Imigrante senegalês, Mawloud Sourang Junior, 28 anos, sustenta-se há meio ano como ambulante em Porto Alegre, vendendo fones de ouvido e carregadores de celular nas ruas. Mas a partir do próximo mês, ele dará os primeiros passos como professor. Por um projeto ainda em fase inicial, chamado Bonne Chance, Junior vai ensinar sua língua e um pouco da cultura do Senegal a grupos de brasileiros – além de melhorar sua renda.
A ideia das aulas de francês tendo imigrantes africanos como professores surgiu neste ano. Incomodada com a sensação de que os imigrantes eram tratados como invisíveis no cotidiano da cidade, a jornalista e socióloga Ana Emília Cardoso, 39 anos, pensou em formar uma pequena turma. Ela criou uma página no Facebook na semana passada para reunir interessados, mas não esperava que o Bonne Chance (que em francês quer dizer "boa sorte", "que dê tudo certo") faria tanto sucesso.
– Fizemos um questionário para interessados que, em pouquíssimas horas, tinha mais de 700 inscritos – relata.
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Com a ajuda da amiga Marjorie Hattge, que é professora de inglês, Ana Emília está se dedicando a responder os mais de mil interessados e a procurar mais imigrantes com perfil de professor nas ruas da Capital. Elas ainda pretendem dar um treinamento a esses senegaleses, auxiliadas por professores voluntários. As primeiras turmas, de diferentes níveis de domínio da língua, devem começar a ter aulas no começo de outubro no complexo Vila Flores, no bairro Floresta.
– O ensinamento da língua foi um start, mas esses imigrantes têm muita coisa para ensinar. Acho que, para eles, resgatar a sua identidade e contar para nós deve ser legal, e eu acho fantástico conhecer isso – destaca ela, torcendo para que o projeto dê origem a outros tipos de cursos e oficinas para imigrantes e refugiados.
Marjorie opina que os brasileiros sabem bastante coisa a respeito do Exterior, como dos Estados Unidos e de países da Europa, mas têm poucas informações de países africanos.
– Esses professores têm muita bagagem para passar e muitos não tiveram essa oportunidade – afirma.
Educado e um pouco tímido, o primeiro professor do projeto trabalhou com contabilidade e chegou a cursar Direito no Senegal. Junior veio há um ano e nove meses ao Brasil, para conhecer o país, conta ele, e diz que pretende continuar trabalhando como ambulante – pelo menos até conseguir se sustentar apenas com as aulas.
– Eu fiquei feliz, porque é algo que consigo compartilhar com o brasileiro. Aqui tem pouca gente que consegue falar francês – ressalta.
Embora as aulas ainda não tenham começado, Ana Emília acredita que algum resultado o projeto já traz para a cidade.
– Eu acho que alguma coisa já mudou. A pessoa que ouviu falar do projeto, quando vir um imigrante na rua, vai ver ali um potencial professor de francês, não mais alguém que está à margem da sociedade – conclui.