Foi numa folha de papel que 11 crianças e adolescentes, pacientes do Hospital da Criança Santo Antônio, de Porto Alegre, desabafaram sobre medos, angústias e experiências de vida. O resultado foi o livro Metamorfose - Histórias das Nossas Vidas, lançado nesta quarta-feira na própria instituição. A obra faz parte de um projeto criado em 2013 por três voluntárias que viram na literatura uma válvula para quem passava os dias entre as paredes brancas dos quartos do hospital.
- Como o título antecipa, ele mostra a transformação destes pacientes, a mudança que eles vivenciaram e ainda vivenciam durante as etapas de seus tratamentos - explica Themis Reverbel da Silveira, diretora médica Hospital da Criança Santo Antônio.
Com o apoio da direção do hospital, a professora de português, Eni Maffei, a professora de criação literária Hilda Simões Lopes e a advogada Elda Sanchotene Beheregaray iniciaram o projeto pensando em trabalhar com as mães dos pacientes para ocupar o tempo dentro delas dentro da instituição. Porém, as primeiras oficinas mostraram que o público-alvo deveria ser outro.
- Nos encontros realizados uma vez por semana, percebemos que as crianças eram as mais fragilizadas. Internadas, se sentiam carentes e enfraquecidas. Decidimos, então, mudar o projeto. Começamos a visitá-las nos quartos e a incentivá-las a escrever sobre o que quisessem. Deixamos papel e caneta com cada uma delas, e surgiu o Metamorfose - revelou Eni.
Desabafo
O incentivo das voluntárias fez Pâmela de Oliveira Soares, 14 anos, do Bairro Lomba do Pinheiro, desabafar pela primeira vez sobre os momentos mais difíceis vividos por ela. Paraplégica há três anos, vítima de uma bala perdida, ela enfrentou mais de uma internação por conta de complicações causadas pela imobilidade. Órfã de pai, que foi assassinado, Pâmela não fala com família sobre os próprios traumas, como relatou a mãe, Simone Beatriz de Oliveira, 41 anos. Em 2013, quando ficou um mês e 17 dias internada, a adolescente foi desafiada pelas voluntárias a participar do projeto. Num dos trechos do texto, ela escreveu "estou compartilhando minha história com vocês pois quero que saibam que, apesar de eu passar por vários problemas, eu sou muito forte".
- Sempre gostei de desenhar e ler. Escrever me fez colocar para fora tudo o que eu sentia, e ajudou a passar mais rápido a minha internação - disse Pâmela, que cursa a 8ª série.
"Me tornei mais responsável"
A primeira publicação, que teve patrocínio de uma empresa privada, contém crônicas, poemas e contos. Os três mil exemplares do livro foram entregues gratuitamente no lançamento e distribuídos aos pacientes internados no hospital. Eni garante que já há material suficiente, com a participação de novos pacientes, para uma segunda edição do projeto.
Entre os textos publicados, está o do estudante Gabriel Terres, 14 anos, diagnosticado com Diabetes Melito, aos cinco anos. Para ele, escrever sobre a própria experiência foi como terapia depois de inúmeras internações desde que descobriu a doença.
- Encarei como um desabafo e um momento de me reconhecer. Depois desta experiência, acho que me tornei mais responsável com o tratamento para a doença - reconheceu Gabriel.
Literatura
Pacientes do Hospital da Criança Santo Antônio lançam livro, em Porto Alegre
A primeira edição contém crônicas, poemas e contos produzidos pelos pacientes. O lançamento ocorreu nesta quarta-feira
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