Em depoimentos prestados em dias subsequentes, as médicas Nise Yamaguchi e Luana Araújo foram ouvidas pela CPI da Covid nesta semana. As duas responderam aos questionamentos dos senadores e expuseram manifestações divergentes em tópicos como eficácia de medicamentos para tratar a covid-19 e medidas de distanciamento social.
A primeira a falar foi Nise, na última terça-feira (1°). Oncologista e imunologista, além de diretora do Instituto Avanços em Medicina, em São Paulo, ela é conhecida por defender o chamado tratamento precoce para o coronavírus e criticar medidas de restrição de circulação de pessoas para conter a doença.
Já Luana foi ouvida na quarta-feira (2). A infectologista havia sido anunciada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, para o cargo de secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19. Contudo, saiu do governo depois de 10 dias, sem ter sido nomeada. Em seus posicionamentos, defende a ciência e a ineficácia do chamado kit covid.
Confira temas em que seus posicionamentos divergem:
Tratamento precoce
Em seu depoimento, Nise Yamaguchi argumentou que o uso de medicamentos no início do tratamento para a covid-19 pode ser eficaz. Como exemplo, citou o Amapá, associando a queda na mortalidade a esse tipo de medida:
— Agora, a questão da eficiência desses medicamentos (tratamento precoce)... Por exemplo, no Amapá, nós temos um dos menores índices do mundo de mortalidade. Exatamente eles utilizam essas medidas conjuntas.
Após a afirmação, a médica foi informada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) de que estava equivocada sobre a taxa de mortalidade do Estado. A oncologista, então, disse que sentia muito pelos amapaenses e retificou a informação.
Nise também disse que tratou 340 pessoas precocemente e "um paciente somente teve uma evolução fatal". Além disso, afirmou que o uso de hidroxicloroquina é recomendado no México, por exemplo. Segundo checagem do portal Aos Fatos, a informação é falsa, pois o país deixou de indicar a droga para o tratamento da doença em agosto do ano passado.
Luana, por sua vez, afirmou diversas vezes que a ciência ainda não conseguiu encontrar um tratamento inicial para pacientes com covid-19. A infectologista destacou que a comunidade científica tem feito testes, mas que até o momento não houve resposta eficaz.
— Não temos nenhuma ferramenta farmacológica para ser usada de forma inicial que impeça a evolução da doença — disse.
Em seu depoimento, citou a cloroquina, defendida pelo presidente Jair Bolsonaro, como exemplo de medicamento que não deve ser usado para tratar a covid-19.
— Não é que a gente não queira que as pessoas tenham acesso, pelo contrário, nossa vida seria mais fácil. Perdi amigos, perdi colega de plantão da Fiocruz que era um gênio, morreu salvando a vida das pessoas. Se houvesse oportunidade, a gente teria usado. Infelizmente, não tem — declarou.
Medidas de distanciamento social
Outro ponto de discordância entre as duas profissionais durante a CPI foi o combate ao contágio de coronavírus por meio da restrição da circulação de pessoas.
Ao posicionar-se contra medidas como o lockdown, Nise utilizou dados de uma pesquisa americana. Segundo ela, o levantamento mostra que 84% das pessoas que foram parar nos hospitais do Estado de Nova York estavam em isolamento.
— Elas estavam dentro de casa, em completo lockdown, inclusive não utilizando métodos de transporte público. Isso demonstrou claramente para o mundo inteiro que o lockdown não prevenia a infecção — afirmou.
Já Luana defendeu o distanciamento social para o combate à pandemia da covid-19 e disse que deveria ter sido adotado desde o começo da disseminação do vírus no país. Segundo a médica, deve-se pedir às pessoas que façam o distanciamento "ao máximo que puderem, dentro das suas possibilidades":
— O vírus não passa de uma pessoa para outra por um "vácuo quântico". Ele passa porque existe uma proximidade entre essas pessoas. (...) Veja, eu não tenho a ilusão de que não existam consequências de viver em lockdown absoluto, não é isso. Existem ferramentas específicas para cada fase da pandemia, e isso não foi discutido.