O Superior Tribunal de Justiça autorizou a demolição dos seis casarões localizados na Rua Luciana de Abreu, no bairro Moinhos de Vento, em Porto Alegre. O conjunto de casas foi colocado abaixo nesta sexta-feira.
O STJ manteve, assim, a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que declarou que o conjunto de casas "não tem valor histórico-arquitetônico" e não teria sido construído por Theo Wiederspahn – principal argumento utilizado para a defesa dos imóveis na ação, que tramita há 14 anos na Justiça.
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Com isso, a construtora Goldsztein fica autorizada a remover as casas de nº 242, 250, 258, 262, 266 e 272. A empreendedora havia obtido a licença para a demolição do conjunto em 2002, mas, no ano seguinte, o Ministério Público Estadual (MP) ajuizou uma ação impedindo.
De acordo com a assessoria de imprensa da Goldsztein, a decisão foi dada pela Justiça na semana passada. Em 2013, grupos em defesa do patrimônio histórico em Porto Alegre realizaram protestos em frente às casas.
Luiz Antônio Custódio, responsável pela Coordenação da Memória Cultural da Secretaria Municipal de Cultura, soube da existência da decisão judicial e da demolição dos imóveis por intermédio de Zero Hora. Disse que não julgaria a atitude da construtora, levando em conta que ela agiu sob amparo legal, mas lastimou a derrubada dos casarões:
– Mas demoliu todos? Do ponto de vista do patrimônio, é lamentável a perda. Esses imóveis têm importância no conjunto do bairro, independentemente de laudos contra e a favor. Aquele é um bairro que se notabilizou por ser residencial, de edificações isoladas ou em conjunto, como é o caso.
Custódio afirma que "por alguma questão, no passado", os casarões da Luciana de Abreu não foram incluídos no inventário do patrimônio histórico de Porto Alegre. Quando a demolição foi parar na Justiça, diz, a prefeitura ficou impedida de protegê-los, porque não poderia mudar as regras durante a tramitação do processo. Ele lamenta que não se tenha chegado a um acordo para manter pelo menos parte do patrimônio que foi abaixo.
– Em certo momento, a Goldsztein propôs preservar metade e derrubar a outra metade, para construir esse edifício. Mas houve um recurso do Ministério Público, e essa hipótese foi extinta. Seguiu para instâncias superiores. Quando as partes não conseguem chegar a um acordo, todo mundo perde – afirma.
Vice-presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Vinicius Vieira lamentou o episódio. Confira a manifestação abaixo, em nota:
Pensamos ser fundamental valorizarmos a história de Porto Alegre e o seu patrimônio arquitetônico, mesmo que isso desagrade às empresas que trabalham com empreendimentos imobiliários na atualidade.
Caberia ao Município mediar interesses conflitantes a esse respeito, que colocam construtoras de um lado e comunidades de outro. Com a ausência desses mediadores, verifica-se uma lacuna, em que parte daqueles responsáveis de zelar pela preservação do patrimônio não se apresentam, o que resulta em fragilidade irreparável, cabendo as entidades do setor (como o IAB RS) posicionar-se em meio a tamanhas distorções no que diz respeito ao planejamento e crescimento das cidades, reafirmando seu papel junto à sociedade.
Os arquitetos e urbanistas, frente a essas práticas predatórias de demolição, se coloca veementemente contra tais iniciativas, acreditando que essas ações pouco debatidas devem ser substituídas pela valorização da cidade, de seu patrimônio histórico, artístico e cultural, representado com destaque por sua arquitetura, mediante processos que possam incluir de fato a sociedade civil em decisões dessa envergadura. Assim, devemos nos solidarizar e apoiar as instituições, entidades e moradores que lutaram pela defesa do casario da rua Luciana de Abreu, que se apresenta como um conjunto arquitetônico representativo para nossa cidade.
Essa casas primam por uma configuração que estimula a relação com a rua - uma rua animada -, que valoriza as pessoas através da estreita relação com o passeio público, que propicia movimento que agrega segurança, além da singular horizontalidade do conjunto que certamente dialoga em melhores condições com a escala humana e o tecido urbano dessa região da cidade de Porto Alegre.
Vinicius Vieira,Vice-presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB RS