O vazamento do relatório final da CPI da Covid antes da leitura entre senadores da comissão azedou o clima no grupo majoritário, conhecido como G-7, em geral de oposição ao governo de Jair Bolsonaro. A situação deixou o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), praticamente isolado.
Para contornar a controvérsia, Calheiros admitiu negociar e alterar o conteúdo do parecer. Também afirmou que o episódio servirá para “confrontar pontos de vista e acertar posicionamento comum”:
— O relatório não será uma peça do relator, essa investigação é coletiva, parlamentar, e não pode ser individualizada. Estou aberto para aceitar primeiro o debate e depois os pontos de vista da comissão.
Contrariedade
A divisão foi explicitada nesta segunda-feira (18) pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), que manifestou contrariedade sobre o vazamento de trechos do relatório final.
— Não sou menino, não comecei a fazer política ontem — disse Aziz, em entrevista à GloboNews, sobre o vazamento de partes do parecer e a quebra de acordo feito na sexta-feira (15) com senadores sobre a confidencialidade do texto até o debate final entre os parlamentares.
— (Na sexta) acertamos ter uma reunião hoje (segunda). Já que foi quebrado esse acordo, não tinha por que conversar com ele (Calheiros). Conversar o quê se o relatório já estava de conhecimento público? — reagiu o presidente da CPI, tornando pública a irritação com o relator.
Em seguida, afirmou que “tudo que saiu na imprensa, volto a repetir, eu vou exigir que ele (Calheiros) mantenha no relatório”.
— Porque ele não vai jogar e depois tirar. Por que o açodamento em vazar? — indagou Aziz.
No texto, Calheiros atribuiu, inicialmente, 11 crimes ao presidente Jair Bolsonaro e propôs o indiciamento de cerca de 60 pessoas, entre ministros, ex-ministros, filhos do presidente, médicos, empresários e deputados. Primeiro, a leitura do relatório para os integrantes da comissão ocorreria nesta terça-feira (19) – acabou adiada para quarta-feira (20). E a votação pela CPI, prevista para quarta, foi transferida para o dia 26. Aziz afirmou que a comissão terá uma semana para avaliar o parecer.
Durante sessão da CPI desta segunda-feira, Calheiros mal foi cumprimentado pelos colegas. O convite feito para reunião no seu gabinete foi recusado, segundo O Globo.
— É natural que não haja consenso sobre alguns pontos. É uma complexa investigação sobre muitas pessoas, sobre fatos que envolvem igualmente as mesmas pessoas. É uma coisa detalhada, complexa, que tem que ser conversada — disse Calheiros, em entrevista à CNN Brasil, buscando acalmar os ânimos e salvar o próprio relatório final.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), por exemplo, chegou a fazer um relatório próprio, apontando nomes que podem ser indiciados pela CPI que não estavam no documento do relator — um deles é o do ministro da Economia, Paulo Guedes. O enquadramento de Guedes também é defendido pela vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Aziz disse que quer ser convencido da acusação de genocídio de indígenas ao presidente Jair Bolsonaro feita no relatório vazado.
Vaidades
Dentre os tipos penais atribuídos por Calheiros a Bolsonaro estão os crimes de epidemia com resultado de morte, infração de medidas sanitárias, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime, falsificação de documento particular, charlatanismo, prevaricação, genocídio de indígenas, crimes contra a humanidade, crimes de responsabilidade, e o que tem gerado maiores divergências dentro do colegiado, o crime de homicídio por omissão.
O senador Humberto Costa (PT-PE), também integrante do G7, disse que teme que a CPI termine em uma “disputa de vaidades”:
— Todos vamos poder analisar adequadamente os pontos que foram colocados, apresentar sugestões, manifestar discordâncias, isso é uma coisa natural. Tudo que o Brasil não deseja é que essa CPI termine em disputa de vaidades.