por André Luís Woloszyn
Analista de Assuntos Estratégicos, membro do Núcleo de Estudos de Segurança da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo
Recentes informações coletadas por órgãos de inteligência governamentais e privados da comunidade internacional levaram as autoridades brasileiras a reclassificar o grau de risco em relação à probabilidade de atentados terroristas durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio-2016. Dentre as informações analisadas está a prisão, pela Polícia Federal, no Estado de Santa Catarina, de um brasileiro suposto integrante do grupo Estado Islâmico (EI). Ele mantinha uma rotina de treinamento sistemático com arma de atirador de elite e encontrava-se de posse de manuais militares provenientes da Síria.
Somam-se a isso as ameaças de ataques em redes sociais e a criação, pelo United Cyber Caliphafe, de uma plataforma de comunicação em língua portuguesa, por meio dos aplicativos de mensagens Telegram e WhatsApp, destinada ao recrutamento e ideologização político/religiosa e a existência de brasileiros classificados pela inteligência do país como altamente radicalizados ou radicais autóctones, a exemplo do que ocorre em países da Comunidade Europeia. Muitos destes, inclusive, prestaram juramento ao califa Abu Bakr al-Baghdadi (o líder do Estado Islâmico) e estariam em condições de atuar em ações terroristas em nome do Estado Islâmico.
Outras questões correlatas merecem maior aprofundamento, como a recente informação, do Serviço Federal de Imigração americano, da existência de uma rede de tráfico de pessoas direcionadas aos EUA que utilizam o território brasileiro como passagem. Segundo aquelas autoridades, foram detectados paquistaneses, palestinos e afegãos suspeitos de atividades terroristas no Oriente Médio. Estimativas indicam que parte destas pessoas optou por permanecer no Brasil, em locais e circunstâncias ignorados.
Tal contexto demonstra o despertar de interesse por parte de lideranças e integrantes de redes terroristas internacionais no Brasil, um terreno fértil e inexplorado, quer como potencial alvo de atentados em situações extraordinárias quanto a que será vivida no Rio de Janeiro, como local de homizio ou, ainda, para o estabelecimento de bases e planejamento de futuras operações em outros países.
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Trata-se de indícios que não podem ser subestimados ou minimizados, uma vez que o Brasil, por suas dimensões continentais e pelo acolhimento de diferentes povos, pode estar sendo considerado como um novo e alternativo ator parte de uma estratégia mais ampla de expansão do terrorismo internacional. Vale ressaltar que a criação do site em português se deu em momento crítico, em um cenário político conturbado no qual se observa o crescimento da radicalização no país, fator que historicamente favorece o florescimento de novas ideologias e lideranças carismáticas.
Da mesma forma, outros fatores internos contribuem para um cenário pró-terrorismo, como a aproximação com facções criminosas ligadas ao narcotráfico e ao tráfico de armas, a corrupção de agentes públicos e as deficiências na fiscalização de acesso e controle de imigrantes ilegais.
Por outro lado, partindo da análise dos recentes atentados terroristas, no biênio 2015/16, perpetuados pelo grupo terrorista Estado Islâmico, podemos afirmar que os lobos solitários são, na atualidade, a peça central da sua estratégia internacional para provocar atentados em pequena escala em diferentes países. Pode-se dizer ainda que são eles a maior ameaça para os Jogos Olímpicos.
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O grau de risco cresce em razão das características especiais desta forma de ação armada. Tais indivíduos são autodidatas em nível operacional e atuam com base nos princípios da oportunidade e conveniência, não possuem ligação com redes internacionais ou regionais, mas retiram delas o modelo e a inspiração para suas práticas. O fato de estarem inseridos no ambiente urbano, transitando com naturalidade, é outro complicador, visto inexistir um biotipo ou perfil identificável. Tais fatores somados dificultam o monitoramento por parte dos agentes de segurança além de disseminar uma sensação de insegurança permanente e acarretar possíveis erros de avaliação pela premissa de que todas as pessoas parecem suspeitas. O problema se acentua se levado em consideração que a polícia brasileira tem um histórico relativamente alto em abordagens malsucedidas, baseadas em falsas suspeitas e que, no caso concreto, terão efeitos institucionais devastadores.
Diante deste cenário, o terrorismo internacional de certa maneira já se manifesta no país por efeitos psicológicos antecipados de insegurança e tensão, atingindo, assim, parte de seu objetivo doutrinário. E a atuação dos lobos solitários se apresenta como o maior desafio para as autoridades de segurança e defesa nos esforços concentrados e coordenados para uma detecção preventiva. E, mesmo assim, não há certezas de pleno sucesso, pois mesmo países com declarada expertise no trato deste fenômeno criminal são alvos constantes do terrorismo internacional.