualmente, um paciente é recebido no PA e estabilizado. Se ele precisa de transferência, o município tem que providenciar ambulância, o que pode demorar. Por isso, deixamos esse transporte já a cargo de quem irá assumir — explica o secretário.
Todos os cerca de 200 servidores que trabalham atualmente nas unidades serão realocados pela prefeitura. A promessa é que eles reforcem o atendimento em locais como o HPS, o Hospital Presidente Vargas, o Centro de Saúde Cruzeiro do Sul e também o Samu.
Reação negativa de Conselho
O Conselho Municipal de Saúde (CMS) não aprova o projeto da prefeitura de terceirizar as unidades da Lomba do Pinheiro e do Bom Jesus. Conforme a coordenadora do CMS, Maria Letícia de Oliveira Garcia, a prefeitura não demonstrou que a terceirização irá trazer economia para o município. Esse é um fator necessário para que a troca de gestão seja permitida.
— Não há, do ponto de vista econômico, uma avaliação se é, de fato, mais barato fazer essa terceirização. O trabalho nesses modelos é feito de forma precária — diz Maria Letícia.
Conforme o secretário Pablo Stürmer, o município já “demonstrou a economicidade do projeto”. Isso porque o custo de manutenção dos dois PAs foi colocado como preço máximo dos editais. A ganhadora receberá, para gerir os espaços, R$ 3,6 milhões mensais. Porém, quem assumir a gestão terá de ampliar o atendimento, com mais leitos, exames, ambulâncias e metas de atendimento, gerando economia.
— Se nós fôssemos custear essas ampliações exigidas no edital, iríamos gastar além do orçamento atual dos dois PAs. Porém, pagando esse mesmo valor a uma gestora, vamos oferecer mais serviços e teremos ainda ampliação de leitos. Ou seja, haverá, sim, economia.
Sindicato é contrário ao processo
O diretor-geral do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa), Alberto Terres, aponta que a terceirização deveria ocorrer só em casos complementares, em que o município não tem condição de prestar o serviço.
Além disso, a alteração deveria, obrigatoriamente, passar pela aprovação do Conselho Municipal de Saúde. Dois passos que não foram seguidos pela Secretaria Municipal de Saúde, conforme o diretor do Simpa.
— Enquanto sindicato, somos contra a terceirização da atividade fim na área da saúde. Já temos exemplos próximos de como essa forma de gestão é prejudicial aos usuários e ao erário público — critica Alberto, afirmando que o Simpa vai fazer uma representação ao Ministério Público contra o projeto de terceirização.
Usuários torcem por melhorias
Nas salas de espera dos dois PAs da Zona Leste, uma reclamação é comum entre os usuários: a demora no atendimento. Por isso, quando questionados sobre uma possível mudança na gestão dos locais, os moradores se dividem. Há quem acredite que a terceirização trará mais qualidade para o serviço. Entretanto, um temor pela piora do que já está sendo apresentado atualmente também assusta.
Na manhã de segunda-feira (17), na Lomba do Pinheiro, por exemplo, a média de tempo pela qual os pacientes ouvidos pela reportagem esperavam era superior a uma hora. A confeiteira Ana Paula Dama, 43 anos, recorreu ao local em razão de fortes dores nas costas. A intenção era consultar com um ortopedista, o que não foi possível.
— Só tem clínico geral e pediatra, não fornecem mais especialidades. Vou esperar pelo clínico — disse Ana.
No mesmo local, a dona de casa Maria Luísa Scholtz, 25 anos, esperava atendimento para a tosse de Manuela, cinco anos. Maria recorda que esteve no local há menos de duas semanas, mas o atendimento não foi eficaz. Por essa razão, ela é favorável à terceirização.
— Se for para melhorar a qualidade do atendimento, eu apoio. Agora, está complicado. A gente vem aqui e não solucionam os problemas, precisamos voltar mais vezes. Além disso, são poucos médicos, é preciso uma equipe maior — avalia Maria.
Atendimento
No Pronto Atendimento da Bom Jesus, as reclamações são mais incisivas. Com a sala de espera bastante cheia, algumas pessoas preferiam esperar do lado de fora. Caso das primas Fabíola Linhares, 23 anos, e Tiele Linhares, 26 anos. As duas concordam ao criticar o tempo por atendimento e a qualidade do serviço prestado. Entretanto, só uma acredita que a terceirização pode ajudar.
— Pode melhorar se os terceirizados forem pessoas que queiram trabalhar de verdade. Eu me sinto muito mal atendida aqui, alguns atendentes ficam mais no celular do que trabalhando — critica Tiele.
— Eu acho que vai é piorar ainda mais do que está agora — avalia Fabíola.
Para a dona de casa Maria Terezinha Machado, 64 anos, nas vezes em que o atendimento ao filho, Eleoeno Machado, 43 anos, foi necessário, o serviço prestado foi bom.
— A demora a gente já está acostumado. Mas o atendimento sempre foi de qualidade — cita ela.