O acirramento de discussões sobre diversidade sexual em redes sociais, conversas de bar ou nas reuniões de família, em particular durante o período eleitoral, deram a tônica dos discursos e apresentações artísticas durante a Parada Livre, que ocorreu neste domingo (18) no Parque da Redenção, em Porto Alegre.
— Tomamos um baque neste ano com o crescimento de ofensas e de intolerância até de pessoas que não costumavam demonstrar preconceito. A impressão é que a onda conservadora fez muita gente revelar seu preconceito — disse a drag queen Gabi Santorini, do grupo Vikkings.
No palco, o principal alvo de críticas era o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL).
— Muitas pessoas têm apanhado nas ruas apenas por serem LGBT. Mais do que nunca temos que nos unir neste e trazer o tema da diversidade de volta à civilidade — afirmou Gabriel Galli, representante do Grupo Somos, um dos 18 coletivos envolvidos na organização do evento.
O próprio evento foi uma demonstração de resistência. A parada chegou a ser ameaçada por questões financeiras - além de não contar mais com verbas da prefeitura municipal, amargou o fim da parceria com uma produtora que tentava buscar patrocínios. Mas, por meio de uma vaquinha online e da colaboração de empresas parceiras, conseguiu levantar R$ 20 mil, apenas metade do orçamento inicial mas suficiente para erguer um espaço para debate e apresentações artistas.
Segundo a organização, foram 80 mil participantes, mesmo público que participou no ano passado. A Brigada Militar não comunicou sua estimativa. A Defensoria Pública estacionou uma unidade itinerante para orientar o público LGBT sobre seus direitos, principalmente como funcionam os trâmites para mudança de nome e gênero na certidão de nascimento.
— Há uma discurso contra a liberdade dos LGBTs que foi legitimado com as eleições. Mas estamos aqui para mostrar que este público também conta com a proteção do Estado —afirmou Isabel Rodrigues Wexel, coordenadora da Defensoria Pública Itinerante.
Piada no trabalho e cintada no churrasco de família
Casal que se declara "aberto e bissexual", Laura Azevedo, 20 anos, e Rodrigo Strapazzon, 24, afirmam ter percebido um acirramento das discussões nos almoços em família e no dia a dia do trabalho nos últimos anos em razão de sua opção. Strapazzon já nem liga mais para as piadas no serviço: toda segunda-feira, ouve que o comportamento gay está com os dias contados.
Laura, nos churrascos de final de semana, volta e meia digere mal o assunto. Certa vez, um parente tirou a cinta e bateu na mesa pra demonstrar como se tratam os gays.
— Não dá para responder com a mesma agressividade. O importante é ter paciência para explicar minha sexualidade — disse Rodrigo ontem, na Redenção, durante a Parada Livre.
Nem todas as famílias tratam no mesmo tom o assunto com parentes gays. Um grupo de mães chamava a atenção do público ao erguer cartazes com os dizeres "Mães Pela Diversidade" — nome de um movimento nacional de mulheres com filhos LGBTs. A técnica em biblioteconomia Caroline Araújo, 30, tem um filho de 12 anos transgênero — explica que a criança nasceu biologicamente menina, mas se identifica com o gênero masculino — e agora luta para que ele consiga mudar de nome e gênero na certidão de nascimento.
— Este movimento mostra que muitas famílias aceitam seus filhos LGBT e saem do armário com eles — explica ela.