Pelo menos um município gaúcho tentou obter royalties por meio de ações ajuizadas pelo grupo do lobista Rubens de Oliveira. Em 15 de abril, duas advogadas com registro na OAB do Rio Grande do Sul ingressaram com o pedido de pagamento para Três Coroas, no Vale do Paranhana.
Reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelou que ações movidas por advogados que teriam ligação com Oliveira garantiram R$ 125 milhões em royalties a 21 cidades do Amazonas, do Pará e de Alagoas onde não há produção de petróleo.
O caso de Três Coroas foi analisado pela 6ª Vara Cível da Justiça Federal do Distrito Federal. Nove dias depois, em 24 de abril, a juíza Ivani Silva da Luz negou liminar antecipando o pagamento.
Na decisão, Ivani não analisa o mérito do pedido, limitando-se a sustentar que a legislação impede concessão de liminar quando se trata de pagamentos da Fazenda pública. “As questões controvertidas serão apreciadas na sentença”, projeta a magistrada.
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) contestou o pedido para Três Coroas. Nesta quarta-feira (26), Ivani concedeu vista do processo às advogadas do município, Marli de Oliveira e Maria de Fátima Madruga Farias, “para réplica, em face da contestação apresentada, bem como para especificar as provas que ainda pretende produzir, indicando, com objetividade, os fatos que deseja demonstrar”. As advogadas recorreram da decisão que negou liminar.
Procurado por Zero Hora, o prefeito de Três Coroas, Alcindo de Azevedo (PSDB), diz não saber quem o convenceu a ingressar com a ação. Ele conta que aceitou entrar com o processo após ter sido procurado na prefeitura, em março, por quatro pessoas.
— Eram de uma empresa, não lembro o nome da firma nem das pessoas. Diziam que o município tinha direito a receber royalties, uma quantia mensal que ficava lá parada. Como a prefeitura não iria gastar nada, eu aceitei — revela Alcindo.
Segundo o prefeito, Três Coroas pode receber royalties porque é rota de um gasoduto. Uma das linhas de distribuição da Sulgás vai de Igrejinha até São Francisco de Paula, na Serra, e passa pelo município. No pedido, as advogadas sustentam que “o município não recebe compensação financeira, muito embora sofra com impactos ambientais oriundos da prática desta exploração”.
A justificativa é que Três Coroas é "confrontante" com São Francisco de Paula e Igrejinha, que possuem instalações para entrega do gás boliviano à distribuidora estadual, as chamadas citygates. Ao final de 30 páginas, elas argumentam que o município deixa de receber todo mês, em média, R$ 814,7 mil, valor baseado nos pagamentos feitos à cidade vizinha de São Francisco de Paula.
Na contestação, a ANP afirma que “inexistem atividades de exploração e produção de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) no Rio Grande do Sul”, que Igrejinha e São Francisco de Paula não são produtores de petróleo e gás natural e que o conceito de “confrontante” só existe na legislação para pagamento a municípios vizinhos a poços ou campos marítimos de petróleo.
Com 24 mil habitantes e orçamento anual de R$ 120 milhões, Três Coroas tem na indústria calçadista a base de sua economia. De acordo com o prefeito, o departamento jurídico da prefeitura é pequeno e não teria condições de se encarregar da ação.
Quem pode receber royalties?
Os municípios recebem royalties de petróleo quando possuem produção de petróleo ou gás em seu território. Quando a produção ocorre no mar, os municípios "confrontantes", localizados em uma área imaginária estabelecida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), também têm direito a receber.
Cidades que possuem instalações para o desembarque de petróleo proveniente do mar também são beneficiadas. Por fim, municípios que não possuem produção, mas estão em "zonas de produção", têm direito a receber parcelas residuais de royalties.
Contraponto
O que diz Rubens de Oliveira
Quando procurado pelo jornal O Estado de S.Paulo, Rubens de Oliveira afirmou ter conversado com Arthur Lira, na Câmara, sobre "consórcios que os municípios criam para atuarem no mercado de uma forma mais justa". Ele se apresentou como representante de prefeituras alagoanas que se unem para participar de licitações, especialmente relacionadas à construção civil e medicamentos, como forma de obter melhores condições. Ele negou atuar no mercado de royalties e petróleo. Mas, nas redes sociais, ele anuncia: “Royalties de Petróleo no Amazonas é com a RP Consultoria e Assessoria”.
Na publicação, havia e-mail para contato na descrição da imagem. Quando questionado para fornecer mais detalhes sobre sua atuação, ele encerrou a chamada e bloqueou a reportagem em um aplicativo de mensagens.
O que diz a ANP
A AGU, que representa a ANP na Justiça, respondeu às informações levantadas pela reportagem do jornal O Estado de S.Paulo. Em comunicado oficial, o órgão declarou que as decisões em questão foram proferidas sem rigor técnico e estabeleceram critérios criados judicialmente.
"Quando um município que legalmente não tem direito a royalties passa a recebê-los, isso gera um efeito cascata bastante deletério, pois reduz o montante a ser repassado àqueles que legalmente têm direito a receber”, ressaltou a nota.