– Ráaaaaa ráaaaaaa – o grito estridente rasga o silêncio de uma rua pacata no Morro Santa Tereza, em Porto Alegre.
O pedreiro Marcos Paulo, que empurra concentrado um carrinho de obra lomba acima, olha desconfiado para os lados procurando a origem do estranho som. O mistério só é resolvido quando um vulto escuro chama a atenção em cima das árvores: uma arara-canindé de penas azuis e amarelas sobrevoa a cabeça do pedreiro e pousa em um galho para continuar o poderoso canto.
Guri, como foi batizado, é um macho de oito anos que vive no casarão da família Paim. O nome da rua foi ocultado a pedido da dona porque a ave já sofreu tentativa de roubo. O animal, registrado no Ibama, foi comprado e chegou no morro Santa Tereza pelas mãos do engenheiro civil Oswaldo Paim no final dos anos 2000. Apaixonado por animais, ele construiu a casa da família e o aviário onde vive o "gritão". Após a morte do engenheiro, em 2010, a arara ficou aos cuidados da filha de Oswaldo, Ligia, que é veterinária.
– Depois que meu pai morreu, o Guri ficou muito triste, mas depois acabou se acostumando comigo e hoje não desgruda de mim nem na hora de dormir – conta Ligia.
Guri tem liberdade e passa boa parte do dia voando pela região. Só volta para o viveiro na hora de dormir. De acordo com Lígia, não foi sempre assim. Demorou um ano até o animal se ambientar e aprender a voltar para casa após os voos. Quando tinha um ano de idade, a ave se perdeu e só foi encontrada nas imediações do presídio.
Alimentado com frutas, sementes e bolacha, Guri é uma atração a parte da região.
– Todo mundo que passa e vê ele voando fica impressionado com a beleza do animal – conta o caseiro Luis Enir, que trabalha ao lado da casa em que vivem Ligia e Guri.
Marcos Paulo, que no início ficou intrigado com o som estranho, gostou de ver solto o imponente animal de bico curvo que só conhecia da TV e do zoológico:
– Muito lindo ver ele solto voando. Eu nunca tinha visto. É um animal impressionante.