O Ministério Público prepara uma força-tarefa para analisar dezenas de contratos firmados entre prefeituras, Câmaras de Vereadores e outros órgãos públicos do Rio Grande do Sul com a empresa de tecnologia IPM — investigada por supostamente participar de um esquema de fraudes em licitações.
Na terça-feira (9), o MP deflagrou duas operações para apurar suspeitas de relação criminosa da IPM com integrantes da administração de cinco cidades gaúchas. Foram cumpridos mandados nas prefeituras de Bento Gonçalves, na Serra; Rio Grande, no Sul do Estado; Sapiranga, no Vale do Sinos; Santana do Livramento, na Fronteira Oeste; e Candelária, no Vale do Rio Pardo.
Em Rio Grande, o prefeito Fábio Branco (MDB) foi alvo de mandados de busca e apreensão. Ele nega envolvimento em irregularidades (leia manifestações abaixo).
Os investigadores já identificaram pagamentos regulares de órgãos públicos de 108 cidades gaúchas para a empresa suspeita de operar o esquema. Em alguns municípios, a empresa mantém contratos com mais de um órgão público. A ampliação da investigação vai avaliar se há suspeita de fraude nestes demais contratos — como percebido, segundo o MP, nas cinco prefeituras citadas.
A suspeita é de que representantes da empresa de tecnologia IPM tenham estruturado um esquema de direcionamento de licitações. O MP vê indícios de que a companhia entregava aos agentes públicos uma proposta de edital para contratação de serviços de tecnologia que, por conta do direcionamento, teria a própria IPM como única vencedora possível.
Os documentos envolvidos na suposta fraude, conforme a investigação, seriam entregues presencialmente por representantes da empresa para os agentes públicos. Esta prática poderia ter como objetivo minimizar os rastros digitais do esquema. Durante o cumprimento de mandados, o MP buscou mídias físicas e equipamentos eletrônicos que possam ajudar a comprovar a fraude.
Evitar “apagão”
Apesar das operações deflagradas nas cinco prefeituras, a IPM seguirá atuando nos contratos que estão em vigor. O MP não solicitou à Justiça a suspensão das atividades da IPM para evitar um “apagão” em serviços à população, visto que a empresa atua em contratos envolvendo áreas essenciais — como emissão de guias de IPTU e gestão em saúde.
O que faz a empresa
A IPM Sistemas cria programas informatizados para gestão pública. São sistemas para diversas áreas, como recursos humanos, saúde, educação, contabilidade e arrecadação de impostos municipais.
Em seu site, a IPM se diz “líder no Brasil em tecnologia para gestão pública”. A empresa — com sede em Santa Catarina — mantém contratos no seu Estado de origem, e em Paraná, São Paulo e Minas Gerais, além do Rio Grande do Sul.
A empresa também é responsável por criar e manter no ar sites de prefeituras e Câmaras. Quando o link do site possui o domínio “atende.net”, isso significa que o sistema é gerido pela IPM.
IPM nega irregularidades
GZH procurou a empresa e questionou como fica a prestação dos serviços após a operação e quantos contratos possui em vigor com órgãos públicos no Rio Grande do Sul. A IPM se manifestou por meio de nota, mas não respondeu ao segundo questionamento. Leia o posicionamento:
A IPM atua no fornecimento de tecnologia de última geração aos municípios brasileiros, e luta contra iniciativas de um grupo de empresas que visa evitar sua entrada nas Prefeituras do Estado do Rio Grande do Sul. Tais iniciativas são pautadas em denúncias vazias e inconsistentes, motivadas por interesses comerciais próprios de outras empresas do mesmo segmento que não têm entregado sistemas de gestão modernos e eficientes. Agimos em conformidade com a lei e focamos nossos esforços na eficiência e inteligência para a gestão pública, com tecnologias melhores e preços inferiores aos do mercado. Os serviços à população seguem disponíveis e sem qualquer alteração, e nós continuamos firmes em nossa missão de promover uma gestão pública mais eficiente e de qualidade. Seguimos à disposição do judiciário e órgãos de controle. Os fatos serão esclarecidos.
