O furto de cabos de energia elétrica triplicou neste ano em Porto Alegre. Dados da CEEE mostram que, de janeiro a outubro, a concessionária realizou 2.188 atendimentos devido ao crime na Capital contra 610 no mesmo período de 2017.
A média é de sete furtos de cabos a cada dia na cidade — um a cada três horas e 25 minutos. Ao comparar os dados com 2014, quando os registros apontavam 52 furtos ao longo de todo o ano, o crescimento é de 41 vezes. A companhia garante que não mudou a forma de fazer a contagem nos últimos anos.
O alvo dos bandidos é o cobre da fiação, vendido em ferros-velhos por valores que variam de R$ 14 a R$ 19 por quilo.
Os furtos causam não só prejuízo para a companhia de energia elétrica, mas também para a população. Os ataques deixam parte dos bairros sem luz até que a CEEE consiga trocar a fiação. Situações como essa eram mais comuns em ruas pacatas de bairros mais afastados do Centro, mas agora também são registradas em áreas de grande movimentação.
Em 12 de novembro, uma segunda-feira, o trânsito foi totalmente bloqueado no cruzamento da Avenida Ipiranga com a Avenida da Azenha por causa de furto de cabos. A ação de um só bandido, flagrado em câmeras de segurança da prefeitura, desencadeou um incêndio que tomou conta dos fios e chegou a atingir a sinaleira, tumultuando o tráfego e deixando comerciantes sem luz.
Na última quarta-feira (21), crime semelhante foi registrado na Rua José de Alencar, no bairro Menino Deus. Por meio de uma árvore na esquina da via com a Rua Oscar Bittencourt, bandidos alcançaram um poste e levaram aproximadamente 30 metros de fios. Na manhã de segunda-feira (26), a cortina de banheiro em plástico usada para que os ladrões não tomassem choques ainda estava pendurada nos galhos. Em geral, a principal ferramenta usada pelos criminosos é um alicate. Muitas vezes, a luz cai em todo o bairro em função da ativação de um sistema de segurança contra incêndios.
Os furtos revoltam comerciantes. O ataque deixou a distribuição de energia em meia-fase durante toda a manhã daquele dia e, por volta das 13h, a CEEE precisou desligar a energia do bairro para fazer a troca dos fios. A quarta era de calor, com máxima superando 32°C, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Sem luz, houve restaurante servindo bufê frio e cliente saindo suado.
A chinesa Célia Lee, que mantém o restaurante Muralha da China há 22 anos na José de Alencar, pediu calma à clientela.
— Tive de trabalhar no escuro e servir o bufê frio. Abri igual, mas os fregueses reclamaram: "Ah, não tem luz, não tem ar condicionado". Vou fazer o quê? Problema não é meu, né — lamenta.
O mesmo furto gerou transtornos na academia Sal da Terra, vizinha do restaurante. O sócio-diretor, Augusto Geremia, pediu para que os alunos fossem embora temendo que alguém passasse mal fazendo força no calorão.
— Para atividade física, o ideal é a temperatura estar entre 22°C e 24°C. Por isso, temos o ar-condicionado. Então imagina como fica em salas com muito sol, sem luz. Fica impossível, insalubre — diz Geremia.
Em casos como dos furtos na Rua José de Alencar e no cruzamento da Ipiranga com a Azenha, a Polícia Civil afirma que, em geral, quem age são criminosos sem muita experiência ou usuários de drogas em busca de dinheiro fácil. Há outros casos de grandes quantidades de cabos levadas que as investigações apontam para grupos altamente organizados. Na Ponte do Guaíba, já são 10 mil metros de fiação furtados. A situação é semelhante na Presidente Castello Branco, a principal via de chegada a Porto Alegre.
Furtos de fios em Porto Alegre
2013 — 219
2014— 52
2015 — 72
2016 — 123
2017 — 954
Legislação não deixa ladrões de cabos presos, diz polícia
O delegado substituto da Delegacia de Repressão aos Crimes contra o Patrimônio das Concessionárias e os Serviços Delegados(DRCP), Alexandre Fleck, afirma que há uma grande dificuldade em manter pessoas presas pelo crime de furto, assim como responsabilizar os compradores.
— Na medida que tu não consegues identificar que o material é subtraído, já era. Se a gente ainda conseguisse uma prova de que eles (compradores) têm essa ciência, faríamos um trabalho gigantesco e, talvez, seriam enquadrados pelo crime de receptação, apenas. É meio frustrante. É quase impossível conseguir responsabilizar esse pessoal — comenta o delegado.
É meio frustrante. É quase impossível conseguir responsabilizar esse pessoal.
ALEXANDRE FLECK
Delegado da Polícia Civil
Investigações da polícia mostram que o cobre é vendido para pequenos recicladores, que queimam o metal e o fundem em grandes quantidades. Depois, revendem para grandes empresas de fundição industrial da Região Metropolitana.
Ainda assim, a polícia garante que age contra as pessoas que compram o cobre roubado das ruas. Segundo a Polícia Civil, 88 pessoas foram presas em 2018 pela delegacia especializada em combate ao furto de fios. Em todo o ano passado, foram 145 pessoas presas pela mesma unidade.
CEEE responde furtos trocando cobre por alumínio
A cada furto que ocorre na Capital, a CEEE troca a fiação de cobre do trecho por cabos de alumínio. A estratégia foi adotada pela companhia para reduzir o número de crimes, já que o alumínio tem valor de venda muito baixo quando comparado ao cobre.
O gerente da CEEE na Região Metropolitana, Jeferson Gonçalves, afirma que a companhia realiza a troca também quando não há furtos. A ideia é conseguir trocar toda a rede de cobre por alumínio até o final de 2024.
— O cabo de alumínio é de um valor muito baixo, irrisório se comparado ao cobre. A fiação de cobre, lá na década de 60, foi muito utilizada e agora a fiação de alumínio se tornou uma tecnologia viável, principalmente com o uso de cabos isolados — explica.
De acordo com o gerente da CEEE, os novos cabos também são mais seguros para evitar incêndios, já que são envoltos em uma liga de plástico com borracha. A troca já começou nas redes de bairros e, para isso, a companhia investiu cerca de R$ 34 milhões.
A companhia diz que não identifica um motivo específico para o aumento dos furtos, assim como a Polícia Civil.
Furtos de fios de telefones reduziram em Porto Alegre
A Oi, companhia telefônica responsável pela maior parte da fiação de Porto Alegre, registrou 245 furtos de cabos na Capital de janeiro até outubro. No mesmo período do ano passado, foram 375. A queda é de 34%.
Para a Polícia Civil, um dos motivos para a queda dos furtos é uma particularidade dos fios de cobre usados pela telefonia. De acordo com o delegado Alexandre Fleck, quando derretidos, os cabos ficam "escabelados", com pequenas pontas para cima. Por causa disso, são facilmente identificados pelos ferros-velhos, que não os compram sabendo que são furtados.
A Oi informou, em nota, que adota medidas preventivas para dificultar o furto de seus equipamentos telefônicos e tem investido na criação de novas equipes de manutenção, que auxiliam no monitoramento e reparo dos danos à sua rede causados por furto ou vandalismo. A companhia disse, também, que "colabora com os órgãos de segurança pública, fornecendo informações que possam auxiliar as investigações". A empresa mantém em funcionamento um canal para denúncias de furto de cabos de telefonia: 0800 282 5531.