A localização da célebre estátua do Laçador, em Porto Alegre, voltou a despertar polêmica nos últimos dias entre defensores da permanência no posto atual e militantes da transferência para um cenário que lhe dê mais destaque. As duas correntes têm um elo comum: avaliam que o atual entorno não oferece toda a solenidade que o monumento merece, mas divergem sobre a melhor maneira de valorizar a figura emblemática do gaúcho. Parte entende que só uma mudança de endereço resgataria o brio regionalista, enquanto outro grupo prefere que a estátua receba melhorias mas siga aquerenciada onde está. As duas opções têm prós e contras.
Não é de hoje que o endereço do Laçador desperta entrevero. Em 2007, quando precisou ser removido para a construção do Viaduto Leonel Brizola, já houve discussões sobre qual seria o melhor destino para a obra inspirada na imagem do tradicionalista Paixão Côrtes, falecido no ano passado. O lugar escolhido foi o chamado Sítio do Laçador, próximo do ponto anterior, ao lado do aeroporto Salgado Filho e no alto de uma coxilha. Com estacionamento, bancos e tratamento paisagístico, parecia ser a morada final do símbolo regionalista. Um movimento informal pretende que não seja.
Tema de colunas assinadas por Tulio Milman e da seção Almanaque Gaúcho, a possível transferência do Laçador repartiu opiniões de moradores e especialistas. O principal argumento de quem deseja que o gaúcho de bronze se bandeie para outro lugar após ser removida para uma reforma, no segundo semestre, é que a localização atual tirou visibilidade do monumento e não foi "adotada" pela população ou por turistas. Embora exista infraestrutura para acolher visitantes, é raro ver algum vivente por ali.
— Hoje, quem visita o Laçador? Não tem uma água à venda por ali, uma lojinha, nada, porque não tem fluxo de pessoas. Não descarto que possa ficar onde está, mas precisaria de uma condição melhor. O importante é debater esse assunto — afirma o filho de Paixão Côrtes, Carlos Paixão Côrtes.
Neta do autor da obra, Antônio Caringi, a relações públicas Manuela Caringi Turnes defende a mudança para a Redenção, o parque Harmonia ou a orla — alguns dos lugares mais citados pela ala pró-transferência.
— Hoje, ninguém vê o Laçador. Acabou ficando um símbolo um pouco obsoleto — sustenta Manuela.
A prefeitura dá sinais de que apoia a busca por uma nova morada. Em nota, informa que "há um certo consenso de que o local atual não é o mais adequado". O prefeito Nelson Marchezan pretende que a homenagem ao gaúcho fique em local que possa compor melhor a paisagem turística da Capital. Mas, para o arquiteto e urbanista Marcelo Arioli Heck, da diretoria do Instituto dos Arquitetos do Brasil no Estado (IAB/RS), uma eventual migração esvaziaria o significado da estátua:
— O gaúcho representado ali tem uma conotação de sentinela. Ele olha o horizonte, cuida de quem entra ou sai da cidade. Por isso, é importante que ele fique naquele lugar, uma das principais entradas de Porto Alegre para quem chega de carro, via aérea ou até de trensurb.
O advogado Marco Tulio de Rose conta que chega a fazer uma espécie de oração campeira toda vez que passa pela escultura de Caringi ao começar uma viagem ou voltar para casa.
— O Laçador é uma espécie de deus da cidade. Quando estou indo viajar, ao passar por ali peço "Laçador, me ajuda a voltar". Além disso, quando chega alguém do Interior e já depara com a estátua de um gaúcho, já se sente acolhido pela Capital. Se mudarem de lugar, continuará sendo uma estátua bonita, mas apenas mais uma entre outras — argumenta de Rose.
Veja projeções de como ficaria
Sítio do Laçador (atual)
Prós: o local fica na entrada da cidade, próximo ao aeroporto, servindo como cartão de apresentação. O ponto conta com estacionamento para carros e ônibus a fim de facilitar a visitação.
Contras: a principal queixa é de que não é um local com frequência de público, e a estátua não tem tanto destaque quanto poderia. Também falta sombra.
Parque da Redenção
Prós: é um dos locais mais frequentados pela população e estaria ao lado de outras obras imponentes, como o Monumento ao Expedicionário (assinado pelo mesmo escultor do Laçador, Antônio Caringi).
Contras: obras de arte localizadas no parque costumam sofrer com vandalismo. Seria necessário um esquema especial de segurança para evitar depredações. Por estar junto a outras obras de referência da Capital, poderia perder sua importância relativa.
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Parque Maurício Sirotsky Sobrinho (Harmonia)
Prós: é um parque associado ao regionalismo, onde já ocorre anualmente o Acampamento Farroupilha.
Contras: não é tão frequentado quanto o Parque da Redenção fora dos festejos tradicionalistas, e também poderia sujeitar a obra a vandalismo.
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Orla do Guaíba
Prós: a nova orla, reurbanizada, se tornou um dos pontos prediletos da população na Capital. O Laçador ainda faria parceria com o não menos célebre pôr do sol do Guaíba para fotos e vídeos. Na era das redes sociais, sua imagem seria bem mais difundida.
Contras: superlotada aos finais de semana, a orla já oferece pouco espaço. Além disso, pode acabar concentrando muitas atrações em um mesmo local. Passaria a dividir atenção com outras atrações da cidade, como a Usina do Gasômetro.
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Esquina Democrática
Prós: é um dos pontos mais movimentados e tradicionais de Porto Alegre e de fácil acesso por transporte público de qualquer lugar da cidade.
Contras: a estátua poderia perder imponência em meio aos prédios altos que existem ao redor, e os visitantes não teriam muito espaço no entorno, onde há fluxo constante de pessoas.
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Rótula das Cuias
Prós: fica na área da orla, de grande frequência de público, e próximo ao Parque Maurício Sirotsky Sobrinho — uma das referências para o movimento regionalista na Capital.
Contras: exigiria a remoção de outra obra de arte, o que também aumentaria custos.
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Ficha técnica
Nome: O Laçador
Altura: 4,4 metros
Peso: 3,8 toneladas
Material: bronze
Modelo: tradicionalista João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes (1927-2018), de Santana do Livramento
Autor: Antônio Caringi (1905-1981), de Pelotas
História: inaugurada em 20 de setembro de 1958, a estátua O Laçador marcou as comemorações do 123º aniversário da Revolução Farroupilha (1835-1845). Durante a cerimônia de inauguração, o então prefeito Leonel Brizola (1922-2004) discursou destacando a grandeza do Rio Grande do Sul. A manifestação foi tão bem recebida que acabou alavancando sua campanha para governador do Estado pelo PTB. Considerada patrimônio da cidade por lei complementar em 1992, foi tombada em 2001. Em 11 de março de 2007, o monumento foi transferido para o atual Sítio do Laçador, a 600 metros de local original.