Posicionamento das prefeituras
GZH buscou o posicionamento das cinco prefeituras alvo da operação do MP. Leia as manifestações:
Candelária
A Prefeitura de Candelária vem a público esclarecer a população em geral sobre a operação desencadeada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul na manhã de terça, 7. Na verdade, a operação tem como alvo a empresa responsável pela locação de software de gestão pública da Prefeitura. A suspeita é de eventuais fraudes em processos licitatórios envolvendo a referida empresa. No caso de Candelária, é importante informar que a empresa presta serviços para a Prefeitura há vários anos, período que inclui os quatro mandatos anteriores. Em 2021, diante da impossibilidade de renovação do contrato, foi realizado um pregão eletrônico para contratar de forma regular a prestação do serviço. O processo licitatório obedeceu rigorosamente os trâmites legais necessários, sendo declarada vencedora a empresa que já prestava o serviço. Na nova licitação, o município, através do setor competente, buscou aperfeiçoar a prestação do serviço, visando apenas o melhor interesse público. Neste sentido, é possível enfatizar não ter ocorrido qualquer favorecimento ou irregularidade no processo que, por sua natureza, por se tratar de um pregão eletrônico, foi divulgado nos meios legais e, portanto, ficou aberto e disponível a qualquer empresa interessada. Vale destacar, ainda, que o serviço atende todas as secretarias da Prefeitura, sendo fundamental e absolutamente essencial para o bom andamento do serviço público. Por fim, em relação ao episódio, cabe ainda ressaltar que é precipitada e leviana qualquer suspeita envolvendo um servidor ou agente público do município. A Prefeitura irá aguardar as investigações que se seguirão, torcendo para que eventuais autores de fraudes sejam efetivamente apontados e esclarecido não existir nenhum envolvimento de servidor ou outra pessoa do município.
Sapiranga
Sobre a operação deflagrada na manhã desta terça-feira, 7, pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul a servidores públicos de cinco municípios do Estado, a prefeitura de Sapiranga esclarece que somente tem conhecimento do que foi noticiado nesta manhã após a operação.
A Administração Municipal reafirma o compromisso com os cidadãos e ressalta que, todo e qualquer ato ilegal que venha a ser comprovado, terá a colaboração da administração com os órgãos de fiscalização.
Santana do Livramento
Procurada pela reportagem, a administração de Santana do Livramento disse desconhecer a investigação, por se tratar de "processo de 2019". A prefeitura confirmou o cumprimento das ordens judiciais pelo MP e disse que o órgão teve acesso a tudo o que solicitou.
Bento Gonçalves
A Administração Municipal de Bento Gonçalves esclarece que está colaborando plenamente com o Ministério Público do Rio Grande do Sul para elucidação dos fatos relativos à operação ocorrida na manhã desta terça-feira (7) em diversos municípios gaúchos e de Santa Catarina.
Em Bento Gonçalves, os questionamentos são atinentes ao fornecimento de software responsável pela gestão administrativa da Prefeitura, que foi contratado por meio de licitação.
A Prefeitura reforça seu compromisso com a transparência e seu propósito de que todos os aspectos relativos ao tema sejam amplamente esclarecidos. Assim que tiver acessos aos autos, novas informações serão prestadas.
Rio Grande
A Prefeitura do Rio Grande informa que está colaborando integralmente com o Ministério Público do Rio Grande do Sul no andamento da operação ocorrida nesta terça-feira em diversos municípios gaúchos e não medirá esforços para que tudo seja esclarecido.
O trabalho das autoridades envolve a investigação de empresa responsável pelo fornecimento de um software relacionado a atividades de gestão em vários municípios, entre eles Rio Grande, onde a contratação ocorreu atendendo todos os requisitos legais, e cuja utilização vem ocorrendo normalmente.
Em 2021, ante a deficiência do sistema que atendia a administração pública, a atual Gestão Municipal expediu o Pregão Eletrônico 52/21 que foi anulado por iniciativa da Gestão por inconsistências no Edital que impedia a participação de empresas em recuperação judicial. Em março de 2022, corrigidas as inconsistências, foi expedido o Pregão Eletrônico 17/22 que foi revogado com uma empresa já vencedora, por força de liminar judicial deferida em Mandado de Segurança a qual foi reformada no Tribunal de Justiça que autorizou a contratação emergencial da empresa vencedora desse certame até a realização de um novo processo licitatório. Em razão disso, em setembro de 2023 foi expedido o Pregão Eletrônico 01/2023, publicado em 27 de setembro deste ano, com abertura em 13 de novembro vindouro, para o novo processo de licitação para o serviço.
A Administração Municipal do Rio Grande aguarda acesso aos autos e reitera seu comprometimento com a verdade, seguindo à disposição para colaborar com o trabalho do Ministério Público. Os serviços à população estão sendo prestados normalmente.