Os funcionários da Multiágil que prestam serviços à prefeitura de Canoas estão prestes a completar três meses sem receber salário, vale-transporte e vale-alimentação. A administração municipal aguarda confirmação do Ministério Público do Trabalho (MPT) para pagar os valores atrasados diretamente aos trabalhadores, sem intermédio da empresa, que não está fazendo os repasses. Nesta quinta-feira (28), a prefeitura anunciou que irá rescindir o contrato com a terceirizada até sábado (30).
Ao todo, 59 pessoas não são pagas desde abril — 45 delas trabalham no teleagendamento de consultas do Sistema Único de Saúde (SUS) e 11 na Central de Atendimento ao Cidadão (CAC).
Conforme o diretor-administrativo da Secretaria de Saúde de Canoas, Cleber Britto, os funcionários terceirizados não recebem os vencimentos porque a Multiágil está com os bens bloqueados pela Justiça. GaúchaZH não conseguiu contato com a Multiágil.
Britto afirmou que está discutindo com a Procuradoria-Geral do Município (PGM) e o MPT a possibilidade de pagar os salários e benefícios atrasados de abril e maio. O pedido para quitar o valor de junho deve ser protocolado nos próximos dias. A prefeitura afirma que aguarda apenas uma posição favorável do MPT para encaminhar os pagamentos atrasados — por enquanto, não há data definida.
Quem não pôde ir ao trabalho por estar sem condições, entretanto, ficará sem receber pelos dias ausentes. A orientação é que eles peçam providências diretamente para a Multiágil.
— Queremos pagar os trabalhadores que tiveram os salários atrasados, mas não podemos fazer nada com aqueles que não puderam ir trabalhar. Eles precisam reivindicar isso diretamente com os empregadores.
Agora, deve ser adotada uma “medida emergencial” para suprir a falta dos teleatendentes. Colaboradores de outros setores serão recrutados para executar o serviço até uma nova empresa ser contratada pela prefeitura.
Atrasos já eram frequentes
Essa não é a primeira vez em que empregados da Multiágil ficam sem receber o salário, hoje em R$ 790. O Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados do RS denunciou a mesma situação à prefeitura em março de 2017. Em 2016 e 2015, funcionários que prestavam serviços à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) também reclamaram da falta de pagamentos.
— Nosso salário já vinha atrasando desde 2016. Atrasava um pouco, a empresa pagava em partes, e assim se repetia. Já vai fechar três meses que estamos sem nada. Estou com o saldo negativo no banco. Por sorte, posso contar com a ajuda do meu marido para pagar as contas e o rancho, mas e quem não tem nada? — questiona Débora Geisa Allende, 37 anos, que trabalha como teleatendente.
Na casa de outra funcionária, de 52 anos, que prefere não se identificar, comer carne virou luxo. Ela e o filho de 17 anos colocam somente uma vez por semana salsichas na mesa. As contas estão atrasadas há dois meses. Eles correm o risco de ser despejados do apartamento onde vivem.
— A gente tira um pouco daqui, um pouco dali, e vai levando. Ficar sem comida não é nada, o problema é se meu filho ficar sem casa para morar — diz ela.
O salário da Multiágil é a única fonte de renda da funcionária. Ela tem procurado trabalhos extras como faxineira para amenizar a situação, mas os bicos não dão conta — sua renda mensal caiu para R$ 400. A situação, entretanto, poderia ser pior: ela contou com a solidariedade dos colegas de trabalho, que organizaram uma vaquinha para arrecadar alimentos. A dispensa, entretanto, tem comida suficiente para apenas mais uma semana.
Prefeitura sabia dos atrasos
O contrato da prefeitura de Canoas com a Multiágil foi assinado em 6 de abril de 2016, com duração de um ano. Mesmo consciente dos atrasos nos pagamentos, a prefeitura renovou o acordo em 8 de junho de 2017 por 12 meses e em 15 de maio de 2018, por mais 90 dias.
— Sabíamos que ela tinha um histórico negativo. Notificávamos a empresa e ela regularizava os pagamentos. O problema é que não é tão simples trocar uma empresa por outra. É preciso tempo e muito treinamento — diz Britto.
Uma licitação havia sido publicada para contratar uma “empresa para prestação de serviços de central de atendimento”, com recebimento de propostas para até 18 de junho. Por decisão da prefeitura, o edital foi suspenso em 14 de junho para ser revisto, mas deve voltar a receber interessados já na semana que vem, confirma o diretor-administrativo da pasta.
Agora, os funcionários estão na expectativa para serem recontratados pela empresa que vencer a licitação nos próximos dias. Para outra teleatendente, que também não quis ter o nome revelado, resta apenas a vontade de voltar a trabalhar.
— Espero que quando a nova empresa assumir, ela continue com a gente. Isso é comum entre as empresas de terceirizados. Já estamos sem receber, e, agora, não sabemos nem se ficaremos desempregadas.