* Escritora, autora de Todos Nós Adorávamos Caubóis (2013). Escreve mensalmente no PrOA.
Não é de hoje que algumas discussões no Brasil parecem guiadas por uma espécie de pensamento mágico; tira-se a complexidade das questões, as dúvidas, as causas diversas, as "n" hipóteses de solução, sobrando daí alguma coisa rasa que aponta apenas para um sim ou não. Redução da maioridade penal: sim ou não? Se sim, a cura da violência. Se não, a certeza de que não precisamos mais pensar no assunto. O Facebook, nesse sentido, parece deixar tudo mais bobo ainda, levando as pessoas a manifestarem suas certezas inabaláveis. O difícil sempre pode ser simplificado, e o mundo inteiro vira um imenso livro de capa amarela com as palavras for dummies.
A questão local envolta em pensamento mágico agora é o cercamento, ou não, da Redenção (como uns anos atrás foi: permitir ou não permitir que prédios residenciais sejam construídos na área do antigo Estaleiro Só?). De novo, não há nuance, aprofundamento e, principalmente, não há projeto. Nessas condições, votar sim ou não em um possível referendo é, no máximo, um ato democrático totalmente desqualificado.
Sou um pouco mais contra o cercamento do que a favor dele, mas, como acho que já ficou claro, não grito nem esbravejo por nenhum dos lados. Gostaria, isso sim, de ver um debate mais adulto e menos sexta série. Não está bom como está? Fato. Mas o que exatamente não está bom? Precisamos pensar nos problemas que queremos resolver com as grades. Estamos falando de assaltos? Prostituição? Depredação? Tráfico de drogas? Se a resposta é "tudo isso", bem, talvez seja o momento de pensarmos como o cercamento impediria cada uma dessas ações (impediria?).
Se o cercamento da Redenção é apenas um reflexo de uma sociedade que adora gradear tudo sem pensar muito se isso realmente inibe a violência, então sou contra. Se o cercamento faz parte de um projeto que prevê patrulhamento, poda, iluminação, mais banheiros, brinquedos, a reativação do café do lago, em resumo, melhorias necessárias em um parque querido por todos, posso ser a favor. Mas, além disso, precisamos entender que cercamento é esse que estaria sendo proposto em uma eventual consulta popular. Qual seria o horário de funcionamento do parque? Quantos portões de acesso teríamos? Como estariam distribuídos esses acessos? Sem esse detalhamento, votar sim ou não é como assinar um documento sem ter lido dele uma linha sequer.
Li outro dia que, quando Nova York passava por suas décadas de violência e deterioração do espaço público, uma das soluções achadas pelos governantes foi sempre providenciar uma rápida manutenção dos equipamentos vandalizados. Um lugar que tem uma imagem de abandono, é certo, atrai mais abandono ainda; a maioria das pessoas gradativamente deixa de frequentar aquele espaço degradado, entregando-o nas mãos dos poucos que estão a fim de estragá-lo.
A prefeitura tem feito um bom trabalho na revitalização de algumas praças da cidade. A praça Dom Sebastião, em frente ao Colégio Rosário, agora está sempre cheia de gente, e a mudança também foi perceptível na Praça Largo Doutor Adair Figueiredo, no bairro Santa Cecília. Essas duas intervenções relativamente simples e baratas (mais do que a construção de um viaduto, ao menos) provam que não é preciso muito para trabalhar a favor de uma cidade mais verde, amigável e segura.
E a Redenção? Em vez de nos dividirmos em quem é contra e quem é a favor das grades, que tal todo mundo admitir que não está bom do jeito que está e começar a cobrar soluções inteligentes, complexas e verdadeiramente democráticas?
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