A mobilização de uma moradora tem mudado hábitos em uma região que sofre com constantes alagamentos no bairro Coronel Aparício Borges, na zona leste de Porto Alegre. Maria Jussara Ortiz, 55 anos, espalhou cartazes na frente de casa, na Rua da Represa, alertando para os riscos de se jogar lixo em uma área cortada pelo Arroio Moinho.
As faixas foram confeccionadas com material descartado: latas de tinta, placas, lonas e o que mais ela encontra pelo caminho. E tem funcionado, segundo a dona de casa “faz tudo”, como se define ao contar que trabalha com bicos que vão de limpeza a construção civil.
— É gratificante. Um mercado aqui do lado já se uniu com a gente e doou sacos de ração pra colocar o lixo. As pessoas elogiam e me sinto bem. Esse é meu pagamento — conta.
A realidade de quem vive na região, próximo ao Campo da Tuca, é de encarar vias sem asfalto, onde não há calçada para os pedestres — que disputam o espaço com veículos e buracos. Em alguns pontos, só transita um carro por vez, em cada sentido, nas ruas estreitas. A cor dos automóveis é uniforme: amarelos de poeira.
Em uma das cheias do Arroio Moinho, Carine Gonçalves, 35 anos, morreu após ser arrastada pelas águas, em junho de 2017. O corpo foi encontrado seis dias depois, próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol, na orla do Guaíba. O arroio fica em frente à casa de Maria Jussara.
— A gente precisa do arroio, por isso mesmo não dá pra encher de coisa — orienta a moradora, que idealizou as faixas após a morte da vizinha.
O trabalho ganhou adeptos no bairro.
— O exemplo dela precisa ser seguido. Tem pessoas que ficam com vergonha de jogar as coisas no chão por causa dos cartazes — conta a microempresária Cláudia Fontela, 49 anos, que mora na mesma rua e que desistiu de um salão de beleza devido aos constantes alagamentos do prédio.
Satisfação em ajudar
Dentre as faixas, uma afirma que “lixo não cai do céu”. Maria Jussara explica:
— Na hora de assumir, ninguém diz que jogou o lixo na rua. Aí eu coloquei essa, para mostrar que do céu ele não cai — diz.
A moradora tem um pedido: que o trabalho sirva de inspiração. E, dentre elogios, há os que questionem se a prefeitura da Capital patrocina o esforço.
— Ganho satisfação, alegria enorme e elogios, que aceleram minha vontade de continuar. E pergunto de volta: quer me ajudar? Assim desarmo a pessoa — conta, com um sorriso repleto de satisfação.
Feliz, ela afirma que, depois que começou a recolher coisas na rua, “viciou”. Quem trabalha com reciclagem passa cedo para recolher o que fica guardado no pátio de sua casa.
— Hoje caminho com sacolas na bolsa e vou catando tudo. Quero um lugar melhor pra viver — finaliza.