Você deve estar vendo muita gente jogar Pokémon Go. A febre internacional do game chegou ao Brasil, e também a mais de 500 milhões de pessoas no mundo todo. Hoje, quase um quarto dos smartphones do planeta já instalou o aplicativo, e Nintendo, Google e Niantic acumulam receitas de US$ 10 milhões de dólares por dia com o jogo.
Apesar do sucesso imenso, o Pokémon Go já está em declínio. O número de usuários ativos decresce a cada dia, segundo dados da Bloomberg. Isso mesmo apesar da sensação de que há jogadores em cada esquina, e de o jogo estar em mais de 70 países.
A febre vai passar, mas algo do jogo ficará. Pokémon Go será lembrado como a primeira experiência de meio bilhão de pessoas com a realidade aumentada.
Realidade aumentada é a integração de imagens virtuais a imagens reais. Na prática, a mágica do Pokémon Go acontece na tela do seu celular. Você deixa sua câmera ligada, aponta para algum lugar, e lá estará o Pokémon como se fosse algo real. Por trás da realidade aumentada há um potente algoritmo que analisa as imagens captadas pela câmera e adiciona a elas um objeto, em tempo real, que antes não estava lá. Mas agora está sobre sua mesa, no seu carro, ou no lago do parque.
Engana-se quem acha que realidade aumentada é apenas uma brincadeira. Basta ver o que vem por aí. No varejo, empresas como Coca-Cola e L'Oreal fazem treinamento de funcionários sem precisar colocar, fisicamente, produtos na prateleira. Aplicativos de viagem já começaram a traduzir placas de rua e avisos para sua língua materna, e em breve veremos imobiliárias mostrando apartamentos para você já com todos os seus móveis dentro.
Além disso, Pokémon Go nos mostrou o que acontece quando cruzamos a realidade aumentada com nossa geolocalização. No jogo, os pokémons não vêm até você. É você que tem de ir, fisicamente, até eles. E é isso que gera as multidões entrando em aeroportos, cemitérios, restaurantes.
O futuro da associação da realidade aumentada e da sua localização é promissor. Imagine estar num lugar exótico, como num bar em Zanzibar, e postar um bilhete virtual com uma mensagem secreta. Quem quiser ver a mensagem terá que, fisicamente, ir à Tanzânia para saber o que foi escrito. Uma caça ao tesouro que pode ser usada para pais deixarem mensagens escondidas pela cidade, para a filha quando crescer passear pelos bairros por onde moraram.
A realidade aumentada do Pokémon Go é algo tecnicamente simples. Muitos outros aplicativos poderiam ter feito você experimentar a mesma mágica. Mas Pokémon Go foi "o" aplicativo que saiu dos guetos e mostrou em larga escala o que é experimentar a realidade aumentada.
Nem tudo são flores. Com o jogo, descobrimos novas formas de ficar com nossa privacidade exposta, descobrimos que mesmo no mundo virtual as favelas permanecem sendo zonas excluídas, e descobrirmos situações que levaram jogadores para dentro dos tribunais, quando não para frente de carros.
A realidade aumentada está só começando nas nossas vidas. Em breve nossos celulares serão caixinhas mágicas cercados por objetos semi-imaginários. Publicitários vão inventar sementes virtuais para plantarmos num show de rock e colhermos só na edição seguinte. Artistas de rua vão inventar prédios grafitados que não requerem tinta, mas podem ser vistos de longe. Médicos vão explicar procedimentos cirúrgicos usando o interior do nosso corpo como exemplo. E tudo isso experimentamos pela primeira vez com um Pokémon que passou perto de nós.
*Fabro Boaz Steibel escreve mensalmente no Caderno DOC