Mesmo que uma reunião entre o prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan (PSDB), e representantes das escolas de samba tenha sido pré-agendada para a tarde desta terça-feira, é quase certo que os desfiles deste ano não contarão com verba pública. Na sexta-feira, em reunião com seus secretários, o chefe do Executivo municipal disse que não há dinheiro para investir no Carnaval.
Coletivamente, por intermédio da Liga Independente das Escolas de Samba de Porto Alegre (Liespa), os dirigentes mantêm a posição de que o município deve arcar com o aporte financeiro às entidades e com a montagem da estrutura da passarela do samba.
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Individualmente, porém, alguns admitem a possibilidade de realizar apresentações não competitivas, sem alegorias e até fora do Porto Seco. O único consenso é o de que os desfiles têm que ser realizados.
Dinheiro
Houve uma reunião nesta segunda-feira entre os representantes das escolas de samba e o secretário municipal de Cultura, Luciano Alabarse. A Liespa apresentou um plano que prevê economia de cerca de R$ 700 mil na montagem da passarela, cujo custo total aproxima-se de R$ 5 milhões. No entanto, sem abrir mão dos R$ 2,1 milhões previstos como aporte para as escolas.
– Houve vários encaminhamentos. Inclusive com o fortalecimento da força-tarefa municipal, composta pelas secretarias da Fazenda, do Planejamento e da Cultura que, juntamente com as escolas, vai captar recursos junto à iniciativa privada. A orientação é não contar com dinheiro público – explicou o secretário.
O presidente da Liespa, Juarez Gutierres, por sua vez, manteve a posição de realizar o Carnaval com verba pública:
– Vamos apresentar ao prefeito a nossa proposta, reafirmando a importância do Carnaval para a inclusão social, a geração de empregos diretos e indiretos.
Em outro local
Uma das possibilidades apontadas por dirigentes é a realização dos desfiles fora do Porto Seco. Neste caso, as avenidas Edvaldo Pereira Paiva e Borges de Medeiros seriam alternativas.
No entanto, o comandante do Policiamento da Capital, coronel Mario Ikeda, já antecipou que, para isso, seria necessária uma discussão com a Brigada Militar, uma vez que esses locais não possuem cercamento.
Com a palavra, os presidentes das escolas
“Uma possibilidade seria um desfile à meia-boca ou apenas uma apresentação. Mas, se for assim, teria de ser em outro lugar. No Porto Seco, me parece que pior ficará. Respeito as opiniões contrárias, mas acho que teria de ser fora do Porto Seco. É mais fácil descer a Borges, com reaproveitamento de fantasias e guardando o enredo para o próximo ano. Alegorias, nem pensar. Estaríamos enganando a nós mesmos.”
Vitor Hugo Amaro, presidente da Imperatriz Dona Leopoldina
“A escola até pode fazer um desfile mesmo sem cachê, pois é importante que o desfile ocorra de qualquer modo. E tem que ser ali mesmo no Porto Seco, e não em outro lugar. Mas não acredito na suspensão total dos recursos. Acredito que alguma verba vai ter.”
Rita Bittencourt, presidente da Acadêmicos de Gravataí
“O cachê complementa a verba que necessitamos para pagarmos as despesas com o desfile. Não é tudo, mas é fundamental. Não podemos abrir mão de uma hora para outra. O trabalho já começou e o dinheiro está comprometido. No momento, vemos com bons olhos a disposição do poder público. Temos que acertar a questão de 2017 para, depois, com mais fôlego, pensarmos em uma maior autonomia, flexibilidade e independência para os próximos anos.”
Robson Dias, o Preto, presidente da Estado Maior da Restinga“
"O cachê é muito importante. E a escola só vai se for ali mesmo, no Porto Seco, mesmo sem arquibancadas. Se for em outro lugar, como na Avenida Beira-Rio, a escola não vai.”
João Carlos Martins, o Gago, presidente da Império da Zona Norte
“Não concordo em desfilar sem cachê, mesmo que tivesse condições. Pode haver uma negociação tanto em termos de equipamentos (montagem da passarela) quanto em termos de ajuda às escolas, mas o aporte financeiro pelo poder público tem que existir. Seguimos trabalhando em nosso barracão, em nossos ateliês. Minha opinião é bem clara: vamos para o Carnaval competitivo com apoio da prefeitura. Ainda que ocorra uma redução.”
Jorge Sodré, presidente da União da Vila do IAPI
“Se não houver cachê, só poderemos desfilar se for garantido o apoio da iniciativa privada. Sem isso, não tem como. Mas acredito que vá sair o desfile no Porto Seco. Mesmo que seja com uma estrutura menor. Antes de se falar nisso, tem que haver a contratação das escolas, com a assinatura do convênio. A prefeitura criou um setor de captação e há uma união de forças. Estamos acreditando que vai dar certo.”
Gustavo Giró, diretor de Carnaval da Embaixadores do Ritmo
“Sem cachê, não tem como realizarmos um desfile competitivo, da forma tradicional. Na semana passada, em reunião do departamento de Carnaval da escola, cogitamos que, sem a verba, terá de ser um desfile mais participativo, com a bateria, um grupo-show ampliado, um tripé para ilustrar o enredo e sem competição. Usaríamos aí a reedição de enredo (utilização de um tema já apresentado) e vamos guardar para o próximo ano o enredo que apresentaríamos agora. Uma possibilidade é que, se não houver estrutura, o desfile possa ser realizado em uma área mais central, talvez a Avenida Beira-Rio.”
Cleomar Rosa, presidente da Bambasda Orgia
Calendário de eventos sofrerá alterações
A crise financeira e a contenção de gastos da prefeitura irão impactar o calendário de eventos da Capital de forma geral. Após o anúncio de corte de recursos para o Carnaval, será feito um levantamento de todos os demais eventos e de quanto cada um precisa de dinheiro do cofre municipal:
– É certo que vai ser mexido (o calendário de eventos) porque a prefeitura não tem dinheiro para disponibilizar. A prioridade é o serviço público e o interesse público, como saúde, segurança e educação – afirma secretário de Desenvolvimento Econômico, Ricardo Gomes.
Independência
O secretário adjunto da Cultura, Eduardo Wolf, reitera o discurso de economia. Tudo que for necessário e possível, será cortado:
– A diminuição não é quanto ao evento A ou B, mas é uma orientação para diminuir tudo o que for possível para contribuir para o equilíbrio fiscal.
Antes de estabelecer possíveis cortes nos eventos de 2017, as secretarias precisam concluir um levantamento feito a pedido da Fazenda com as contas a pagar da gestão anterior. Só assim, ressalta Eduardo, haverá uma dimensão clara das dificuldades financeiras herdadas do governo anterior.
– A gente espera ter uma definição mais global da estrutura financeira para estas atividades para, então, estabelecer uma definição – diz Eduardo.
Ricardo Gomes ressalta que há eventos que existem independentemente da verba da prefeitura, como o Porto Verão Alegre, bancado por patrocinadores e que possui apenas apoio do município.
Segundo ele, o objetivo é buscar, cada vez mais, formas de financiar os eventos com leis de incentivo e parceiros privados, tornando-os, assim, independentes de recursos municipais.