Se na quarta-feira os dois lados, favorável e contrário ao Parque do Pontal, se equilibraram, nesta quinta-feira a oposição ao empreendimento que poderá ser construído na zona sul de Porto Alegre falou mais alto. Com forte presença de grupos ambientalistas e coletivos urbanos, a audiência pública que debateu o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) da obra derivou para assuntos que fugiam do motivo central do encontro.
A ideia da prefeitura era repetir o que foi visto na audiência anterior, quando a BM Par, proprietária do terreno do antigo Estaleiro Só, projetou imagens do projeto com uma música de fundo no salão da Paróquia Sagrada Família, no bairro Cidade Baixa, e maravilhou muitos dos presentes. Dessa vez, porém, os aplausos dividiram espaço com as vaias. Como o projeto arquitetônico ainda não está em questão, a apresentação do vídeo foi criticada.
- Não poderia ter filmezinho para enganar a galera - disse um ativista.
A sessão, presidida pelo supervisor de Meio Ambiente da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam), Mauro Gomes de Moura, começou às 19h e se prolongou por cerca de quatro horas. Como na quarta-feira, o engenheiro civil Henrique Wittler citou a necessidade de um dique à beira do Guaíba, mas a empresa garantiu que a cota prevista, de 5,25 metros, é superior à da enchente de 1941, que foi de 4,75 metros, o que garantiria um dique seguro.
Depois disso, o clima esquentou e os defensores do projeto foram rareando com o passar das horas. Integrantes do Movimento Gaúcho em Defesa do Meio Ambiente (MoGDeMA) que seguravam uma faixa dizendo que "A orla do Guaíba não está à venda" a penduraram no fundo do salão. Um dos integrantes, Júlio Alt, teve sua vez de falar e criticou fortemente a prefeitura.
- Tem um conluio da prefeitura com o empresariado - acusou.
- Você sabe que essa audiência está sendo gravada? - perguntou Moura.
- Está me ameaçando? - questionou Alt.
Vista do centro comercial a partir da Padre Cacique
Foto: Reprodução
Um ponto muito batido pelos opositores foram as mitigações. Líderes comunitários queriam saber o valor das contrapartidas da obra e se haveria algum montante aplicado no bairro Cristal ou se tudo seria investido em outros locais. Mauro Jungblut, engenheiro ambiental da Profill, empresa contratada pela BM Par, afirmou que o assunto não tinha a ver com o EIA-Rima e deverá ser esclarecido no momento em que o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) passar a ser discutido.
- Ainda não há definição sobre as contrapartidas - ressaltou.
Pelo prazo de sete dias, os questionamentos sobre o empreendimento deverão ser feitos à Smam. A secretaria encaminhará à BM Par o que for pertinente para que a empresa responda por escrito. Conforme Moura, a população terá acesso ao material com as respostas.
Confira os principais questionamentos sobre o projeto apresentados na audiência:
- Teste sobre a circulação de ar foi feita em altura de 10 metros, mas a torre comercial prevista é de 80 metros.
- Como será o projeto de iluminação noturna para garantir segurança no local?
- O parcelamento do solo (divisão da área, por exemplo o prédio do shopping e a torre comercial do Parque do Pontal) na orla é proibido "em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento das águas ou a proteção contra as cheias e inundações", conforme o artigo 136 do capítulo 3 do Plano Diretor de Planejamento Urbano e Ambiental de Porto Alegre, e deveria haver um dique de cota superior a 5,13 metros. A empresa garante que há cota maior (5,25 metros) na via a ser construída em frente aos prédios.
- Haveria nível de impacto urbano suficiente para que o projeto tivesse que passar obrigatoriamente pelo crivo da Câmara Municipal.
- Qual o valor das contrapartidas e o destino de cada uma delas? Empresa informou que o assunto será debatido no momento do EVU, e as contrapartidas ainda não estão definidas.
- Não houve consulta aos moradores do bairro Cristal sobre o projeto antes das audiências públicas.
O QUE O PROJETO PREVÊ
Atividades comerciais
- Jardim térreo com lojas
- Restaurantes, bares, discotecas
- Loja âncora (Leroy Merlin)
- Cinema: três salas convencionais e um cinema 3D
Parque público
- Área verde
- Espaços para lazer como quiosques pergolados, escadarias, arquibancadas para eventuais apresentações, caminhos, esplanadas, praças e recantos
- Atrações pontuais: relógio solar, ponto dos cata-ventos, praça das birutas, show de águas dançantes
Torre comercial
- Com 80 metros de altura, abrigará salas comerciais
Estacionamento
- 1.721 vagas privadas cobertas e 105 vagas públicas ao longo da pista de contorno do parque
OS PRÓXIMOS PASSOS
- O projeto já recebeu a classificação de "aceito" da prefeitura, ou seja, de que pode ser executado - embora seu conteúdo ainda possa ser alterado por exigência do município.
- A partir de agora, serão realizadas duas audiências públicas, ambas às 19h: uma em 8 de abril (Jockey Club), outra no dia 9 de abril (Paróquia Sagrada Família, José do Patrocínio, 954). Nas audiências poderão ser feitas críticas e sugestões. A partir daí, será elaborado um Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU).
- Depois de pronto o EVU, o projeto segue para a Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento (Cauge), que reúne várias secretarias municipais e pode estabelecer adaptações no projeto antes de aprová-lo em definitivo.